Leia colunas que Ant�nio Erm�rio de Moraes escreveu para a Folha
O empres�rio e presidente de honra do Grupo Votorantim, Ant�nio Erm�rio de Moraes, 86, morreu de insufici�ncia card�aca, em casa, em S�o Paulo, na noite de domingo (24).
O executivo teve os diagn�sticos de Alzheimer e hidrocefalia confirmados em 2006 e afastou-se da gest�o do grupo em 2008.
Durante 17 anos, Moraes escreveu uma coluna dominical para a Folha.
Confira, abaixo, a �ltima coluna do empres�rio para a Folha e, na sequ�ncia, outros textos publicados por ele no jornal.
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Um agrad�vel conv�vio
SEMPRE ACHEI um enorme privil�gio poder escrever em um jornal influente e independente e que presta tantos servi�os � democracia brasileira como a Folha de S.Paulo.
Ademais, gosto da palavra escrita. Meu professor de portugu�s do Gin�sio Rio Branco, o velho Castel�es, via nesse gosto uma poss�vel carreira de escritor. Previs�o errada, ali�s, como fazem muitos economistas nos dias de hoje... Formei-me engenheiro e, como tal, passei a escrever mais n�meros do que letras, at� que o saudoso Octavio Frias de Oliveira abriu-me a p�gina 2 da Folha. Era uma oferta de ouro para quem desejava debater com centenas de milhares de leitores os grandes temas nacionais. Aceitei na hora.
Os primeiros artigos foram motivo para longas conversas com o querido Frias, nas quais �amos muito al�m dos temas, querendo consertar o Brasil e o mundo. Senti-me feliz na nova empreita. Mas faltava a pr�tica. Minhas ideias n�o cabiam no espa�o do jornal.
�ta coisa irritante! Tive de aprender a pensar dentro da magreza da coluna. Mesmo assim, de quando em vez, protestava junto ao Frias, at� que um dia ele me perguntou: por que voc� n�o escreve um livro para contar a sua vasta experi�ncia de empres�rio, chefe de uma bela fam�lia e colaborador de tantas obras sociais? A pergunta me intrigou. N�o sabia se era uma sugest�o s�ria ou mera brincadeira. Fiquei com ela na cabe�a. Lembrei-me do Castel�es. Mas a mosca me mordeu. Pensei alguns dias e decidi: vou escrever uma pe�a de teatro. E acabei escrevendo tr�s.
Os atores amigos j� tinham me falado que as ideias transformam-se em verdadeiros torpedos quando expostas num palco, com emo��o, m�sica, cen�rios e figurinos. Eles est�o certos. Com essa moldura, elas penetram fundo e atingem a alma.
Como aprendiz de dramaturgo e na forma de fic��o, procurei passar para o p�blico, e em especial para a juventude, a minha infinita cren�a nos valores da humildade, do trabalho, da educa��o, da �tica, da liberdade, da democracia e, enfim, em tudo aquilo que meus pais me ensinaram e eu nunca esqueci.
De maneira muito modesta, no jornal e no teatro, nas empresas e nas obras sociais, esfor�o-me para exercer a cidadania, fazendo propostas, criando empregos e ajudando os necessitados. Para os artigos, meus leitores me alimentam com excelentes sugest�es. Sou muito grato a todos.
Otavio Frias Filho, ao suceder seu pai no jornal, acolheu-me com a mesma amabilidade, fazendo-me sentir parte da fam�lia Frias. Gente generosa. Competente. Patri�tica.
Sou grato a todos, inclusive aos funcion�rios da Folha, de quem espero igual apoio na inaugura��o de uma nova fase, na qual pretendo escrever ocasionalmente, mas com o mesmo prop�sito: ajudar a construir um Brasil melhor.
Coluna publicada em 04 de janeiro de 2009
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O apelo de Obama
GOSTEI DAS primeiras palavras do presidente eleito Barack H. Obama. Na noite da sua elei��o, ele pediu a ajuda do povo americano para enfrentar uma quadra de sacrif�cios.
