CONRADO H�BNER MENDES: Publicidade infantil no interesse da crian�a?
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Imagem extra�da do "Vlog da Juju", usada em uma representa��o no Procon contra propaganda infantil |
A hist�ria da proibi��o da publicidade infantil � a hist�ria da constru��o gradual de um consenso global entre as maiores autoridades no assunto ao longo de quase 20 anos. Foi um caminho que perpassou confer�ncias internacionais, pesquisas acad�micas, disputas judiciais, experimenta��o pol�tica e culminou em arranjos jur�dicos concretos.
Chegou-se a uma conclus�o: crian�a de at� 12 anos, sujeito em forma��o, n�o deve ser objeto da persuas�o publicit�ria.
Assim se posicionaram ningu�m menos que a Organiza��o das Na��es Unidas, a Organiza��o Mundial de Sa�de, o Conselho Federal de Psicologia, o Conselho Nacional de Direitos da Crian�a e do Adolescente e o Superior Tribunal de Justi�a, que abra�ou a tese em caso recente.
A revista brit�nica "The Economist" fez exaustiva revis�o da literatura cient�fica e concluiu que a proibi��o da publicidade n�o s� previne obesidade e aumenta o bem-estar psicol�gico e emocional das crian�as, mas gera maior rentabilidade � marca no longo prazo. A esse consenso se somaram gigantes empresariais, como Coca-Cola e Mars.
Apesar dessa maci�a converg�ncia, opini�o publicada nesta Folha (13/12), pela presidente da Associa��o Brasileira de Licenciamento (Abral), criticou-a. Segundo o texto, proibi��o ecoa radicalismo, e o radical n�o faz bem. Melhor seguir o 'caminho do meio'. A publicidade infantil seria ben�fica para crian�as, pois produtos infantis tornam a educa��o mais l�dica.
A autora faz confus�o marota entre proibi��o de produtos para crian�as, que nunca houve, e proibi��o da publicidade direcionada a crian�as. Induz a erro e ressuscita a velha intui��o pedestre. Surpreende pelo anacronismo, aquela falta de sintonia entre uma ideia e sua �poca. Seria menos ex�tico se publicado 20 anos atr�s, quando, sem estudos s�lidos, o tema aceitava palpites.
O assunto � importante demais, por�m, para ser tratado com tamanha ligeireza.
O texto n�o faz descri��o fidedigna da lei brasileira, onde publicidade geral n�o est� proibida; consumo de produtos infantis n�o est� proibido; nem sequer publicidade de produtos infantis est� proibida, desde que seja voltada para pais. Ningu�m � proibido de consumir, produzir, vender ou fazer publicidade. Mas da publicidade est� exclu�da, como destinat�ria, a crian�a abaixo de 12 anos.
A autora aponta radicalismo onde n�o h� e defende um nada inocente radicalismo disfar�ado de 'caminho do meio'. H� pouca coisa mais radical, em propaganda, do que recorrer a t�cnicas publicit�rias para seduzir a crian�a.
Consumo infantil � consumo mediado pelos pais, que devem ter autonomia para definir os termos em di�logo com os filhos. A publicidade infantil viola direitos da crian�a ao interferir nesse di�logo. Se s�o os pais que adquirem produtos infantis, por que persuadir crian�as em vez dos pais?
A presidente da Abral prop�e o di�logo como forma de evitar extremos. Mas a publicidade infantil corr�i o di�logo mais valioso dessa hist�ria, aquele entre pais e filhos. A proibi��o, limite modesto � atividade econ�mica, � aliada de pais e filhos, n�o o contr�rio.
O convite ao di�logo feito pelo texto, portanto, n�o pode ser mais que ret�rico: quem dialoga honestamente na esfera p�blica n�o se omite sobre argumentos jur�dicos e conclus�es cient�ficas; quem valoriza o di�logo livre entre pais e filhos n�o admite que ator publicit�rio produza ru�do, explore a vulnerabilidade cognitiva e manipule o desejo da crian�a.
Quando discutimos direitos fundamentais, n�o estamos numa mesa de negocia��o em busca de permutas 'ganha-ganha'. Uma li��o liberal. Direitos n�o se negociam, nem quando se chocam com grandes interesses pol�ticos e econ�micos. Servem justamente para nos proteger contra abusos de poder.
Direitos da crian�a t�m 'absoluta prioridade' (Constitui��o, artigo 227). Saber quem est� 'no meio' e quem est� 'nos extremos' depende da posi��o de quem olha. De que posi��o olha a presidente da Abral?
CONRADO H�BNER MENDES � professor da Faculdade de Direito da USP
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