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O recente acirramento dos ataques da Rússia na região do Donbass e a mudança de foco da guerra para o leste ucraniano —região a partir da qual Moscou poderia formar um corredor até a Crimeia— parecem deixar no esquecimento outro objetivo declarado por Vladimir Putin para iniciar o conflito, há 56 dias.
A tentativa de tomada do leste ucraniano está diretamente relacionada a três demandas do Kremlin:
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Reconhecimento, pela Ucrânia, das províncias separatistas do Donbass como independentes;
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Reconhecimento da Crimeia, anexada por Putin em 2014, como sendo território russo;
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A "desmilitarização" e "desnazificação" da Ucrânia —metas que, embora não sejam claras, envolvem o combate a grupos nacionalistas e neonazistas com forte atuação no leste.
Mas há outra exigência que continua na mesa e arrasta outros países europeus geograficamente próximos à Rússia: a não adesão à Otan.
Entenda: Putin quer que a Ucrânia inclua na sua Constituição uma garantia de que não vai aderir a blocos políticos ou militares, caso da Otan e da União Europeia. Alega que essa aproximação seria uma ameaça direta à segurança da Rússia.
Mas o que é a Otan e qual é a sua importância?
A Organização do Tratado do Atlântico Norte é uma aliança militar criada em 1949, no contexto da Guerra Fria, para aglutinar a América do Norte e os países da Europa Ocidental. Servia, essencialmente, para a proteção do bloco capitalista.
Na época, a Otan fazia frente com o Pacto da Varsóvia, de 1955, que compunha a zona de influência socialista. A partir do fim do bloco soviético, em 1991, a aliança ocidental passou por uma reformulação e alargou sua esfera:
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12 era o número de países que compunham a Otan na sua criação;
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30 é o número atual de membros, incluindo países do Leste Europeu, como Polônia e República Tcheca.
Antes restrita aos países ocidentais, a Otan passou a atuar em conflitos fora da sua área, como no Afeganistão e na Líbia.
Em 2008, uma sinalização de que Ucrânia e Geórgia seriam convidadas para intergrar o bloco —o que nunca foi formalizado— foi um dos motivos da invasão da Geórgia pela Rússia.
Desde então, Putin vem alertando que tomará medidas contra a expansão da Otan em seu entorno. O mais recente sinal ocorreu nesta quarta (20), diante do avanço no diálogo para a inclusão no bloco de dois países: Suécia e Finlândia.
"Fizemos todas as nossas advertências. Eles sabem disso, por isso não há surpresas", declarou a porta-voz Maria Zakharova.
No dia 13, as primeiras-ministras finlandesa, Sanna Marin, e sueca, Magdalena Andersson, se encontraram para tratar do tema. Tradicionalmente neutras em conflitos, as duas nações vinham negando a intenção de integrar a Otan.
Sim, mas: com a guerra, o debate foi retomado como opção de segurança no caso de eventuais novos conflitos. Isso porque o artigo 5º do tratado garante que qualquer país do bloco terá ajuda militar caso seja atacado. É o princípio da defesa coletiva, no qual um ataque a uma nação será considerado um ataque a todas.
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A Finlândia diz que a decisão sobre aderir à aliança ou não deve ser tomada nas próximas semanas;
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Na Suécia, fontes governistas dizem que o apoio à integração pode ser anunciado em junho.
Não se perca
Convidamos Clarissa Nascimento Forner, doutora em relações internacionais e professora da Universidade São Judas Tadeu, para explicar o que Finlândia e Suécia têm a ver com a guerra:
Qual é a preocupação da Rússia com a entrada de países como a Finlândia e a Suécia na Otan? Os dois países têm adotado uma postura de neutralidade em relação à Otan —de não adesão efetiva. A Finlândia, inclusive, mantém um acordo de cooperação e assistência mútua com a Rússia desde os anos 1950, então sua possível adesão efetiva à aliança militar teria um efeito de rompimento e de enfraquecimento desse poder simbólico da Rússia na região.
Além disso, há uma dimensão geopolítica muito forte, principalmente para a Finlândia, que faz fronteira com a Rússia.
Embora a Otan tenha revisto os seus conceitos estratégicos e a sua área de atuação após o fim da Guerra Fria, ela nunca alterou o seu foco principal, que é ser uma aliança militar. Então sua expansão é interpretada pela Rússia como uma ameaça direta.
Quais são os modelos de neutralidade que a Ucrânia poderia adotar? Ou abrir mão completamente de qualquer tipo de ingresso na Otan ou adotar esse modelo que tem sido observado tanto na Suécia e quanto na Finlândia, de não ser um membro pleno, mas poder manter eventualmente acordos de cooperação.
Mas o status da Ucrânia para a Rússia é muito diferente do de Suécia e Finlândia, que não possuem os mesmos laços culturais, históricos e geopolíticos com o país. Então me parece menos possível que a Rússia aceite a segunda opção.
O que aconteceu nesta quarta (20)
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Rússia disse que testou com sucesso míssil balístico intercontinental;
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Representantes ocidentais deixaram reunião do G20 durante fala de russos;
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Ucrânia negou ter recebido aviões de combate da Otan.
Imagem do dia
O que ver para se manter informado
Um relato em vídeo da linha de frente da guerra e uma seleção de imagens que mostram o impacto do conflito no meio ambiente:
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