� claro que esse pedido n�o cabia no desenrolar da campanha eleitoral, quando os candidatos normalmente prometem apenas bons tempos. Mas, naquela noite, ele mudou seu semblante, deixou o sorriso de lado e fez esse s�rio pedido, antes mesmo de agradecer quem o elegeu.
Do outro lado, o candidato derrotado, John McCain, de maneira elegante, reafirmou seu patriotismo ao pedir ao povo a mesma coisa, ressaltando ainda sua disposi��o de ajudar Obama em tudo o que for necess�rio, inclusive na fase de sacrif�cios.
Dou import�ncia a esses apelos, porque o povo americano foi acostumado –mal acostumado– a gastar muito acima do que ganha. Foi essa sedu��o pelo endividamento que instigou o mercado financeiro a criar uma montanha de pap�is envenenados que provocaram a bolha que explodiu com impacto no mundo inteiro.
A supera��o da crise exige um outro estilo de vida, no qual cada um ter� de viver com o que tem.
Os europeus e os japoneses, assim como outros povos que sofreram as agruras das guerras, aprenderam a viver sobriamente. � isso o que se espera dos americanos, porque a crise do momento equivale a uma verdadeira guerra. Houve destrui��o de grandes fortunas, algumas virtuais, outras reais, e, como tal, deixar�o de se transformar em investimentos por um bom tempo.
Reduzindo-se o investimento, reduzem-se o emprego e a renda, o que gera s�rios problemas sociais, para os quais o governo n�o pode dar as costas. Nas recess�es profundas, o trabalho que � feito por uma pessoa tem de ser feito por duas –cada uma trabalhando em tempo parcial e com sal�rio menor. � a regra da solidariedade.
As pessoas se sacrificam para salvar a comunidade e reconstruir a economia.
O governo brasileiro promete um cen�rio menos dram�tico. Oxal� isso ocorra! Mas n�o devemos desconsiderar a necessidade de fazermos o nosso pr�prio sacrif�cio. Sacrif�cio esse que tem de come�ar pelo governo, que gasta pouco com investimentos em infra-estrutura e demais com o custeio do seu quadro e com despesas (propaganda, viagens, consultorias etc.) que podem ser adiadas.
N�o h� por que temer uma redu��o do consumo no Natal se isso vier para a preserva��o do emprego e para a melhoria da infra-estrutura. O tempo � de sacrif�cio mesmo. Mas, com isso, voltaremos a crescer.
Coluna publicada em 09 de novembro de 2008
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�gua: para ser levado a s�rio
AS MUDAN�AS clim�ticas tomaram conta do notici�rio dos �ltimos meses. Relat�rios da ONU e de comiss�es de recursos naturais trouxeram dados preocupantes. O que se considerava uma hip�tese, hoje � s�ria amea�a ao planeta se o comportamento humano continuar o mesmo.
Vejamos o caso da �gua. O Brasil � um pa�s privilegiado. N�o s� possu�mos uma grande quantidade de bacias hidrogr�ficas como dispomos de um regime de chuvas que tem favorecido o trabalho e a vida nesta parte do planeta. Os �ltimos 24 meses, por exemplo, apresentaram resultados bastante satisfat�rios na maioria das regi�es do pa�s.
Enquanto isso, os Estados Unidos est�o vivendo um verdadeiro inferno astral. Em reportagem publicada no dia 8 passado, o jornal "USA Today" anuncia uma "seca para as calendas".
Um pa�s que depende tanto da sua agricultura, e que usa a �gua de forma abundante e at� excessiva, v� um ter�o de seu territ�rio atacado por forte seca.
A prolongada escassez de chuvas amea�a a na��o. Os Estados da Calif�rnia e de Nevada tiveram o mais seco m�s de maio desde 1924, e junho promete ser igual, o que est� obrigando os pecuaristas a vender o gado. A Fl�rida, um quase-para�so das �guas, tem v�rios lagos completamente secos. No Alabama, a cultura do milho est� severamente prejudicada. O prefeito de Los Angeles j� deu o alerta: pediu para a popula��o economizar, no m�nimo, 10% de �gua todos os dias.
