TV erra em n�o contemplar mais a elite, diz Jo�o Emanuel Carneiro
Jo�o Emanuel Carneiro, 45, "acha" que j� conseguiu entrar para o seleto viveiro das "seis ararinhas azuis", como o colega Aguinaldo Silva define os novelistas, "esp�cies raras e em extin��o", donos do hor�rio nobre na Globo.
"� um lugar nada garantido. Se voc� se fiar nisso, t� ferrado", afirma ele � Folha, em um restaurante na orla de Ipanema, no Rio de Janeiro.
Renato Rocha Miranda/Divulga��o/TV Globo | ||
Jo�o Emanuel Carneiro, autor da nova novela 'A Regra do Jogo', posa em lix�o cenogr�fico no Rio |
Tr�s anos ap�s o fen�meno "Avenida Brasil", que al�m de �tima audi�ncia gerou o maior burburinho da �ltima d�cada na teledramaturgia e foi vendida para 134 pa�ses -um recorde-, Carneiro retorna ao ar nesta segunda (31) com "A Regra do Jogo".
A trama das nove, com dire��o de Amora Mautner, tem a miss�o de recolocar a audi�ncia na casa dos 30 pontos no Ibope -na Grande S�o Paulo, cada ponto equivale a 67 mil casas. Com �ndices abaixo dessa m�dia, a antecessora "Babil�nia" foi encurtada em dois meses.
A novela, um thriller, parte da premissa filos�fica do que seria o certo e o errado. O protagonista, interpretado por Alexandre Nero, � um bandido que se vende como bom mo�o (tem uma ONG de fachada) e se apaixona pela ideia de se tornar santo.
O autor v� na trama um paralelo com o momento pol�tico atual do Brasil. "Me fascina o car�ter das pessoas. At� que ponto elas podem ir, se redimir", diz. "Brecht falava que quem tem fome n�o pode ter moral. N�s brasileiros somos coluna do meio muitas vezes, perdoamos muito."
Tamb�m se mostra disposto a "olhar em volta" ao retratar o pa�s. Para ele, a classe C "j� foi plenamente contemplada" pela TV brasileira, ao contr�rio das classes A e B.
"Quando fiz 'Avenida Brasil', tinha a reflex�o de que as tramas tratavam a elite sempre igual, o 'rico de novela. Aquela 'mans�o da milion�ria' n�o mais retrata o Brasil."
Leia as respostas de Carneiro para a Folha.
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Novela masculina
� minha primeira novela centrada num homem. O Romero R�mulo [Nero] � um santo torto. � algu�m que quer tentar se emendar, se acertar. A novela � a trajet�ria dele, pendendo entre o bem e o mal.
"Avenida Brasil"
Temo compara��es, mas n�o � algo fundamentado. Elas s�o totalmente diferentes. O medo de ser rejeitado e ser chato tem que acompanhar a gente o tempo todo. Se voc� perde esse medo, t� ferrado.
A grande coisa da novela � inventar um brinquedo novo pra mim. O que eu j� fiz n�o tem gra�a. N�o existe m�tier. Cada vez voc� � posto � prova.
Rico de novela
A classe C j� foi plenamente contemplada h� anos. A gente vive num pa�s que � classe C. Ponto. J� �. Se a TV errou em algo, foi em n�o contemplar mais as classes A e B. Este p�blico quer ver coisas passadas no Brasil, e em portugu�s.
Quando fiz "Avenida Brasil", uma reflex�o que tinha � que as tramas tratavam a elite sempre igual, o "rico de novela". Aquela "mans�o da milion�ria" n�o retrata mais o Brasil. Tem que olhar em volta.
Sem improviso
Iniciamos o processo da novela h� dois anos. N�o creio na mitifica��o do improviso, em que antigamente a TV se baseava, com testes de elenco feitos com a novela no ar. "Da Cor do Pecado" [2004] estreou com 80 epis�dios prontos.
P�blico inteligente
O p�blico � mais inteligente do que a gente imagina. Menosprez�-lo � o maior erro. � como uma crian�a: se voc� leva-la ao Museu do Prado, ela vai adorar aquelas pinturas. Se s� leva ao parque de divers�o, s� vai conhecer aquilo.
