Cr�tica
Cr�tica: 'Gota d'�gua' reencontra canto seco de Laila Garin
Chico Buarque diz que Paulo Pontes e ele criaram a pe�a, mas "Gota d'�gua" deixou de ser dos dois, arrebatada por Bibi Ferreira, que fazia Joana, a Medeia nesta vers�o brasileira da trag�dia de Eur�pides –antecedida e influenciada por outra, de Vianinha.
Como descreve o compositor num document�rio, ela "pegava aquele neg�cio e cantava e dizia aquilo com um furor". Pode-se falar o mesmo de Laila Garin nesta vers�o "a seco" do musical de 1975.
Ela � a cantora e atriz baiana que protagonizou o musical hagiogr�fico sobre Elis Regina, em 2014. Sua voz cortante e sua concentra��o dram�tica –que arrebataram aquele personagem e espet�culo, de resto adocicado– se estendem desta vez por diversas m�sicas de Chico, al�m das quatro originais que se tornaram "standards", gravadas por Bibi em disco.
Lenise Pinheiro/Folhapress | ||
Alejandro Claveaux (Jas�o) e Laila Garin (Joana), no palco do teatro FAAP |
"A seco", em parte, significa que sobrevive pouco dos di�logos, solil�quios e recitativos, escritos principalmente por Pontes, em versos, abrindo caminho assim para o acr�scimo de can��es de outros musicais do compositor. De cerca de tr�s horas, a dura��o cai para pouco mais da metade.
Somem personagens como Creonte, Alma e Corina, restando Joana e Jas�o, o sambista que a abandona com os dois filhos para se casar com a filha de um empres�rio. � uma pe�a originalmente de grandes propor��es, com 20 atores, que se optou por revisitar numa produ��o retalhada.
Quem mais perde � Alejandro Claveaux, que faz Jas�o. O ator se sai bem, longe de qualquer clich� de vil�o, pelo contr�rio, num par de di�logos conflituosos com a obstinada e furiosa Joana, mas nem tanto nas can��es. Tem uma voz p�lida, pequena, sobretudo em contraste com a de Garin.
Esta n�o fica atr�s nas cenas dram�ticas faladas, enfrentando um dos pap�is de refer�ncia na dramaturgia brasileira, retomado seguidamente desde Bibi –apesar do vatic�nio de Chico, de que sua sombra inibiria outras atrizes.
Talvez por estar em cartaz desde maio, tendo passado por Rio e outras capitais, "Gota d'�gua [A Seco]" demanda emocional e fisicamente da atriz, mas sua representa��o segue firme, segura.
� nas can��es que vem o maior arrebatamento, dela e do p�blico. Nem todas aquelas acrescentadas se encaixam bem no conflito supostamente essencial, do casal, mas Chico Buarque � a comprova��o de uma velha verdade sobre o teatro musical –as melhores can��es s�o aquelas que, sozinhas, j� poderiam ser toda uma pe�a.
Cada m�sica, na voz de Garin, se torna uma viagem narrativa. � o caso de "Baioque", misturando bai�o e rock, que foi acrescentada e parece falar da pr�pria atriz, embutindo a explica��o do subt�tulo: "Quando eu canto/ que se cuide quem n�o for meu irm�o/ O meu canto, punhalada, n�o conhece o perd�o/ Quando eu rio/ Quando eu rio, rio seco como � seco o sert�o".
As can��es originais ajudam a envolver o espectador na trama, emocionantes, como em "Basta um Dia" : "S� um/ belo dia/ pois se jura, se esconjura/ se ama e se tortura/ se tritura, se atura e se cura/ a dor/ na orgia". Mas a pr�pria "Gota d'�gua" � pouco explorada, registrada abruptamente no in�cio, apesar dos versos t�o centrais � trag�dia: "Olha a voz que me resta/ Olha a veia que salta/ Olha a gota que falta/ pro desfecho da festa".
O diretor Rafael Gomes e o cen�grafo Andr� Cortez n�o se d�o bem recorrendo �s chaves usadas na montagem anterior da dupla, de "Um Bonde Chamado Desejo". Soam estranhas, diversionistas, as interven��es sobre os atores, com cenografia e figurinos de muita demanda e pouca praticidade.
Gomes confirma, por outro lado, a habilidade para tirar interpreta��es femininas de primeira grandeza. Antes com Maria Luisa Mendon�a, agora com Laila –esta com o apoio das mulheres criadas por Chico Buarque.
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