Depois de Dasa e Amil, ainda há espaço para fusões e aquisições na saúde, dizem analistas

Ainda 'fragmentado', setor mais concentrado pode elevar sustentabilidade financeira

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São Paulo

A fusão da Dasa e da Amil, anunciada na sexta-feira passada (14), é o prelúdio para um movimento que deve se intensificar nos próximos anos: o de concentração de grandes empresas no setor de saúde.

Para especialistas consultados pela Folha, ainda há espaço para que mais companhias unam operações no ramo, visto como "muito" fragmentado em diversos elos da cadeia —desde prestadoras de serviço, como hospitais, clínicas e laboratórios, a empresas pagadoras, como operadoras de planos de saúde e financiadoras.

"É quase que natural: a fragmentação no setor é muito grande. Vejo espaço para que mais empresas busquem eficiência através da consolidação com outras", afirma Rafael Barros, chefe da divisão de saúde e educação da XP Investimentos.

"Nós sempre falamos em sinergia [nesses casos]. E sinergia é isso: tentar melhorar a estrutura para se tornar mais eficiente e ganhar mais musculatura para oferecer um serviço melhor para o maior número de pessoas possível, a preços competitivos. É buscar se tornar mais relevante no mercado."

A imagem mostra um quarto de UTI de um hospital, com uma maca coberta por lençóis descartáveis, equipamentos médicos e um monitor na parede. Há uma poltrona no canto inferior esquerdo da imagem para acompanhantes.
Unidade de Tratamento Intensivo do Hospital Samaritano (SP), que irá fazer parte da nova operação da Ímpar Serviços Hospitalares - Divulgação/Amil

A fusão entre Dasa e Amil, se aprovada pelo Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica), formará a segunda maior rede de hospitais do país, com 25 instituições e 4.400 leitos.

Batizado de Ímpar Serviços Hospitalares, o negócio é uma "joint-venture", jargão econômico para quando o empreendimento é controlado em conjunto pelas empresas que o formaram. Amil e Dasa terão 50% do capital cada, e o faturamento anual estimado é de R$ 10 bilhões.

Em tamanho, Ímpar só perde para Rede D’or —outra gigante formada por M&A (sigla em inglês para fusões e aquisições), que conta com 73 hospitais e 11.700 leitos. A companhia comprou a SulAmérica Seguros, uma das maiores operadoras de planos de saúde do país, por R$ 15 bilhões em fevereiro de 2022.

Um ano antes, Hapvida e Notredame Intermédica se uniram para formar a maior empresa de saúde suplementar do país, em acordo de R$ 49 bilhões.

A criação de gigantes, ainda que espaçada, indica uma nova onda de consolidações.

Antes das cifras chegarem à casa dos bilhões de reais, as fusões e aquisições aconteciam em escala menor, entre empresas do mesmo elo da cadeia.

"Por exemplo, Rede D’or e a própria Amil compravam hospitais, Dasa comprava laboratórios de diagnóstico, Fleury e Alta olhavam para clínicas de análise. Dos últimos anos para cá, com a pandemia, está acontecendo uma consolidação das consolidadoras", diz Harold Takahashi, sócio da Fortezza Partners e especialista em M&As em saúde.

"Podemos dizer que, antes, as aquisições aconteciam no varejo e agora acontecem no atacado. E isso é normal. O mercado norte-americano passou pelo mesmo movimento: primeiro cada segmento se consolida, depois ocorrem as consolidações das empresas de maior porte."

Ao mesmo tempo, "como o setor de saúde é gigante", transações de menor porte devem continuar acontecendo, como entre hospitais menores, ambulatórios, serviços de oftalmologia e ortopedia.

A junção de operações neste momento, além de potencializar a dita sinergia, também visa garantir sustentabilidade financeira após a crise instalada pela Covid-19, da qual as operadoras de planos de saúde são exemplo.

De acordo com Barros, da XP, as operadoras são "as que pagam a conta da saúde", e, se elas estão sob pressão, todo o setor também está.

O aumento da sinistralidade —a relação entre a quantidade de procedimentos feitos pelos beneficiários e o valor pago por eles à operadora— e a pressão sobre os custos das operações reduziram as margens dos planos de saúde, que começaram a se recuperar no primeiro trimestre deste ano.

Segundo dados da ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar), as operadoras registraram lucro líquido de R$ 3,33 bilhões nos três primeiros meses de 2024, um crescimento de 343% em relação ao mesmo período de 2023. Foi o melhor resultado para o período desde 2019, antes da pandemia.

A crise levou operadoras a desligarem clientes, unilateralmente, e a encerrarem vendas de alguns tipos de plano. Como relatou a Folha, a Amil cancelou milhares de contratos coletivos por adesão, entre eles os de crianças e jovens com TEA (transtorno do espectro autista), doenças raras e paralisia cerebral.

A justificativa é de prejuízos acumulados à operadora, resultando em altos índices de reajustes que não foram suficientes para reverter a situação.

Neste mês, o presidente da Câmara dos Deputados, Artur Lira (PP-AL), anunciou um acordo verbal com as operadoras em que elas se comprometeram a suspender temporariamente o cancelamento de novos contratos coletivos e a rever aqueles que já tinham sido suspensos, em especial, os de pessoas em tratamentos contínuos, como os autistas, com doenças raras e pacientes oncológicos.

Operações de fusão e aquisição, neste contexto, visam também a sustentabilidade da prestação do serviço e "ganhos de escala relevantes".

"Quanto maior você é, mais você consegue diluir custos fixos. E tem alguns ganhos de negociação: ao ter uma quantidade de vidas maior sobre seu guarda-chuva, você tem poder de barganha para ter melhores termos para contratar a rede prestadora. Ou para negociar com fornecedores. Ou para contratar times de profissionais. Ganho de escala no setor de saúde é muito importante, é o principal argumento para justificar as consolidações", diz Takahashi, da Fortezza Partners.

No caso de Dasa e Amil, a transação pode ainda trazer mais estabilidade para o setor, por diminuir riscos de inadimplência e, eventualmente, falência de empresas de grande porte.

Mas não livre de riscos: o negócio entre diferentes elos da cadeia pode desestimular a colaboração entre empresas.

"Por exemplo: quando Dasa se une a Amil, uma fonte pagadora, ela desincentiva que outras operadoras, como Bradesco e SulAmérica, fortaleçam essa joint venture. Se por um lado há ganho de escala, por outro pode ser gerado um distanciamento entre outras fontes pagadoras que poderiam ser parceiras antes", explica.

Para o consumidor, no curto prazo, não deve haver grandes mudanças. Mas, no futuro, a expectativa é da criação de uma rede de atendimento "mais definida", na visão de Barros.

"O consumidor possivelmente terá planos com hospitais e laboratórios preferenciais, e, com isso, é provável que a gente veja uma sustentabilidade maior no setor de saúde suplementar, porque isso tende a reduzir a escalada de custos", avalia.

Na ponta do lápis, também existe o potencial de desinflar os custos dos planos de saúde. De acordo com ele, em relatório da XP, a fragmentação e a desconexão entre as operadoras e as prestadoras de serviço acelera a necessidade de reajuste.

"O plano não sabe o que está sendo feito com o paciente, e às vezes o paciente faz mais exames do que o necessário e entra em tratamentos ineficazes, gerando custos que não precisam existir. Quando há uma aproximação entre as pagadoras e as prestadoras de cuidado, esse desperdício tende a diminuir", explica.

"É importante, para o beneficiário, que haja sustentabilidade do setor."

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