Est� a� um exemplo para colocarmos as nossas barbas de molho. At� agora, foi tudo bem. As chuvas molharam bem as plantas e ajudaram a encher v�rios reservat�rios das usinas de energia el�trica. Alguns tiveram que abrir as comportas para equilibrar o seu n�vel.
Mas n�o se pode contar com isso eternamente. Os que ainda pensam que a �gua � um recurso ilimitado e eterno est�o enganados. Veja o que acontece nas zonas urbanas. Nossos mananciais j� deram alguns gritos de agonia. Estivemos � beira do racionamento por in�meras vezes. E, enquanto isso, vejo pessoas lavando cal�adas com esguicho, esbanjando �gua pot�vel, que custa muito para ser tratada e est� em vias de faltar.
N�o h� atividade humana que, direta ou indiretamente, n�o dependa da �gua. E a mais essencial de todas, a produ��o de alimentos, � a que mais consome o precioso l�quido.
Se os dados est�o reafirmando as mudan�as clim�ticas, ainda que por tr�s deles haja alguns elementos de incerteza, � hora de levarmos muito a s�rio o uso da �gua. A esta altura j� dev�amos ter implantados nos programas escolares disciplinas espec�ficas para informar as crian�as e formar novos h�bitos. � do seu comportamento que vamos ter de contar no futuro.
Coluna publicada em 17 de junho de 2007
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Criar empregos construtivos: prioridade n� 1
O BRASIL n�o consegue crescer e combater a infla��o. Ou faz uma coisa, ou faz outra. Essa tem sido a nossa trajet�ria nos �ltimos dez anos. No ano passado, comemoramos o alcance da meta de infla��o (5,1%), mas tivemos de amargar um crescimento rid�culo (2,3%). Para 2006, igualmente, ser� mais f�cil controlar a infla��o do que acelerar o crescimento. Se o Brasil continuar nesse ritmo, adverte um estudo da CNI, o pa�s levar� cerca de cem anos para chegar � renda da Cor�ia do Sul!
O que impede os economistas de implementar modelos que resolvam os dois problemas ao mesmo tempo? Afinal, tantos pa�ses fizeram isso –e com grande sucesso. N�o � preciso sair da Am�rica Latina para recolher exemplos. O do Chile � o mais eloq�ente.
Os pr�prios economistas, por�m, est�o cansados de alertar para o fato de que, sem um severo controle do d�ficit p�blico, n�o se chega a crescimento com pre�os est�veis. Nesse sentido, o pa�s progrediu pouco. Nos �ltimos anos, houve at� retrocesso. As despesas p�blicas explodiram e os investimentos minguaram.
Os dados s�o preocupantes. Em 2005, as despesas de custeio do governo federal chegaram a R$ 64 bilh�es, enquanto os recursos alocados em investimentos ficaram em R$ 16 bilh�es. Isso � um absurdo. O que o governo gastou na compra de material, pagamento de servi�os de terceiros, cafezinhos e viagens foi quatro vezes mais do que investiu em rodovias, saneamento e energia el�trica ("Governo gasta com a m�quina quatro vezes o que investe", "O Estado de S. Paulo", 20/03/ 2006).
Apesar do discurso de austeridade econ�mica, os dados indicam que, s� no ano passado, os gastos de custeio da m�quina p�blica cresceram 29%. Assim n�o h� bolso que ag�ente para pagar tributos ao governo, que, ali�s, bate recordes de arrecada��o todos os meses. Qualquer empresa que praticasse o expediente de gastar mais do que ganha estaria quebrada h� muito tempo.
Se h� uma reforma a ser feita com a m�xima urg�ncia � a da �rea fiscal. Esta, a prop�sito, n�o exige mudan�a na Constitui��o Federal nem confrontos desgastantes entre os parlamentares. � o tipo da reforma que, no jarg�o atual, depende da chamada "vontade pol�tica".
