Candidato governista tenta reverter frustração mexicana com Peña Nieto

Com 20% em pesquisas, José Antonio Meade, do PRI, quer combater estigma de corrupção

De colete vermelho com o símbolo de sua campanha e camisa branca de manga comprida, Meade aponta para o alto com a mão esquerda enquanto fala com um microfone que segura com a mão direita.
O candidato governista à Presidência do México José Antonio Meade fala durante comício na Cidade do México neste domingo (24) - Marco Ugarte - 24.jun.18/Associated Press
Sylvia Colombo
Buenos Aires

Ao escolher quem seria seu candidato a sucedê-lo na Presidência do México nas eleições do domingo (1º), Enrique Peña Nieto usou um recurso antigo de seu partido, o PRI (Partido Revolucionário Institucional), no poder por sete décadas (1929-2000; até 1946, teve dois outros nomes): o "dedazo".

Naqueles tempos, era o presidente quem apontava o escolhido, sem consultas internas. Facilmente esse candidato vencia nas urnas (muitas vezes, sob acusação de fraudes).

A tentativa de reviver o método, porém, tem falhado.

José Antonio Meade, o secretário (ministro) da Fazenda apontado por Peña Nieto para disputar a sucessão, tem 20,4% das intenções de voto, atrás do favorito Andrés Manuel López Obrador (49,6%) e do candidato da coalizão México a Frente, Ricardo Anaya (27%). Não há segundo turno.

Em entrevista à Folha por email, Meade, 49, reforçou que se vê como melhor candidato por ter passado por várias áreas do governo e por ter servido a mais de um partido.

Na gestão de Felipe Calderón (2006-12), do PAN (Partido da Ação Nacional), foi secretário de Energia e da Fazenda; na de Peña Nieto, de Relações Exteriores, Desenvolvimento Social e, por fim, Fazenda novamente.

"Antes de ser um político, sou um cidadão a serviço do México, e pude demonstrá-lo atuando em gestões diferentes. Tenho experiência em trabalhar com políticas públicas", afirmou. Ele enumera as que considera acertos recentes.

"Para a energia, desenvolvemos fontes mais limpas e que atualmente [possibilitam] economia aos usuários, licitamos o primeiro campo solar e construímos dutos de gás natural em comunidades onde antes não havia gás; em desenvolvimento social, empenhei-me em ampliar o acesso a direitos, tirando da pobreza extrema mais de dois milhões de mexicanos."

Os números oficiais respaldam a melhora de condições dos que estavam em situação de pobreza extrema; porém, nos seis anos da gestão Peña Nieto, a pobreza de forma geral oscilou de 41,1% para 41%, e a economia informal permaneceu no patamar de 60%.

O próprio Peña Nieto, em janeiro deste ano, admitiu que o combate à pobreza foi uma de suas principais dificuldades.

Quando o atual presidente assumiu, falava-se de um despertar da economia mexicana, impulsionada pelo desenvolvimento de plantas de montadoras de carros, aviões e outras indústrias em determinadas áreas do país.

A expressão no ar era o "novo milagre mexicano".

O desenvolvimento, porém, foi apenas mediano, e a projeção para 2018 melhorou um pouco. Espera-se que o país cresça 2,3% neste ano, após avanço de 2% em 2017. Para Meade, impulsionar a economia passa por estimular o setor agroexportador e diversificar a produção.

"Em termos de crescimento econômico e empregos, tenho propostas que darão resultados imediatos", afirma. Entre elas estão programas de estímulo à economia no sul do país, onde estão os estados mais pobres, como Guerrero e Oaxaca. "Há uma distorção muito grande entre os empresários do norte, que têm tudo, e a população do sul, que sobrevive a duras penas."

Ainda assim, o candidato diz que a economia do México "está estável, cresce e exporta, cria empregos e bem-estar, mas ainda carece de dinamismo". "Precisamos crescer e exportar muito mais, e que os benefícios desse crescimento cheguem a todos."

Para ele, esse desenvolvimento passa pelo campo, pelo turismo e por alternativas de energia mais baratas e limpas —segundo o governo mexicano, os combustíveis fósseis, como carvão e petróleo, ainda respondem por 79% da energia gerada no país.

