Acontece neste domingo a cerimônia de entrega do Oscar, e a tensão não poderia estar maior. O filme "Tudo em Todo o Lugar ao Mesmo Tempo" é o grande favorito de acordo com casas de apostas e prêmios de sindicatos de Hollywood, mas a principal festa do cinema oferece surpresas de vez em quando. Poderia um filme como "Nada de Novo no Front" entrar nessa corrente e vencer de última hora?
Independente do resultado, a discussão sobre qual dos dez indicados merece receber a estatueta de melhor filme já monopoliza discussões, das redes sociais efervescentes às conversas do dia a dia. Todo mundo tem seu favorito.
Pensando nisso, a Folha reuniu dez jornalistas, críticos e colaboradores para defender cada um dos longas que brigam pela principal estatueta da noite no Dolby Theater de Los Angeles. A pergunta feita a todos os participantes é simples: por que este filme merece levar o Oscar?
Cada um foi encarregado de defender uma das produções escolhidas na votação promovida pelos membros da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas.
Leia as defesas abaixo pela ordem alfabética dos longas.
Avatar: O Caminho da Água
A continuação de "Avatar" é um sopro de vida em um momento em que Hollywood se rende à mais cruel impessoalidade. Enquanto somos engolidos por franquias burocráticas, o filme de James Cameron retoma a lógica do espetáculo e dá passos para frente.
As baleias tatuadas da tecnologia são um desbunde, mas pouco se fala do quanto "O Caminho da Água" naturaliza temas progressistas e difíceis dentro de narrativa clássica, mas afiada.
Entre os valores ambientais e a nossa relação de identidade com os próprios corpos, o filme mostra o raro caminho para um cinema de grandes proporções com intenções genuínas. Não há equivalente.
Pedro Strazza
repórter da Ilustrada
Os Banshees de Inisherin
Segundo filme com mais indicações, nove ao todo, o longa de Martin McDonagh é o principal representante britânico, o que já é suficiente para torná-lo atraente aos olhos da Academia. Eles amam britânicos, afinal.
Escrito nos anos 1990, inicialmente para o teatro, foi lapidado por McDonagh, já experiente, para a tela grande. O tempo ajudou o diretor a encontrar o tom ideal para a história do revés da amizade de dois antigos colegas de copo em uma pequena ilha da Irlanda.
Aos poucos, porém, McDonagh abandona o tom de humor ácido para se agarrar ao lado mais sombrio da trama, que é aparentemente simples, mas nunca simplória.
Sandro Macedo
colunista da Folha
Elvis
Baz Luhrmann sempre dirigiu com excesso, afetação e um glamour que beira a breguice. Assim, estourou em Hollywood com um estilo ímpar e muita personalidade. Mas nunca foi formalmente reconhecido como cineasta pelo Oscar, nem mesmo em meio à sensação que foi "Moulin Rouge!".
A indicação a melhor diretor não veio de novo, e premiar "Elvis" parece justo. Luhrmann preparou terreno para que o musical e todo o espetáculo inerente ao gênero ressuscitassem em larga escala, e "Elvis", cheio de atitude, prolonga o êxtase.
Leonardo Sanchez
repórter da Ilustrada
Entre Mulheres
Além de ser o único entre os dez candidatos dirigido e roteirizado por uma mulher —a incrível Sarah Polley, provavelmente uma das pessoas mais interessantes que andam por aí—, "Entre Mulheres" é também o único longa que tem como tema uma discussão atemporal e ao mesmo tempo urgente: como todos nós, da raça humana, podemos superar o machismo e a misoginia enraizados na construção da sociedade.
Em um filme lindo e agradável de assistir, com algumas das melhores atrizes da atualidade, a solução apresentada é tão óbvia como surpreendente.
Os Fabelmans
Mais do que autobiografia, "Os Fabelmans", para usar um termo da moda, é a autoficção de Steven Spielberg. Não é apenas a maior obra em disputa, como é um raro filme que não se importa em construir um drama familiar preciso. Seus personagens são tão imagéticos, sagrados e misteriosos quanto o trem de brinquedo que batiza o jovem diretor de cinema.