Um arrocho nas despesas e um aumento na efici�ncia nos gastos permitiriam reduzir drasticamente a rela��o entre a d�vida p�blica e o PIB, que, hoje, est� em torno de 52%. Um estudo da Fiesp indica que, se essa rela��o passasse para 25% em 2015, a taxa de crescimento do PIB brasileiro saltaria dos atuais 2,3% para 7% naquele ano, o que representaria uma m�dia anual de 5,7%.
A�, sim, se poderia pensar em emprego e renda adequados para os que entram e para os que est�o no mercado de trabalho. Ademais, essa seria a taxa compat�vel com a abund�ncia de recursos naturais de que o Brasil disp�e e com a capacidade de trabalho da nossa gente. Para os que gostam do jarg�o, vou repetir: essa travessia depende s� de vontade pol�tica. Criar empregos construtivos, sim. Empreguismo, n�o.
Coluna publicada em 02 de abril de 2006
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A enorme defici�ncia do nosso ensino
UMA NOVA publica��o do Ipea ("Radar Social", 2005) confirma o prec�rio quadro da educa��o brasileira. Apesar de 97% das crian�as entre 7 e 14 anos estarem na escola, os problemas s�o preocupantes.
Em pleno s�culo 21, cerca de 15 milh�es de brasileiros s�o analfabetos. Isso � um absurdo. Ademais, as taxas de reprova��o continuam muito altas: menos de 70% dos que se matriculam no ensino fundamental chegam � 8� s�rie. Menos de 41% dos adolescentes de 15 a 17 anos est�o na s�rie adequada � sua idade –os demais est�o atrasados. Entre as crian�as at� 6 anos, apenas 37% v�o a escolas p�blicas ou privadas.
Quanto � qualidade do ensino, o quadro � desalentador. Quando se examina o dom�nio da linguagem, cerca de 55% dos alunos da 4� s�rie est�o nos est�gios cr�tico ou muito cr�tico por apresentarem defici�ncias de leitura e de interpreta��o de textos simples. No campo da matem�tica, o problema � mais grave: 57% dos alunos da 8� s�rie e, pasmem, 69% dos alunos da 3� s�rie do ensino m�dio tamb�m est�o com enormes defici�ncias em fun��o da enfermidade curricular.
Educa��o � qualidade. Educa��o sem qualidade n�o � educa��o, � "engana��o". Nesse sentido, merece aplauso o programa "S�o Paulo � uma Escola", rec�m-lan�ado pela prefeitura da capital. As crian�as est�o ficando na escola em tempo integral. Pela manh�, t�m aulas, e � tarde fazem as li��es de casa com a ajuda de professores. Trata-se de uma s�bia estrat�gia, pois, se o quadro educacional � t�o prec�rio, � evidente que nele est�o inclu�dos os pais dessas crian�as que, mesmo querendo, n�o t�m condi��es de ajud�-las nos deveres de casa.
Al�m dessa importante complementaridade, o novo programa vai cuidar da sa�de e da alimenta��o das crian�as e, ademais, coloc�-las fazendo teatro e esportes, ouvindo m�sica, visitando museus e centros culturais.
A capital de S�o Paulo possui uma rede de equipamentos p�blicos bastante satisfat�ria no campo educacional, mas a educa��o n�o se resume a pr�dios. A pe�a fundamental � o professor bem preparado e estimulado para atender as crian�as. Em boa hora, o projeto da prefeitura colocou professores nos dois per�odos e, em termos de equipamentos, far� conv�nios com igrejas, funda��es, empresas, sindicatos e organiza��es n�o-governamentais n�o s� para usar as facilidades mas, sobretudo, para envolv�-las na mesma cruzada.
O "S�o Paulo � uma Escola" j� funciona nos 21 Centros Educacionais Unificados (CEUs) e entrou em fase experimental em escolas tradicionais da rede municipal. At� o fim do ano, a prefeitura pretende atender cerca de 100 mil alunos e, oxal�, dentro em breve, consiga atender as 480 mil crian�as do ensino fundamental.
