Com crescente imigra��o haitiana no Chile, tema virou assunto de Estado
Carlos Vera - 16.nov.2017/Reuters | ||
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Imigrantes haitianas participam de evento de campanha de Sebasti�n Pi�era |
Eles s�o conhecidos como "chiletianos", e vieram do Haiti ao Chile em v�rias levas, a princ�pio fugindo das consequ�ncias do terremoto de 2010 e da pobreza. Alguns j� tiveram filhos aqui. No in�cio, n�o eram muitos os que faziam o trajeto, em geral em avi�o, via Rep�blica Dominicana. E instalar-se no Chile, se traziam algo de dinheiro, era relativamente f�cil, devido � flexibilidade das leis migrat�rias.
"Cheguei no fim de 2015 com meu irm�o. N�s n�o sab�amos falar espanhol e foi justo no meio do inverno. Tomei um susto com o frio, jamais tinha visto um cachecol na vida, pensei que n�o ia aguentar", conta � Folha, rindo, Baptiste Jeanot, 28, morador do bairro de Quilicura. De uns anos para c�, o lugar se encheu tanto de novos moradores vindos do Haiti que passou a ser conhecido como "Hait�cura".
"Naquela �poca, logo depois da destrui��o de nosso pa�s, os haitianos preferiam ir para os EUA ou a Fran�a, mas era mais caro e foi ficando mais dif�cil. Come�ou-se a falar do Chile, alguns vieram, familiares e amigos os seguiram, e formou-se essa onda", relata Jeanot. "N�s tivemos sorte, porque viemos no come�o e n�o demorou para conseguirmos emprego num sal�o de beleza (os dois s�o cabeleireiros, hoje especializados em penteados afro)", completa.
Pela lei chilena, quando o imigrante consegue um contrato de trabalho, pode pedir um visto de resid�ncia tempor�ria, mesmo tendo entrado inicialmente como turista.
Essa facilidade, por�m, come�ou a rarear a partir do momento em que a imigra��o haitiana come�ou a crescer. Se em 2015, foram 9 mil os que deram entrada no pa�s, em 2016, esse n�mero saltou para 43.898. Em 2017, s� at� julho j� haviam entrado 44.289 haitianos, segundo a �ltima contabilidade do minist�rio de Rela��es Exteriores.
A primeira dificuldade � que j� n�o h� tantos postos de trabalho dispon�veis, e a disputa passou a ser mais acirrada. "Estou trabalhando como gari, mas estudando para ser eletricista", contou Henri Jufr�, que no �ltimo s�bado (18), varria uma rua no bairro nobre de Las Condes.
Segundo, porque empregadores e uma verdadeira m�fia de vendedores de contratos de trabalho resolveram ganhar dinheiro com a necessidade burocr�tica dos haitianos. Segundo a Folha apurou com distintos imigrantes, estes documentos podem hoje custar de 120 a 500 d�lares, dependendo do empregador ou do vendedor de contratos. "Eu
n�o tinha esse dinheiro, ent�o pedi um adiantamento para o sujeito que ia me contratar e agora estou pagando com horas extra", diz Felice Santout, 32, empregada de uma casa noturna em Quilicura.
A terceira dificuldade passou a ser a moradia. Os haitianos buscam bairros humildes, onde j� se instalaram conhecidos. Em geral, est�o em Quilicura, Independencia e Estaci�n Central. Neste �ltimo, a reportagem visitou uma casa em que v�rias fam�lias dividem os quartos. Em alguns moram casais ou pessoas sozinhas, mas, em outros, h� fam�lias inteiras. O banheiro � pago � parte. Quem n�o tem para cobrir esse custo, usa baldes, depois descarregados num c�rrego. "N�o � o ideal, mas estamos guardando dinheiro e sei que vamos conseguir algo melhor logo", diz Louis Michel, 42.
A quarta dificuldade � o preconceito, que vem crescendo com o aumento da chegada dos imigrantes. "Pedi emprego em v�rios escrit�rios, quero um est�gio para ser secret�ria, achei que saber falar franc�s ajudaria. Mas o chileno n�o est� acostumado com gente de fora, especialmente com gente de cor. At� agora n�o consegui", diz Jamile Placide, 27.
"N�o somos uma sociedade racista, ao contr�rio, queremos ajudar, quando vemos as imagens do Haiti, quem n�o se comove?", diz a chilena Angela Urrua, 53, que fazia compras num mercado na regi�o. "O problema � que voc� n�o sabe que doen�as eles trazem, se vieram com delinquentes. O receio existe."
GASTRONOMIA E FUTEBOL
Apesar das dificuldades, o clima nas comunidades de haitianos � alegre. H� m�sica em alto volume nas casas, e nas ruas de com�rcio da Estaci�n Central vende-se uma mescla de gastronomias."Fazemos cazuela com pl�tano e frango, ou empanada chilena mas mais apimentada, a ideia � misturar mesmo", diz Juana Petersen, uma chilena casada h� dez meses com um imigrante haitiano que tem um concorrido estande ali.
J� as crian�as e adolescentes tem seu �dolo local, o jogador da sele��o chilena Jean Beausejour, filho de pai haitiano e m�e chilena, descendente de ind�genas mapuche.
ELEI��ES
Como o n�mero de haitianos que chega s� cresce e, desde 2010, apenas 6% dos que entraram deixaram o pa�s, o assunto virou uma quest�o pol�tica.
Durante o governo de Michelle Bachelet, a chegada dos haitianos foi virando um assunto de Estado. Entre as promessas da mandat�ria que n�o terminaram de se concretizar estava a de tornar mais �gil a entrada dos haitianos, al�m de a��es para que sua inser��o na sociedade e no mercado de trabalho fossem mais f�ceis.
Durante a campanha eleitoral, por�m, esse foi um tema marginal. Para o favorito nas pesquisas, o centro-direitista Sebasti�n Pi�era, a imigra��o pode continuar, mas deve haver mais controle na aceita��o de imigrantes. "J� fazemos isso entre os pa�ses da Alian�a do Pac�fico, trocamos intelig�ncia sobre quem cruza nossas fronteiras, � s� ampliar essa investiga��o de antecedentes penais, usando dados da Interpol. N�o sou anti-imigra��o, mas devemos escolher quem deixar entrar", disse em com�cio recente.
J� Guillier afirma que seguir� a pol�tica de Bachelet, ou seja, o pa�s seguir� aberto, mas prop�e que se combata a burocracia dos tr�mites e de quem se favorece deles.
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