Mostra rev� todas as fases da obra de Mondrian, pioneiro do neoplasticismo
O artista Piet Mondrian n�o gostava de linhas diagonais. Nem da cor verde e de representa��es figurativas da natureza e do mundo. Tolerava s� algumas flores, desde que fossem de pl�stico. Amava as pernas da dan�arina Josephine Baker, o charleston, o boogie-woogie, as cores prim�rias, tra�os retos, o preto e o branco.
Em seus quadros, esse pintor holand�s, morto aos 71, em 1944, parece sujeitar todo o caos da exist�ncia a uma esp�cie de ordem sublime.
Suas linhas pretas se estendem quase at� as bordas das telas sem nunca vazar para fora. Elas encerram quadrados e ret�ngulos vermelhos, azuis e amarelos de intensidades que variam, como se seguissem uma partitura musical.
Essa redu��o radical do mundo, levando o m�nimo � pot�ncia m�xima, est� por tr�s de toda a obra de Mondrian e do neoplasticismo, vanguarda que ele ajudou a fundar na Holanda no in�cio do s�culo 20. Quase cem anos depois de criar sua primeira composi��o abstrata em tons prim�rios, Mondrian e os neopl�sticos s�o tema de uma grande mostra no Centro Cultural Banco do Brasil.
Num pa�s marcado pela abstra��o geom�trica do concretismo e do neoconcretismo, movimentos que dominaram a arte brasileira nos anos 1950 e 1960, a vis�o das telas de Mondrian talvez tenha maior resson�ncia. Tamb�m lembra a utopia por tr�s de quase toda vanguarda surgida no s�culo passado -a vontade de plasmar uma ordem est�tica absoluta e universal.
"Eles queriam criar uma obra de arte total, fazer uma arte nova para uma sociedade nova", resume Benno Tempel, um dos organizadores da mostra paulistana e curador do Museu Municipal de Haia, de onde vieram suas cerca de 70 obras. "Era o estilo do futuro."
Esse estilo, ali�s, era explicado e propagandeado nas p�ginas da "De Stijl". Fundada h� cem anos pelo artista Theo van Doesburg em Amsterd�, a revista era ao mesmo tempo b�blia e manifesto aguerrido do neoplasticismo -Mondrian, em textos famosos pelo tom rebuscado e herm�tico, definiu ali muitos dos dogmas por tr�s de sua pintura.
Um deles era a cren�a no que o fil�sofo Mathieu Schoenmaekers chamou de matem�tica pl�stica, ou seja, na ideia de representar a vida s� com linhas e cores prim�rias. Mondrian tamb�m falava da busca de uma harmonia ancorada na energia vital de todas as religi�es, uma esp�cie de princ�pio universal por tr�s da exist�ncia.
Sua tentativa de extrair do mundo essa ordem secreta passava ent�o pelo abandono de toda a figura��o -ele via a imita��o do real pela pintura como um culto equivocado �s apar�ncias.
"Demorei muito tempo para descobrir que as particularidades da forma e da cor natural evocam sentimentos subjetivos que obscurecem a realidade pura", escreveu o artista. "A apar�ncia das formas naturais muda, mas a realidade permanece constante."
Sua busca pela realidade pura come�ou com suas pinturas de paisagem. No subsolo do CCBB, est�o algumas das telas mais antigas do pintor. Muito antes de se consagrar com as composi��es quadriculadas em cores prim�rias, Mondrian tentou retratar campos e praias seguindo a tradi��o de mestres de seu pa�s.
Embora essas telas tenham a mesma luz difusa e a paleta reduzida, de ocre e verde musgo, que marca o paisagismo holand�s, Mondrian j� fazia ent�o composi��es de enquadramento radical, quase fotogr�fico. Tamb�m eliminava a perspectiva ou qualquer ilus�o de profundidade.
ESQUELETO
Seu foco, desde os prim�rdios, parecia estar na arquitetura b�sica de linhas horizontais e verticais, como se dissecasse o mundo, trazendo para fora seu esqueleto.
N�o espanta que parte da cr�tica veja nessa opera��o de arqueologia do real uma esp�cie de herdeira moderna do que fizeram Rembrandt e Vermeer, mestres do realismo holand�s do s�culo 17, que buscaram retratar antes de tudo a vida como ela �.
"Da mesma forma que Mondrian, eles n�o idealizavam nada", diz Tempel. "Rembrandt e Vermeer n�o tentavam criar alus�es ao que n�o estivesse na tela do mesmo jeito que os neopl�sticos pensavam fazer o mais real dos realismos usando s� linhas e quadrados."
Mas Mondrian s� chegaria a seus quadrados coloridos depois de viver em Paris, onde absorveu parte do vocabul�rio cubista, em especial a tentativa de geometrizar a natureza que viu nas telas de Paul C�zanne.
Tamb�m ali, o pintor descobriu o charleston, ritmo celebrizado por Josephine Baker, e o boogie-woogie, estilo fren�tico de jazz que chacoalhava os cabar�s da capital francesa nos anos 1920.
Essa viv�ncia musical tamb�m aparece em suas telas. "Seus quadrados d�o certo ritmo � pintura, como se fosse m�sica", observa Tempel. "Os quadrados maiores teriam a mesma fun��o dos graves na m�sica, e os menores s�o mais um staccato."
Em Nova York, onde viveu os �ltimos anos de vida fugindo da Segunda Guerra Mundial, essa consci�ncia r�tmica de Mondrian tamb�m fez barulho. Suas obras s�o influ�ncia n�tida no trabalho de mestres do expressionismo abstrato americano, em especial na obra de Mark Rothko, famoso por seus campos crom�ticos intensos e vibrantes.
Uma das �ltimas telas que Mondrian pintou, ainda em Manhattan, marcou uma derradeira revolu��o em sua obra. Seu "Broadway Boogie-Woogie" elimina as linhas pretas em torno dos quadrados, como se um pouco de desordem entrasse na composi��o.
Na trama quadriculada das ruas e avenidas nova-iorquinas, a Broadway, ali�s, � uma grande linha diagonal, algo que o artista detestava. Talvez, j� no fim da vida, Mondrian estivesse se deixando seduzir pelo caos.
MONDRIAN E O MOVIMENTO DE STIJL
QUANDO abre nesta segunda (25); de qua. a seg., das 9h �s 21h; at� 4/4
ONDE CCBB, r. �lvares Penteado, 112, tel. (11) 3113-3651
QUANTO gr�tis
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