Esse � o tipo de esfor�o que merece o nosso aplauso e o apoio de toda a sociedade. Numa situa��o t�o dram�tica como a brasileira, n�o basta pagar impostos. � preciso cobrar a utiliza��o inteligente desses recursos e ajudar em tudo o que for poss�vel para formarmos uma gera��o bem-educada para progredir na vida e alavancar o desenvolvimento deste pa�s.
Coluna publicada em 16 de junho de 2005
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A verdadeira responsabilidade democr�tica
VOC� QUE � eleitor da capital de S�o Paulo, j� votou? Parab�ns! Qualquer que tenha sido o seu candidato, voc� cumpriu com o seu dever. O voto � o primeiro passo para a constru��o de uma democracia.
Mas, se voc� n�o votou, n�o deixe de votar. Mesmo que tenha planos de passeio, vote primeiro, viaje depois. Fa�a isso. N�o podemos deixar de manifestar a nossa opini�o, pois � aqui que vivemos e � aqui que sofremos. Para poder reclamar, temos a obriga��o de votar.
A coloca��o do dia da elei��o no meio de tantos feriados precisa ser repensada. No meu entender de cidad�o que est� dispensado de votar (devido � idade), mas que vota por responsabilidade, os legisladores deveriam examinar bem o calend�rio antes de decidirem por esse ou por aquele dia, evitando que as elei��es caiam no meio de feriad�es.
No caso de S�o Paulo, houve uma a��o deliberada da prefeitura do munic�pio em espichar o mais poss�vel o presente feriad�o. O Dia do Funcion�rio P�blico (28 de outubro) foi movido de quinta-feira para sexta-feira. O dia 1� de novembro foi decretado ponto facultativo. Chegamos, assim, a cinco dias de folga: sexta, s�bado, domingo, segunda e ter�a (2 de novembro).
N�o quero julgar a inten��o desses expedientes. Penso, por�m, que todos os cidad�os que acreditam na democracia, que cultivam a democracia e que desejam democracia t�m a obriga��o de preservar por todos os meios a sobreviv�ncia desse sistema. Para o governante, isso n�o � apenas um dever democr�tico, mas uma responsabilidade de dirigente.
O que se espera dos governantes � que criem todas as facilidades para que os eleitores compare�am �s urnas e manifestem a sua vontade. O que n�o se espera � que criem dificuldades para votar ou incentivos para se ausentar. Penso que a lei deveria conceder ao Tribunal Regional Eleitoral –na sua responsabilidade de permanente vigil�ncia em favor da boa democracia– o direito de mudar o dia da elei��o em casos de calamidade p�blica e de solapamento das condi��es para o supremo exerc�cio do voto.
Mas deixemos isso de lado. Cada um se revela de acordo com aquilo que tem no fundo de seu cora��o. Para os que amam e veneram a democracia, tudo � feito para estimular o voto e apoiar o eleitor. Para os que se agarram no carreirismo pol�tico, tudo se justifica para garantir a vit�ria imediata.
De qualquer maneira, hoje � dia de festa. � a festa democr�tica na qual o povo ordeiramente � convidado a dizer o que deseja. Espero que as elei��es neste segundo turno em S�o Paulo e nas demais cidades do Brasil ocorram como as do primeiro turno –em paz– e com o m�ximo respeito a um regime que pode ter todos os defeitos do mundo, mas � ainda o melhor de todos.
Coluna publicada em 31 de outubro de 2004
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2004: educa��o, o fator decisivo
CHEGAMOS ao fim de um ano duro. Felizmente, os futur�logos falam de tempos melhores em 2004.
Os dados da �rea internacional s�o animadores. Os EUA parecem ter entrado numa rota de crescimento s�lido na qual ganhar�o trabalhadores, consumidores e empres�rios, com aumento de investimentos e empregos.
A virada no mercado de trabalho j� come�ou. O pa�s est� gerando cerca de 125 mil postos de trabalho por m�s, podendo chegar a 150 mil a partir de janeiro. Os mutu�rios de cr�dito imobili�rio substitu�ram os empr�stimos contra�dos a 10% ou 12% ao ano por empr�stimos a 4% ou 5% anuais, como consequ�ncia da taxa b�sica de juros, que est� em 1% ao ano.
