Nos 166 anos da morte de Edgar Allan Poe, veja 3 dicas pop e leia um conto
A morte de Edgar Allan Poe, h� exatos 166 anos, � um mist�rio que talvez nem mesmo seu famoso detetive, Auguste Dupin, conseguiria resolver.
N�o se sabe exatamente o que levou o escritor, um dos fundadores da fic��o policial e pai dos contos de terror, a procurar um hospital em Baltimore, nos EUA, em 3 de outubro 1849.
Ele circulava pelas ruas da cidade em estado de del�rio, usando roupas emprestadas e incapaz de explicar como havia chegado, naquela condi��o, � cidade.
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O poeta, contista e romancista Edgar Allan Poe em ilustra��o do artista pl�stico ingl�s David Gough |
Especula-se que Poe tenha parado por ali no caminho at� a Filad�lfia, saindo de Richmond cinco dias antes. Morreu quatro dias depois, em 7 de outubro, no hospital.
H� diversas teorias que tentam explicar a morte do escritor, segundo o jornal "Los Angeles Times". H� quem diga ele tenha sido envenenado, outros culpam o abuso do �lcool (falido, havia se rendido ao alcoolismo ap�s a morte da mulher, Virginia), ou mesmo uma gripe.
Um dos grandes leitores de Poe e tradutor de sua obra para o Espanhol, o belga-argentino Julio Cort�zar (1914-1984) escreveu uma breve biografia do autor americano, publicada no Brasil no segundo volume de sua "Obra Cr�tica" (editora Civiliza��o Brasileira).
Na reconstitui��o de Cort�zar, Poe, j� chegou a Baltimore em 29 de setembro de barco. Dali, esperava tomar um trem at� a Filad�lfia, "mas era preciso esperar v�rias horas. Numa dessas horas seu destino foi selado".
"Sabe-se que j� estava �brio quando visitou um amigo. O que aconteceu depois � mat�ria apenas de conjetura. Abre-se um par�ntese de cinco dias, ao fim dos quais um m�dico, conhecido de Poe, recebeu uma mensagem apressadamente escrita a l�pis informando que um cavalheiro 'um tanto mal vestido' precisava urgentemente de sua ajuda", narra Cort�zar.
Antes de morrer, Poe teria perguntado se restava alguma esperan�a. "Como lhe disseram que estava muito grave, retificou: 'N�o quis dizer isso. Quero saber se h� esperan�a para um miser�vel como eu'. Morreu �s tr�s da madrugada do dia 7 de outubro de 1849. 'Que Deus ajude a minha pobre alma', foram suas �ltimas palavras."
O que escreveu em seus 40 anos de vida —poemas como "O Corvo" e contos como "Assassinatos na Rua Morgue" ou "Carta Roubada– segue influenciando gera��es de escritores (e m�sicos, roteiristas, artistas de toda a ordem).
Abaixo, a "Ilustrada" indica tr�s refer�ncias modernas a Edgar Allan Poe e publica um de seus contos de arrepiar: "O Retrato Ovalado".
Poe no cinema
Entre as tantas vers�es dos mist�rios do escritor levados ao cinema, recomendamos prestar aten��o na mais recente: a anima��o "Extraordinary Tales", que estreia nos EUA em 23 de outubro, contando cinco hist�rias criadas por Edgar Allan Poe.
O time de dubladores faz bonito: Bela Lugosi, Guillermo del Toro e Christopher Lee (o eterno Dr�cula, morto em junho deste ano).
