Descrição de chapéu The New York Times

Ter poupança com amigos é comum na Coreia do Sul; conheça os gyemoim

Grupos de planejamento financeiro são usados para juntar dinheiro para viagens, casamentos e reencontros

Krissi Driver
The New York Times

No final do ano passado, Jina Kim e duas amigas esbanjaram em uma estadia de duas noites no Ananti at Busan Cove, um resort de luxo em Busan, na Coreia do Sul.

Com quartos a partir de US$ 369 a diária (cerca de R$ 2.000), o complexo tem piscinas de borda infinita, spas, oito restaurantes, trilhas e praias privativas e uma piscina coberta abastecida com água termal de 4.600 metros.

"Nós passamos o dia inteiro no resort, nadando, comendo e bebendo", disse Kim, uma ex-professora de 32 anos que agora é mãe em tempo integral.

Pessoas usando celular em Seul - Kim Hong-Ji - 13.abr.2023/Reuters

Kim e suas amigas, no entanto, não estavam preocupadas com o preço da viagem. Isso porque haviam passado mais de uma década economizando em um "gyemoim", um termo coreano para pessoas que formam grupos de planejamento financeiro para guardar dinheiro para despesas futuras —uma poupança compartilhada.

Os gyemoim podem ajudar amigos ou famílias a dividir os custos de viagem igualmente para que todos possam participar, independentemente do orçamento pessoal.

Cada membro contribui com uma espécie de mensalidade —geralmente entre US$ 10 (R$ 54,50) e US$ 50 (R$ 270) por mês, variando de acordo com a decisão coletiva. Conforme o saldo aumenta, os participantes discutem como gastá-lo juntos.

"Sinceramente, se não tivéssemos feito o gyemoim, teria sido muito difícil para nós organizar esse tipo de viagem", disse Kim. "Teria custado muito caro, e não queríamos que outros membros se sentissem pressionados por isso".

Poupanças coletivas ajudam a preservar relacionamentos

O planejamento financeiro coletivo acontece também em outras partes do mundo. "Não é algo exclusivo da Coreia do Sul", disse Euncheol Shin, professor associado de economia na Kaist College of Bussiness em Seul, capital do país.

"Essa prática se desenvolveu a princípio porque não havia mercado financeiro disponível, e, se você quisesse pegar algum dinheiro emprestado , precisava fazer algum autofinanciamento."

Shin deu um exemplo de uma vila no século 19 que precisava comprar sementes para cultivar arroz. As estruturas financeiras para pegar empréstimos ainda não existiam em muitos lugares, então as vilas juntavam dinheiro, compravam os suprimentos e dividiam o que colhiam.

Com o tempo, essa prática evoluiu para uma forma de manter amizades fortes e comunidades unidas.

Kim formou seu primeiro gyemoim com duas amigas depois de se conhecerem em um clube em 2014. As três frequentavam faculdades diferentes e acreditavam que o gyemoim permitiria que se encontrassem regularmente.

Inicialmente, concordaram em contribuir com 15 mil wons (cerca de R$ 58) por mês. Ao longo dos últimos dez anos, economizaram mais de 3 milhões de wons (cerca de R$ 11,7 mil) antes de decidirem gastar o dinheiro com a viagem ao resort.

Naquela época, as três amigas estavam ocupadas com suas próprias carreiras e famílias, mas permaneceram próximas, em parte, por causa do gyemoim.

"Isso nos permitiu manter contato e nos divertir juntas sem nos preocuparmos com preços", disse Kim.

Young-hoon Lee, 35, faz parte de um grupo que consiste em duas mulheres e quatro homens, todos contribuindo com 50 mil wons (cerca de R$ 200) por mês.

"Nós ficamos amigos durante o ensino médio, e permanecemos amigos na vida adulta", disse. "Inicialmente, nos reuníamos apenas para nos divertir, mas quando todos começaram a trabalhar, começamos a pensar mais no futuro. Também decidimos nos apoiar mutuamente em eventos importantes da vida, como casamentos ou funerais."

Por Que os Gyemoims Funcionam na Coreia do Sul?

Os grupos de gyemoim podem funcionar na Coreia do Sul por causa da natureza das interações sociais e da cultura de confiança do país.

Lá, por exemplo, é possível entrar em uma cafeteria, deixar sua mochila, notebook e carteira cheia de cartões de crédito e dinheiro na mesa e ir ao banheiro sem precisar se preocupar se tudo continuaria lá quando voltasse —embora, é claro, ocorram golpes e fraudes como em qualquer outro lugar.

Formar um grupo para poupar é tão comum na Coreia do Sul que um banco está se adaptando ao costume.

O KakaoBank, um braço do aplicativo de comunicação mais popular do país, o KakaoTalk, agora oferece uma conta bancária compartilhada e gerenciada por um titular escolhido.

Lee e Kim começaram seus grupos de gyemoim antes da existência do KakaoBank, então eles confiaram seus fundos a um membro de seus círculos. Alguns grupos, como o de Lee, ainda preferem esse método antigo de juntar dinheiro. Ele disse que um de seus grupos decidiu quem seria responsável pelo dinheiro por votação.

Os grupos de gyemoim de Kim agora usam a opção do KakaoBank porque ela permite que todos os membros vejam como o dinheiro arrecadado é movimentado. O titular da conta é a única pessoa com controle sobre os fundos, mas todos podem contribuir.

Os usuários podem configurar lembretes para enviar suas contribuições mensais para a conta e se comunicar por meio do chat do aplicativo.

Esses grupos, no entanto, não duram para sempre. As circunstâncias mudam, os amigos podem se desentender, alguém pode não querer mais participar ou uma nova pessoa pode querer se juntar. Quando isso acontece, cabe ao coletivo decidir como lidar com a situação.

Embora tenha havido uma separação pacífica no gyemoim de Kim, desacordos são comuns. Kim disse que tinha uma amiga que fazia parte de um gyemoim que acabou quando seus membros não conseguiram chegar a um acordo sobre uma viagem.

Para um grupo ter sucesso, ela disse, os membros precisam compartilhar interesses e valores semelhantes.

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.