S� esse refinanciamento liberar� um colosso de recursos para o consumo. Ali�s, o �ndice de confian�a dos consumidores neste fim de ano saltou para 91,7%, subindo dez pontos percentuais em um semestre. Um recorde.
A anima��o dos consumidores � propelida n�o s� pelas baixas taxas de juros, mas tamb�m pela redu��o de impostos praticada pelo governo federal, em especial a do Imposto de Renda. Os americanos come�am a receber de volta o que pagaram em excesso no ano passado. Isso tamb�m injeta enormes recursos no consumo dom�stico.
A desvaloriza��o do d�lar em rela��o ao euro est� impulsionando as exporta��es em dire��o � Europa, o que, evidentemente, ativa ainda mais a economia americana. E, no m�dio prazo, acabar� ativando tamb�m a economia europ�ia, pelo efeito que ter� na acelera��o das reformas previdenci�ria, trabalhista e tribut�ria que est�o em curso, elevando a efici�ncia da Europa. O mesmo poder� ocorrer com o Jap�o.
Em suma, o cen�rio internacional desponta como risonho e franco para 2004. Infelizmente, isso n�o � sin�nimo de prosperidade generalizada. O boom americano e as boas perspectivas da Europa e do Jap�o acontecem em um mundo onde os 20% mais ricos det�m nada mais, nada menos do que 82,7% da renda, e os 20% mais pobres, m�sero 1,4%. � uma selvageria, que atinge o Brasil em cheio. Aqui, os 20% mais ricos t�m 64,1% da renda e os 20% mais pobres, 2,2%. Isso conspira contra o crescimento sustentado.
A desigualdade est� sendo brutalizada pelo avan�o da globaliza��o. O que fazer? Nesse campo, temos de ser realistas e, em lugar de simplesmente protestar contra ela, observar e fazer o que outros pa�ses –por exemplo, as na��es do Sudeste Asi�tico– fizeram para tirar vantagem desse processo. A educa��o foi a pedra fundamental.
Precisamos saltar rapidamente dos 4,5 anos de escola –que � a m�dia de educa��o da for�a de trabalho do Brasil– para gradativamente chegarmos, em dez anos, � m�dia dos Tigres Asi�ticos. S� assim poderemos acompanhar as novas tecnologias e m�todos de produ��o e tirar vantagem deles para, com isso, participar do espet�culo do crescimento mundial.
Com esse sonho em mente, torcendo para que o nosso pa�s considere a educa��o a principal prioridade desta na��o, desejo a todos os meus leitores um Brasil mais respons�vel e pr�spero para 2004.
Coluna publicada em 28 de dezembro de 2003
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Nas barbas dos vereadores
COITADO do Zeppelin. Caiu num buraco no centro da capital de S�o Paulo e ali morreu. N�o � para menos. A caverna tinha cinco metros de di�metro e cinco de profundidade. � uma heran�a que vem de longe. Um funcion�rio da prefeitura, que se diz conhecedor de todos os buracos da cidade (deve ser um homem-enciclop�dia), garante que o "t�mulo" foi aberto no tempo do prefeito anterior, ou seja, est� l� h� mais de um ano, bem embaixo do pr�dio da C�mara Municipal, nas barbas dos 55 vereadores da cidade ("Jornal da Tarde", 6/2).
O Zeppelin era morador de rua, como milhares de outros que vivem sob os viadutos, onde dormem, cozinham e lavam roupa. Segundo testemunhas, o pobre homem morreu quando puxava umas t�buas para fechar o buraco e, com isso, proteger a vida dos pedestres desavisados. Foi por causa da sua preocupa��o com o pr�ximo que, ao dar um passo em falso, a cal�ada cedeu, e ele caiu no buraco.
Tudo aconteceu na madrugada da �ltima ter�a-feira. Ningu�m sabe o nome dele. Tinha cerca de 40 anos bem sofridos. Vagava pelas ruas do centro, catando papel e vendendo o que podia. Os que o conheciam nunca o viram cometendo atos de agress�o, viol�ncia ou vandalismo. Perto de onde morreu, ele mesmo havia desenhado uma pomba branca sob a qual escreveu a palavra "paz".