Na TV
Esta adapta��o do poema "O Corvo", protagonizada por Homer Simpson, que foi ao ar em um especial de Halloween dos "Simpsons"
H� dois anos, a s�rie brasileira "Contos do Edgar" relembrou os mist�rios do autor. Veja um epis�dio, clicando na imagem abaixo:
Eduardo Knapp - 5.fev.2013/Folhapress | ||
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O ator Marcos Andrade em cena da s�rie "Contos do Edgar" |
Na m�sica
Lou Reed gravou um �lbum, "The Raven", inteiramente inspirado na imagina��o de Allan Poe:
E leia, abaixo, o conto "O retrato ovalado" (1842) publicado em "Hist�rias Extraordin�rias" (ed. Companhia da Letras, R$ 23):
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O RETRATO OVALADO
O castelo no qual meu criado estava decidido a entrar � viva for�a, n�o consentindo que eu, ferido como estava, tivesse que passar a noite debaixo da chuvarada, era um grande edif�cio senhorial e melanc�lico que durante muitos e muitos s�culos fora grito de guerra nos montes Apeninos. Segundo nos disseram, tinha sido abandonado temporariamente por seus donos. Acomodamo-nos numa das salas menores, que era tamb�m a mais modestamente mobiliada. Estava situada num torre�o um tanto afastado do corpo principal do castelo; seus m�veis, seus adornos, ricos e luxuosos, pareciam maltratados pela a��o do tempo e apenas conservavam poucos vest�gios do antigo esplendor. Sobre as paredes, ca�am tape�arias e trof�us her�ldicos, bem como grande quantidade de quadros modernos encerrados em molduras de ouro e madeiras fin�ssimas. Devido talvez ao del�rio que me produzia a alta febre, senti crescer dentro de mim um grande amor por aqueles quadros que, como prodigioso e estranho museu, tinha diante dos olhos. Mandei o criado fechar as pesadas portas e as altas janelas, pois era noite cerrada, e acender o candelabro de sete bra�os que encontrara sobre a mesa. Descerrei em seguida os cortinados de cetim e veludo que rodeavam o dossel de minha cama. Queria, assim, se por acaso n�o chegasse a conciliar o sono, distrair-me ao menos na contempla��o dos quadros e na leitura de um livro de pergaminho que havia encontrado sobre a almofada, o qual parecia conter a descri��o e a hist�ria de todas as obras de arte que se achavam encerradas naquele castelo.
Passei quase toda a noite lendo. Naquele livro estava de fato a hist�ria dos quadros que me rodeavam. As horas transcorreram rapidamente e, sem que eu percebesse, chegou a meia-noite. A luz do candelabro me feria os olhos e, sem que meu criado o notasse, coloquei-o de tal modo que somente projetasse seus t�nues raios sobre a superf�cie escrita do livro.
Mas aquela troca de luz produziu um efeito inesperado. Os fachos das numerosas velas projetaram-se ent�o sobre um quadro da alcova que uma das colunas do leito havia anteriormente envolto em sobra profunda. Era o retrato de uma jovem, j� quase uma mulher. Dirigi ao quadro uma olhadela r�pida e fechei os olhos. N�o o compreendi bem a princ�pio. Mas, enquanto minhas pupilas permaneciam fechadas, analisei rapidamente a raz�o que me fizera cerr�-las assim. Era um movimento involunt�rio, para ganhar tempo e para assegurar-me de que meus olhos n�o me haviam enganado, para acalmar e preparar meu esp�rito para uma contempla��o mais serena. Ao cabo de alguns momentos, olhei de novo para o quadro, dessa vez fixa e penetrantemente.
J� n�o podia duvidar, ainda que o quisesse, de que agora o via com muita clareza. O primeiro esplendor da chama do candelabro sobre a tela tinha dissipado a confus�o de meus sentidos e me chamara � realidade.
