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'Grande Hotel Abismo' humaniza a trajetória dos teóricos da Escola de Frankfurt

Livro acompanha a vida de Horkheimer, Adorno, Walter Benjamin, Marcuse e Habermas

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Joel Pinheiro da Fonseca

Grande Hotel Abismo

  • Preço R$ 69,90 (456 págs.)
  • Autoria Stuart Jeffries
  • Editora Companhia das Letras
  • Tradução Paulo Geiger

Como permanecer marxista num mundo que não seguiu as previsões de Marx? Foi essa inquietação, especialmente depois do fracasso da revolução na Alemanha em 1919, que levou à fundação do Instituto de Pesquisa Social, conhecido como a Escola de Frankfurt.

É a história desse instituto que Stuart Jeffries conta em "Grande Hotel Abismo". Nele, acompanhamos a vida e as ideias de seus principais pensadores: Max Horkheimer, Adorno, Walter Benjamin, Marcuse e Habermas.

Sob a direção de Horkheimer, a escola se desviou do marxismo clássico e perdeu o foco exclusivo na economia, passando a estudar a cultura —fosse em seu impacto na sociedade e na mente, fosse para tentar explicar como a história se desviou do curso previsto pelo marxismo clássico.

Estava criada a teoria crítica, e seus proponentes se dedicariam ao longo de suas carreiras a isso: criticar.

Max Horkheimer, que dirigiu a Escola de Frankfurt - Reprodução

Jeffries não é acadêmico, e sim um jornalista que traz o olhar do leitor interessado, mas não do especialista —bem como suas próprias críticas—, para autores usualmente restritos à academia.

Ao longo de toda a obra, paira uma acusação que ele busca responder: a extrema direita contemporânea vê a Escola de Frankfurt como a grande artífice da destruição do Ocidente pela via da cultura.

Contra o fantasma conspiratório, fica claro o caráter desunido e antagônico dos pesquisadores da escola.

De um lado, temos Adorno, conservador que tinha ojeriza ao jazz (música impotente e alienante), valorizava a família (um esteio contra o totalitarismo) e temia a violência anárquica das revoltas estudantis de 1968 —chegou a ligar para a polícia quando manifestantes invadiram sua sala.

Do outro, Marcuse, que via na emancipação sexual uma chave para a revolução e aderiu aos protestos libertadores.

Para um mundo em constante transformação, as ideias têm que mudar também.

Dos anos 1960 em diante, Jurgen Habermas passou a dar o tom da escola, ao valorizar a democracia e o espaço público de troca de ideias como conquistas burguesas essenciais para qualquer projeto emancipatório e que precisam ser protegidas de forças da política e do mercado.

Ao final, ficamos com um grupo de intelectuais idiossincráticos lutando com instrumentos teóricos de outra era para encaixar ideias numa realidade que impunha resistência e não raro os perseguia.

Nessa tarefa foram capazes tanto de equívocos monstruosos e às vezes patéticos quanto de insights sobre os mecanismos psicológicos e culturais que ajudam na preservação do status quo.

O principal mérito do livro é reproduzir de maneira leve e bem-humorada o pensamento de autores cujos textos são áridos e recheados de jargão.

Além disso, a narrativa biográfica deles, repleta de adversidades —a fuga do nazismo, o suicídio trágico de Benjamin em 1940, os percalços nas revoltas estudantis— traz à tona o lado humano de cada um, enterrando os delírios conspiratórios.

Não foram os criadores da cultura contemporânea, e sim andarilhos desnorteados tateando seu rumo. Muito do que escreveram já envelheceu, bem como o pressupostos marxistas e freudianos de muitas análises, mas não deixa de ser rico acompanhar o desenvolvimento de uma linha de pensamento e sua aplicação a temas e momentos do conturbado século 20.

Tiveram, ademais, a grandeza de jamais compactuar com os regimes de terror que brandiam o nome de Marx; ao contrário, em diversas ocasiões cooperaram e defenderam o Estado americano.

Graças a Jeffries, a trajetória —por vezes trágica— desses intelectuais corre com interesse e bom humor, tornando-se acessível a um público maior.

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