O Zeppelin era muito querido entre os demais moradores de rua. Tanto que um dos seus amigos se apressou em colocar uma cruz de madeira no local do infort�nio. Ali jaz o Zeppelin, morto pelo descaso governamental em uma cidade que tem o recorde de buracos por metro quadrado –e de todos os tamanhos e formas: trapezoidais, retangulares, esf�ricos e at� crateras.
Al�m de tantos buracos, v�em-se a escalada das picha��es que emporcalham as paredes e pontes, as grades arrebentadas nas divis�rias das avenidas, os camel�s que dominam os melhores pontos-de-venda, a sujeira jogada por todos os cantos do centro, as roupas �ntimas estendidas em pra�as p�blicas, os banhos que s�o tomados em chafarizes de ornamenta��o. Enfim, um abandono que s� aumenta � medida que o tempo avan�a.
Sem nenhuma conota��o pol�tica –e sim como observa��o de um paulistano–, n�o foi isso que os novos administradores, inclusive os vereadores, prometeram ao povo? Todos garantiram tornar a cidade limpa, com os jardins bem arrumados, os camel�s afastados da concorr�ncia desleal aos comerciantes-contribuintes e assim por diante –cen�rios que os mesmos administradores devem observar com frequ�ncia nas repetidas visitas que fazem �s cidades civilizadas do mundo.
Passei pelo buraco ainda ontem. Foi cercado por um tapume vermelho. Esperaram o Zeppelin morrer para tomar uma provid�ncia t�o corriqueira. Pobre Zeppelin. Pobres mun�cipes.
Coluna publicada em 10 de fevereiro de 2002
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Turismo e educa��o
PASSEI QUATRO fins-de-semana no Nordeste. Comecei por Fortaleza, depois Natal, em seguida, Recife e Salvador.
Nada melhor para mudar o catastrofismo de muitas pessoas do que viajar por aquelas paragens. � ali que se v� o quanto este pa�s tem de peculiar e de promissor. No caso do Nordeste, o que mais salta aos olhos � a sua enorme vantagem comparativa no campo do turismo. S�o belezas muito especiais, tanto naturais como culturais.
Notei um grande avan�o no turismo nas localidades que visitei. Turista n�o gosta de sujeira, de mau cheiro, de lixo espalhado nem, muito menos, de ruas esburacadas e de pra�as abandonadas. Pois bem. Tudo isso est� sendo bem equacionado nas cidades mencionadas. Parab�ns �s autoridades que v�m mantendo as ruas e pra�as bem tratadas.
Ali�s, o "Estado de S. Paulo" publicou, recentemente, extensa reportagem na qual alem�es, americanos, italianos, portugueses, holandeses, escandinavos e outros come�am a notar a melhoria do saneamento, dos hot�is e da infra-estrutura das zonas hoteleiras do Nordeste. Isso � animador, pois a divulga��o na base do boca-a-boca tamb�m � importante para atrair turistas estrangeiros para o Brasil.
O turismo nacional j� deu uma guinada positiva. Em 1996, a propor��o era de 60% de visitantes estrangeiros para 40% de brasileiros. Hoje em dia, essa propor��o inverteu-se. Os brasileiros est�o descobrindo as belezas do seu pr�prio pa�s para descansar e para se divertir.
Mas estamos muito longe das condi��es ideais para ter uma ind�stria de grande porte no campo do turismo. Educa��o � uma restri��o s�ria; seguran�a � outra; os pre�os de hot�is e passagens s�o inacess�veis para muita gente.
As grandes cadeias de hot�is descobriram que o seu maior potencial de crescimento est� no Brasil, pois, tanto os Estados Unidos como a Europa e a �sia atingiram uma satura��o e at� mesmo uma estagna��o dos neg�cios de hotelaria. Esses mesmos investidores levantam a pouca educa��o e a baixa qualifica��o da m�o-de-obra como s�rio obst�culo.