O retrato era de uma jovem. Um busto; a cabe�a e os ombros pintados nesse estilo que chamam, em linguagem t�cnica, estilo de "vinheta"; um tanto � maneira de Sully em suas cabe�as prediletas. O seio, os bra�os e os cachos de cabelos radiantes fundiam-se imperceptivelmente na sombra que servia de fundo ao conjunto. A moldura era oval, dourada e trabalhada ao gosto moderno. Como obra de arte, n�o se podia encontrar nada de mais admir�vel do que a pintura em si. Mas pode ser que n�o fosse nem a execu��o da obra nem a beleza daquele semblante juvenil o que me impressionou t�o s�bita e fortemente. Menos ainda devia acreditar que minha imagina��o, saindo de um sonho, tivesse tomado aquela mulher por uma pessoa viva. Vi de imediato que os pormenores do desenho, do estilo e do aspecto da moldura n�o me permitiram tal ilus�o, ainda que moment�nea, dissipando de pronto semelhante encantamento. Fazendo essas reflex�es, permaneci estendido uma hora inteira, com os olhos cravados no retrato. Tinha adivinhado que o "encantamento" da pintura era uma express�o vital, absolutamente adequada � pr�pria vida, que primeiro me tinha feito estremecer e, por fim, me subjugara, aterrorizado. Com um terror profundo e insopit�vel, coloquei de novo o candelabro em sua primitiva posi��o. Tendo ocultado assim � minha vista a causa dessa profunda agita��o, procurei ansiosamente o livro que continha a an�lise do quadro e sua hist�ria. Fui em busca do n�mero que designava o retrato oval e li o seguinte relato:
"Era uma jovem de rara beleza e n�o menos am�vel do que alegre. Maldita foi a hora em que viu e amou o artista, casando-se com ele! Ele, apaixonado, estudioso, amava, mais do que sua esposa, a sua Arte; ela, uma jovem de rara beleza e n�o menos am�vel do que alegre, nada mais do que luz e sorrisos, �gil como a lebre solta no campo, amando e acariciando todas as coisas, odiando apenas a Arte que era sua rival, n�o temendo mais do que a palheta e os pinc�is. Foi uma coisa terr�vel para ela ouvir o pintor falar do desejo de pintar sua esposa. Mas ela era obediente, e sentou-se com do�ura durante longas semanas no sombrio e alto ateli� da torre, onde a luz penetrava por uma claraboia de cristal. Ele, por�m, o pintor, punha seu destino e sua gl�ria no retrato, que avan�ava em cores de hora para hora e de dia para dia. Era um homem apaixonado e estranho, que se perdia em sonhos, tanto que n�o queria ver que a luz que filtrava t�o lugubremente naquela torre afastada extenuava a sa�de e a almade sua mulher, que enfraquecia visivelmente aos olhos de todo o mundo, exceto aos dele. Contudo, ela sorria sempre, sem se queixar, porque via que o pintor sentia um prazer doido e ardente em sua tarefa, e trabalhava noite e dia para pintar aquela que amava tanto, mas que se tornava cada dia mais abatida e mais d�bil. E, na verdade, os que contemplavam o retrato falavam em voz baixa da extrema semelhan�a do original como de uma prodigiosa maravilha e como de uma prova n�o menor do talento do pintor do que de seu profundo amor por aquela a quem pintava t�o milagrosamente bem. Todavia, mais tarde, quando a tarefa se aproximava de seu fim, j� ningu�m podia visitar a torre: o pintor tinha enlouquecido com o ardor de seu trabalho e n�o tirava os olhos da tela sen�o para ver a fisionomia da mulher. E n�o queria ver que as cores que gravava na tela, ele as ia tirando das faces daquela que estava sentada � sua frente. E quando, decorridas muitas semanas, j� faltava muito pouco trabalho —nada mais do que uma pincelada sobre os l�bios e uma sombra sobre os olhos—, o esp�rito da mulher palpitou como a chama pr�xima de extinguir-se palpita numa l�mpada; e ent�o o pintor deu a pincelada sobre os l�bios e a sombra sobre os olhos e, durante um momento, quedou em �xtase ante o trabalho realizado; um minuto depois, quando o olhava extasiado, um estremecimento de terror percorreu seu corpo, e ele come�ou a gritar com voz aguda e destemperada. '� a vida, � a pr�pria vida que aprisionei na tela!' E quando se voltou para contemplar a mulher, viu que ela estava morta."
Livraria da Folha
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