Inova��o
As minhas novelas t�m a volta para uma estrutura de narrativa mais antiga, mas com personagens contradit�rios. Inovar n�o tem que ser uma preocupa��o. A novela � quase um servi�o p�blico, pertence a quem v�. Voc� passa a fazer sucesso quando come�a a se conectar com as pessoas, e n�o fazer o que elas esperam.
Audi�ncia
O Brasil ainda v� muita TV. Assim como houve a sa�da para a internet, pode haver uma volta para a TV aberta.
Acompanho a audi�ncia, mas n�o fico ref�m. Minhas hist�rias principais nunca mudaram, mas j� mexi em paralelas. Em "A Favorita" [2008], quando a Lilia Cabral apanhava, aumentava a audi�ncia. Ela apanhou muito [risos].
Se me pedissem para alterar a hist�ria [por baixa audi�ncia], falaria para mandar algu�m escrever. Bateria o p�.
Autocensura
Tem um bom senso quando pensa que entra na casa de 40 milh�es de pessoas. N�o boto palavr�o, personagem fumando cigarrinho, tomando uisquinho de dia. V�o reclamar. Poderia subverter isso, mas a� tem classifica��o indicativa.
Cedo em algumas coisas para ter outras maiores, como abordar temas mais complexos.
Exporta��o de folhetim
"Avenida Brasil" tem "plot" original. Uma coisa que a fic��o brasileira n�o faz bem � drama. A Am�rica Latina � o lugar do drama, � a l�grima.
Minhas novelas t�m trama central forte e pouco personagem. Quando tem uma novela com cem personagens, sem uma hist�ria forte, fora do Brasil voc� n�o tem nem leitura.
Comunidade fict�cia
Disseram que o sub�rbio [de "Avenida Brasil"] n�o existia em lugar nenhum, s� na minha cabe�a. E � verdade, � fic��o. Para o Morro da Macaca, de "A Regra do Jogo", n�o ambiciono nada muito realista nem documental. � uma favela que deu certo, com turistas, classe m�dia indo morar l�. � a alegoria de como vejo essa favela, a classe m�dia, o asfalto, os ricos do Rio.
Pen drive da Nina
Sou paleol�tico da internet. Foi um escorreg�o, tive muita vergonha [em "Av. Brasil", Nina perde as fotos impressas que usava para chantagear Carminha, sem ter c�pia num pen drive]. Fiz um curso e na novela vai ter hacker, nuvem.
Merchan social e pol�micas
Se for da trama, pode ser que eu aborde algum tema pol�mico. De fora para dentro ter que discutir determinados temas me parece program�tico, engessa a hist�ria.
Mas como quase todas as novelas j� se dedicam tanto a fazer esse tipo de pol�mica, as minhas podem se dedicar a falar de temas novos para as pessoas, din�micas, conflitos novos. Eu como espectador n�o me seduzo tanto por pol�micas program�ticas.
Como v� o Rio
Sou carioca. O Rio � um balne�rio com muita heran�a, j� foi um imp�rio, tem um passado glorioso. E onde a ideia de trabalho � muitas vezes um insulto, as pessoas v�o se virando. A rela��o pessoal � t�o importante, estar na festa � t�o importante.
E tem isso tanto na favela quanto no asfalto. O n�cleo do personagem do Marcos Caruso vai mostrar um pouco isso, ele � um bon vivant decadente.
G�nero policial
Eu amo romance policial, coleciono todas revistas de literatura policial. A� escolhi fazer um thriller desta vez. Mas em sempre humor tamb�m, drama.
A novela � uma composi��o variada, � como uma refei��o para a fam�lia. Tem que ter arroz, feij�o, carne, uma farofa, uma salada. N�o posso fazer um cap�tulo inteiro de thriller.
Processo criativo
Eu tenho os movimentos dos personagens para cada uma das 28 semanas. Posso ter ideias melhores, mudar o que j� tenho. Mas eu j� tenho.
Os personagens falam na minha cabe�a, s� consigo escrever as cenas a partir dos di�logos, escrevo todos. Os colaboradores [Alessandro Marson, Antonio Prata, Claudio Sim�es, Fabio Mendes, Paula Amaral e Thereza Falc�o ] podem arredondar, colocar uma fala, dar um sabor.
� um trabalho de chin�s aposentado, uma maneira antiga de se fazer novela. N�o sei delegar muito.
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