Na reportagem citada, muitos administradores de hot�is dizem que recrutam rapazes e mo�as que perguntam por que � preciso usar o pires com a x�cara. Na maioria dos casos, o problema � de educa��o b�sica, o que imp�e treinamentos em mat�ria de higiene pessoal –sem falar nos padr�es comportamentais que s�o esperados pelos h�spedes, incluindo, aqui, o dom�nio de uma l�ngua estrangeira e bons conhecimentos da geografia e da hist�ria locais.
Os investimentos em educa��o e qualifica��o nesse campo s�o cr�ticos. O que � feito pelas escolas atuais ainda � muito pouco para as necessidades e para a potencialidade do setor. Afinal o turismo � uma grande fonte de empregos. No Brasil, apenas 2% da for�a de trabalho � ocupada nesse setor. Temos tudo para atingir, e at� ultrapassar, os 10%, que � a m�dia mundial. Educar � o mais urgente primeiro passo.
Coluna publicada em 08 de abril de 2001
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A luta contra a mediocridade
EM MAT�RIA de educa��o, o Brasil conseguiu vencer a batalha da quantidade ao matricular 96% das crian�as na escola.
Nos �ltimos cinco anos, o n�mero de alunos do ensino fundamental saltou de 32 milh�es para 36 milh�es. No ensino m�dio, o salto foi de 5 milh�es para quase 8 milh�es.
Mas, ao lado disso, constatou-se uma grave deteriora��o da qualidade do ensino em todo o pa�s, o que atingiu as escolas p�blicas e privadas.
Segundo pesquisas recentes, os nossos alunos est�o chegando � 8� s�rie com conhecimentos de 4� s�rie. No ensino m�dio, o problema � igualmente grave. Grandes parcelas dos nossos estudantes n�o sabem calcular m�dias aritm�ticas, ignoram como tirar percentagens, s�o incapazes de identificar o argumento de um texto e at� mesmo de compreender o que l�em. Em suma, o ensino piorou.
Em recente avalia��o, realizada atrav�s de uma bateria de testes, os alunos obtiveram uma m�dia de apenas 280 pontos em matem�tica, dentro de uma escala que vai de 0 a 475 pontos. Em portugu�s, a m�dia n�o passou de 266, em uma escala de 0 a 400 pontos. O pior � que essas m�dias est�o caindo a cada ano que passa ("Dados do Sistema de Avalia��o da Educa��o, Bras�lia: Minist�rio da Educa��o, 2000").
Isso � muito grave. Al�m das necessidades geradas pela vida moderna na constru��o da democracia, dos bons h�bitos, do respeito humano e da cidadania, � imposs�vel ignorar o rigor das novas exig�ncias do mercado de trabalho. Atualmente, o que vale � o saber.
Nos dias atuais, os bens e os servi�os s�o hospedeiros de grande quantidade de conhecimentos.
Tomem o caso do com�rcio internacional. Nesse campo, o Brasil importa bens e servi�os de alta densidade de conhecimentos e exporta bens e servi�os que carregam pouco saber. Os primeiros custam muito, os segundos, pouco. Essa � a realidade.
Nenhum pa�s pode crescer, prosperar, gerar empregos e melhorar a renda importando sabedoria e exportando mediocridade. O mundo moderno exige n�o apenas anos de escola, mas, sobretudo, anos de boa escola, durante os quais as pessoas se capacitem de forma efetiva para dominar o mundo das coisas e das id�ias.
Os resultados das pesquisas indicadas devem ser levados muito a s�rio. A mat�ria extravasa a compet�ncia do poder p�blico. � bem prov�vel que, para o governo, al�m de manter as escolas p�blicas, fique o importante papel de liderar uma grande mobiliza��o de toda a sociedade para o pa�s atuar, de forma convergente e continuada, em favor da melhoria da qualidade da educa��o.
Com a crescente globaliza��o e a eleva��o dos requisitos profissionais, esse � um desafio dos mais urgentes –� uma quest�o de vida ou morte.
Coluna publicada em 3 de dezembro de 2000
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