No Brasil, quando acontecem catástrofes do porte de Brumadinho e Mariana, vêm a lume fatos que não poderiam ter passado despercebidos. Por aqui, é grande a promiscuidade entre empresas de mineração e os órgãos do Estado encarregados de fiscalizar o setor.
Bastaria um exemplo —a localização de um refeitório e de áreas administrativas no caminho do tsunami de lodo que o rompimento da barragem da mina Córrego do Feijão deflagraria.
A informação tenebrosa consta do próprio plano de emergência da Vale, segundo o qual a avalanche varreria os prédios em um minuto. O documento, ao que parece, chegou às mãos de autoridades incumbidas de garantir a segurança. Não é preciso ser engenheiro para concluir que aquelas construções não deveriam estar ali.
O país conta com uma Agência Nacional de Mineração (ANM), que sucedeu em 2018 o Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM) na tarefa de monitorar o setor. Após o desastre da Samarco em novembro de 2015, os reguladores elencaram medidas para evitar novas tragédias. A experiência demonstrou sua inocuidade.
A fiscalização fica, na prática, a cargo das próprias mineradoras. Elas contratam firmas privadas para avaliar a estabilidade das barragens. Produzem-se relatórios que vão dormir nas prateleiras dos órgãos responsáveis por verificá-los.
Eduardo Leão, diretor da ANM, admitiu que o órgão carece de pessoal para fiscalizar as 740 barragens do Brasil, 88 delas erguidas pelo sistema de alteamento a montante que produziu as hecatombes de Mariana e Brumadinho.
Havia no DNPM em 2010 um total de 1.140 funcionários. Hoje são 820, e neste ano 300 ficam em condição de se aposentar.
É de se perguntar o que faz um diretor de uma repartição reconhecidamente fadada a descumprir seu mandato. A situação se complica por Leão ter sido durante anos funcionário da mesma Vale.
Não se trata de deitar dúvida sobre a capacidade técnica ou a idoneidade pessoal do servidor, mas de constatar o padrão constrangedor de portas giratórias entre reguladores e interessados na mineração, que se repete na ANM.
Sua diretoria abriga ainda um deputado filho de prefeito de cidade no Ceará com jazidas de urânio e fosfato, técnicos indicados por políticos de estados produtores, como Minas Gerais e Goiás, e uma geóloga ré em processo criminal.
Agências reguladoras existem basicamente para garantir o interesse público difuso no funcionamento de determinado setor da economia. Não foi o que se viu, porém, em Brumadinho e Mariana.
Comentários
Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.