Em comodato, acervo de Mario Cravo Neto vai para Instituto Moreira Salles
A Bahia se mudou para o Rio. Ao menos durante dez anos, per�odo do contrato de parceria firmado entre os quatro filhos de Mario Cravo Neto e o Instituto Moreira Salles.
Ap�s uma negocia��o que durou quatro anos, todo o acervo do fot�grafo, guardado at� ent�o em sua casa, em Salvador, com cerca de 100 mil itens –entre negativos, cromos, publica��es de refer�ncia, c�pias de contato e outros–, foi transferido para a sede carioca da institui��o, que ir� preservar, digitalizar e documentar a obra do artista.
Morto em 2009, aos 62, Cravo Neto documentou a afro-brasilidade e o sincretismo religioso na Bahia, pano de fundo constante em sua carreira. As imagens registram fragmentos do corpo humano em composi��es que lembram esculturas, fruto da experi�ncia anterior � fotografia e da influ�ncia do pai, o escultor Mario Cravo Jr.
O arquivo do artista baiano se somar� aos acervos de outros importantes nomes da fotografia brasileira que tamb�m est�o sob os cuidados do IMS, como os de Marc Ferrez, Alice Brill e Thomaz Farkas.
Segundo Sergio Burgi, coordenador de fotografia do instituto, a ideia � "mergulhar na cole��o para fazer leituras tanto de conjuntos desconhecidos como de s�ries estruturantes da obra do artista", o que gerar�, num prazo entre quatro e cinco anos, uma exposi��o de "grande porte" e, depois, uma publica��o em livro.
Assim, ser�o revistos os registros da Bahia, as imagens do per�odo em que viveu em Nova York, nos anos 1960, e tamb�m cenas de sua vida familiar. Para Christian Cravo, 41, filho do fot�grafo, o principal trunfo deste arquivo sobre outros � a predomin�ncia da produ��o autoral do baiano.
"Grande parte de v�rios acervos � feita de trabalhos comerciais, o que d� menor possibilidade de explora��o."
Burgi concorda: "Trata-se de um arquivo de artista. H� muito o que se pensar sobre Mario Cravo Neto em um contexto de estrutura��o de uma linguagem dos anos 1970 em que a cor � fundamental", diz.
"� uma leitura n�o s� da obra dele, mas que se associa a outros fot�grafos do per�odo, como Miguel Rio Branco."
Embora a s�rie "Eterno Agora", trabalho mais conhecido de Cravo Neto, tenha sido feita de tons monocrom�ticos, ele tamb�m produziu grande material em cores, caso das imagens do lend�rio fotolivro "Laroy�" e de "Butterflies and Zebras", mostra exibida em 2013, na Pinacoteca.
Na �poca, a exposi��o com curadoria de Di�genes Moura quase naufragou. Uma disputa pelo esp�lio de Cravo Neto entre os filhos de seu primeiro casamento e os da terceira uni�o por pouco n�o impediu a mostra. Christian precisou entrar com a��o na Justi�a para garantir que o evento pudesse ocorrer.
O acordo com o IMS sinaliza que os problemas entre os herdeiros cessaram, pois, segundo Burgi, o instituto s� fecharia esta negocia��o com toda a fam�lia, e n�o com parte de quem responde pela obra.
PROTECIONISMO
"Voc� sabe como baiano � protecionista, n�?", pergunta Christian. Entre desarranjos de que os irm�os preferem n�o falar est�o o tipo de gest�o aplicada ao arquivo e se o mesmo deveria seguir em Salvador.
Procurados, os filhos mais novos, Lukas, 26, e Akira, 24, comemoraram o acordo, mas se recusaram a comentar o que mudou para que se estabelecesse um consenso. A filha mais velha, Lua Diana, vive em Copenhague, na Dinamarca. Ela e Christian defendiam uma gest�o mais "profissional", enquanto os outros queria algo mais "familiar" e que o arquivo n�o sa�sse da capital baiana.
"O mundo de hoje � implac�vel. Tirar um nome do mercado por dez anos pode ser devastador para uma carreira", defende Christian. "Ficou claro que essa situa��o n�o tinha como continuar."
A venda de obras, que serve de sustento para o rec�m-formado Instituto Mario Cravo Neto, est� fora dos termos da parceria, que, segundo as duas partes, n�o envolveu dinheiro. Christian diz que negociar o arquivo permanentemente est� "fora de cogita��o".
"Sempre vi com maus olhos fam�lias que vendem acervos que representam suas hist�rias de vida para institui��es que s�o vistas como frias", diz ele. "O IMS, por melhor trabalho que fa�a, sempre vai carregar aquele peso de ser uma institui��o fria, que tem dinheiro de banco por tr�s."
Para o coordenador do instituto, a posi��o de n�o querer comercializar o arquivo � justa e mostra a preocupa��o da fam�lia com a obra, embora a men��o ao IMS seja contradit�ria. "Interpreto como uma forma de deixar claro, da maneira dele, que neste processo n�o haver� venda."
*
RAIO-X: MARIO CRAVO NETO
CARREIRA
Nascido em Salvador, em 1947, o fot�grafo iniciou suas experi�ncias com escultura e fotografia na Alemanha, aos 17 anos. Entre 1968 e 1970, viveu em Nova York, onde estuda na Art Student League. Estabeleceu-se como um dos mais importantes artistas brasileiros ao retratar a afro-brasilidade e o sincretismo religioso na Bahia.
BIBLIOGRAFIA
Mario Cravo Neto � autor de 19 livros, entre eles "Flecha em Repouso", "Laroy�", "Os Estranhos Filhos da Casa", "A Cidade da Bahia" e "Bahia".
Livraria da Folha
- Box de DVD re�ne dupla de cl�ssicos de Andrei Tark�vski
- Como atingir alta performance por meio da autorresponsabilidade
- 'Fluxos em Cadeia' analisa funcionamento e cotidiano do sistema penitenci�rio
- Livro analisa comunica��es pol�ticas entre Portugal, Brasil e Angola
- Livro traz mais de cem receitas de saladas que promovem saciedade