Spielberg, mestre do blockbuster, do alto dos seus 76 anos, entende que dos Lumière a DeMille, dos horizontes de John Ford à cidade dos sonhos de David Lynch, cinema é ação, reação —das plateias e do mundo— e colisão.
Henrique Artuni
editor-assistente da Ilustrada
Nada de Novo no Front
Não faz o menor sentido que filmes tão díspares sejam colocados para disputar o Oscar de melhor do ano. Todos os trabalhos indicados são ótimos, então por que não mandar uma mensagem para esses tempos turbulentos e premiar "Nada de Novo no Front"?
Não seria apenas simbólico. A produção épica e antibélica sobre a Primeira Guerra Mundial merece. É um tour de force de direção e atuação, cujas imagens ficam marcadas na mente do espectador. Traria também uma boa chance para debater a caduquice da categoria filme internacional.
Tár
Lydia Tár, regente vivida por Cate Blanchett, limpa a todo momento suas mãos com álcool em gel. No guarda-roupa, ternos alinhavados em cores neutras. A formalidade do mundo da música de concerto, sua assepsia e sobriedade, soa insuportável para muitos. Idem para a hierarquia, uma perdição para quem está no topo dela.
"Tár" não traz nenhuma novidade, mas tem a melhor atuação em algum tempo, mesmo com trejeitos caricaturais da atriz. O filme não vira um clipe do gênio Mahler, assumindo a forma de um drama exemplar.
Gustavo Zeitel
repórter da Ilustrada
Top Gun: Maverick
É improvável que "Top Gun Maverick" emplaque no Oscar. É o penetra da festa, mas seria bem refrescante e faria um bem danado ao cinema. Mostraria que aqueles filmes médios e competentes, especialidade de Hollywood, que os produzia às pencas até alguns anos atrás, podem, muito bem, voltar a existir.
Claro, ali Tom Cruise realiza proezas aéreas que na sua idade talvez já não permita a vida real ou mais ou menos real dos astros de cinema. Que importa? "Top Gun" é ligeiro e sem pompa, traz sequências cheias de humor e vivacidade e até encontra soluções que rejuvenescem a trama tradicional.
Original? Não. Profundo? Também não. Mas isso não é tudo na vida. O novo "Top Gun" é perfeito para levar o filho adolescente ou o irmão mais novo ao cinema. O garoto sairá de lá gostando de cinema bem mais do que nas infinitas vezes em que teve de se enfiar no 20º "Batman", no 30º "Homem-Aranha" para fruir de um pouco de fantasia no diluído universo dos super-heróis. Em "Top Gun", poderá sonhar com heróis talvez não reais, mas em todo caso humanos.
Por fim, esse é um filme nem tão sutilmente reacionário, na tradição hollywoodiana. Fará muito menos estrago nas jovens mentes do que muito comentarista econômico da TV. Isso eu garanto.
Inácio Araujo
crítico da Folha
Triângulo da Tristeza
Quem não gosta de ver bilionários se dando mal? Na toada de séries como "The White Lotus", "Triângulo da Tristeza" faz uma crítica bem-humorada do estilo de vida dos muito ricos.
Com personagens saídos de um bom livro de piadas infantojuvenil, a exemplo do capitão de iate comunista e do russo capitalista, o filme faz rir por quase duas horas e meia retratando a falência social daqueles que compõem o 1% —o que, infelizmente, ainda só existe na ficção.
"Triângulo da Tristeza" merece o Oscar por ser um filme de Oscar do jeitinho dele —tem um bom roteiro, ótimo elenco e uma cena escatológica que é a cereja do bolo.
Isabella Faria
repórter da TV Folha
Tudo em Todo o Lugar ao Mesmo Tempo
O filme, que vem de estúdio pequeno e tem um estilo que foge do convencional, conseguiu fazer o público chorar e rir, o que é um grande feito em uma época de blockbusters.
Além disso, conseguiu agradar a crítica. A entrega da estatueta para uma produção dirigida e protagonizada por asiáticos também seria uma conquista importante para essa comunidade e mostraria que "Parasita" não foi uma exceção.
Nathalia Durval
repórter do Guia
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