Sorrindo, Peña Nieto segura uma camisa verde com seu nome e o número 1. Ao lado direito dele, está Angelica Rivera, com vestido estampado e outra camisa verde na mão. Do lado direito aparece Rafael Márquez de terno, assim como os outros jogadores que estão atrás.
O presidente do México, Enrique Peña Nieto, mostra a camisa da seleção de futebol que recebeu antes do embarque para a Copa; ele está entre a primeira-dama, Angelica Rivera, e o capitão do time, Rafael Márquez - Carlos Jasso - 31.mai.18/Reuters

A gestão Peña Nieto promoveu uma reforma educacional considerada bem-sucedida, mas não pôde implementá-la completamente ante a resistência em algumas regiões e de sindicatos. Houve, inclusive, enfrentamentos violentos em estados como Oaxaca.

Meade promete levar o plano adiante, com a oferta de ensino em tempo integral, cursos de inglês e acesso a tecnologias de informação.

Economista, o priísta foi colega de Peña Nieto e do chanceler Luis Videgaray no Instituto Tecnológico Autônomo do México. Depois, obteve um doutorado em economia internacional na Universidade Yale.

Com relação ao alto índice de homicídios, Meade defende investir na formação das polícias e desenvolver serviços de inteligência. "[É necessário ter] bases de dados atualizadas com quem são e onde atuam os delinquentes e melhorar salários dos profissionais. É uma área que precisa de mais Estado, não de menos Estado."

O México registrou um recorde de 25,3 assassinatos por 100 mil habitantes em 2017 (abaixo dos 30,3 do Brasil).

Mas Meade discorda que a promiscuidade entre cartéis de droga e corrupção regional contribua para esse crescimento. "Pode haver exceções, mas creio num Estado em que os servidores tenham um passado limpo."

Para atacar a corrupção, diz que exigirá mais controles sobre o patrimônio dos funcionários públicos. "O rendimento de contas tem de ser uma realidade, e é preciso acabar com a impunidade a quem não cumpre esse requisito."

Ele afirma que será "o primeiro presidente do México sem foro privilegiado", ou seja, que poderia ser investigado durante o mandato.

Diz ainda estar otimista com a renegociação do Tratado de Livre-Comércio da América do Norte (Nafta), exigência do americano Donald Trump ao México e ao Canadá. Mas propõe que seu país busque alternativas na Europa, na América Latina e na Ásia.

Ele evita falar das ofensas de Trump ao México. "Os EUA são vizinhos, amigos e sócios. Estamos unidos por laços muito antigos e por uma história em comum. Acredito que se possa manter essa amizade com respeito e cooperação recíproca."

Partido perde hegemonia, mas mantém influência

Segundo as pesquisas, o PRI deve deixar a Presidência em dezembro.

A eleição de Enrique Peña Nieto, em 2012, havia sido celebrada como o retorno triunfal do partido que governara o México por sete décadas como principal força nascida pós-Revolução Mexicana (1910).

Seis anos depois, o cenário é turvo. Em terceiro lugar nas intenções de voto para a Presidência, não há expectativa de que o PRI vire o jogo nem recorra à fraude como já fez no passado mais longínquo.

Mesmo assim, o partido continua sendo uma vertente política de grande influência na formação de coalizões para administrações locais e nos governos dos estados.

Mesmo quando esteve longe do poder, de 2006 a 2012 (no governo do direitista PAN, Partido da Aliança Nacional), o PRI manteve maioria entre as administrações estaduais. Agora, 14 dos 32 estados continuarão nas mãos do partido, inclusive o poderoso estado do México. O PAN deve ter 11, e o PRD, partido de esquerda formado a partir de uma dissidência do PRI, 5.

O PRI nasceu da primeira organização política dos ex-revolucionários. Seu auge foi a Presidência de Lázaro Cárdenas (1934-1940), que deu as bases do que o partido defenderia dali em diante: promoveu uma reforma agrária, assumiu uma postura nacionalista e estatizou o petróleo.

Nunca se autodenominou partido de esquerda, até porque, com o tempo, tecnocratas e liberais ocuparam o cargo de presidente e mudaram um tanto o perfil da legenda.

Aqueles que nasceram no PRI mas se consideravam progressistas acabaram formando o PRD --onde surgiu o atual líder das pesquisas Andrés Manuel López Obrador, agora com partido próprio (evidência de que tudo o que importa na política mexicana ainda passa ou passou pelo PRI).

Peña Nieto, 51, começou reformista, promoveu mudanças na avaliação educacional e privatizou parte da Pemex (Petróleos Mexicanos).

Com o tempo, acusações de corrupção a membros da alta cúpula (incluindo a primeira-dama), aumento da violência e fracasso contra o narcotráfico foram dinamitando sua popularidade, e praticamente fechando a porta para que emplacasse um sucessor.

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