'Nunca tive conversa com Tarcísio sobre ser ministro de nada', diz Campos Neto

Presidente do BC participou de jantar oferecido pelo governador de São Paulo no dia 10 de junho

Brasília e São Paulo

O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, negou nesta quinta-feira (27) ter conversado com o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), sobre um eventual cargo político após o fim de seu mandato na autoridade monetária.

"Nunca tive conversa com Tarcísio sobre ser ministro de nada. [...] Continuamos conversando sobre economia, como converso com vários outros agentes, parlamentares, pessoas do governo. As nossas famílias são próximas, então a gente tem uma amizade grande", disse. "Não tenho pretensão de me candidatar a nada nem ser político", acrescentou.

O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, em evento na sede do BC em São Paulo - Paulo Pinto/Agência Brasil

No dia 10 de junho, Campos Neto participou de um jantar oferecido pelo governador em São Paulo. Segundo o Painel S.A., o chefe da autoridade monetária teria sinalizado nessa ocasião aceitar ser ministro da Fazenda caso Tarcísio entre na disputa pelo Palácio do Planalto e vença a eleição.

Ainda de acordo com o relato, a avaliação do presidente do BC é a de que seria melhor Tarcísio se consolidar na chefia do governo de São Paulo por mais um mandato e se lançar à Presidência "consagrado".

O episódio levou o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) a dizer que o presidente do BC tem lado político e trabalha para prejudicar o país. Lula também comparou Campos Neto ao ex-juiz da Lava Jato, senador Sergio Moro (União Brasil-PR).

Em entrevista a jornalistas, em São Paulo, Campos Neto disse que conversa pouco sobre política com Tarcísio, por achar que tem pouco a acrescentar. "Nesse tema, a minha percepção é que ele não é candidato agora", afirmou.

"A última coisa que o Tarcísio, que é uma pessoa que não é de São Paulo e ganhou o governo e está fazendo um trabalho tão bom, iria fazer é pedir um conselho político para mim, que não entendo nada de política", disse Campos Neto.

Segundo o chefe da autarquia, o debate sobre uma eventual participação no governo de Tarcísio visa politizar a sua atuação no BC.

"Em 2030, vou ter 61 [anos]. Eu falar alguma coisa que vou fazer daqui a seis anos não faz o menor sentido. Nunca teve essa conversa. Tenho dito que vou para o mundo privado, provavelmente, ainda não sei hoje, vou fazer alguma coisa que misture tecnologia com finanças", afirmou.

"O resto é uma especulação para contaminar nosso trabalho técnico, colocar um viés político em um trabalho que não tem política, que é técnico", complementou.

O presidente do BC disse não ter se pronunciado antes sobre o assunto em respeito ao período de silêncio do Copom (Comitê de Política Monetária), entre os dias 12 e 25 de junho.

"O BC entrar nesse debate político não é bom. É importante trabalharmos com espírito de equipe", disse Campos Neto.

Ainda sobre a última reunião do Comitê, que manteve a Selic em 10,5%, Campos Neto salientou a unanimidade da decisão de junho, o que tranquilizou o mercado financeiro.

"A divisão de votos [da reunião de maio] não foi política, foi técnica", disse o presidente do BC.

Questionado se as críticas de Lula dificultam o trabalho do BC, Campos Neto afirmou que, "quando você compara o movimento de mercado em tempo real com pronunciamentos, há piora em algumas variáveis macroeconômicas, nos preços de mercado".

O dólar registrou alta de 1,16% e fechou cotado a R$ 5,518 na quarta-feira (26), dia da entrevista de Lula.

Campos Neto também minimizou sua participação no evento na Alesp (Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo), argumentando que foi convidado a comparecer a eventos similares no Mato Grosso e no Rio de Janeiro.

"São eventos até com, vamos dizer assim, visões partidárias diferentes. Quando eu vou nesses eventos, eu entendo que a minha presença é representando o Banco Central, que é um reconhecimento do trabalho que o Banco Central fez nos últimos tempos. Então, eu acho que é importante comparecer", disse.

Campos Neto afirmou ainda que entrar no debate político não é bom para o BC e voltou a defender o caráter técnico de sua atuação no comando da instituição. Para sustentar sua argumentação, deu como exemplo a escalada de juros feita pelo Copom em ano eleitoral, quando o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) concorria à reeleição.

"O Banco Central do Brasil fez o maior aumento de juros em anos de eleição na história do mundo emergente. [...] A gente veio de 2% para 13,75% [ao ano], mostrando claramente naquele período, véspera da eleição, que foi uma decisão técnica", disse. "O futuro vai continuar mostrando isso do mesmo jeito que nós mostramos no passado."

Quanto à sucessão do BC, o presidente disse que em nenhum momento anunciou que queria abreviar o seu mandato, que termina em 31 de dezembro. Segundo ele, é importante ficar até o último dia por esse ser "o primeiro grande teste da autonomia" da instituição.

"É importante que a autonomia tenha um valor institucional muito maior do que o valor político ou o valor do momento, que significa que eu tenho como dever fazer uma transição suave, independente de quem seja o sucessor, e fazer isso de tal forma que fique claro que o Banco Central é um órgão técnico."

Campos Neto vem defendendo que a indicação do seu sucessor seja feita até outubro para que a transição do comando do BC aconteça de maneira suave.

Segundo a lei da autonomia da autoridade monetária, aprovada em 2021, cabe ao presidente da República a indicação dos nomes para a cúpula do BC. Posteriormente, os indicados passam por sabatina na CAE (Comissão de Assuntos Econômicos) do Senado Federal. Os escolhidos são, então, levados ao plenário para aprovação.

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