Brasil est� em nega��o sobre debate racial, diz autora premiada da Nig�ria
Em 2003, a escritora nigeriana Chimamanda Ngozi Adichie, 37, promovia seu primeiro livro, o romance "Hibisco Roxo", em que o protagonista � um homem que espanca sua mulher.
"Est�o dizendo que seu livro � feminista", teria lhe dito um jornalista nigeriano. Ele ent�o a aconselhou a "nunca se chamar de feminista, porque elas s�o mulheres infelizes que n�o conseguem arrumar maridos".
Adichie n�o s� n�o seguiu o conselho do homem, como tamb�m relatou o ocorrido em 2013 em um discurso intitulado "Sejamos Todos Feministas", publicado agora pela Companhia das Letras.
Dos Estados Unidos, onde passa parte de seu tempo –ela mora em Lagos (Nig�ria), a autora de "Americanah", romance ganhador do National Book Critics Circle Award, falou com a Folha sobre racismo, as elei��es presidenciais em seu pa�s e a ascens�o do grupo fundamentalista isl�mico Boko Haram, respons�vel por sequestros, estupros e assassinatos na Nig�ria.
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Folha - Por que voc� decidiu discursar sobre feminismo?
Chimamanda Ngozi Adichie - Porque sempre foi importante para mim e acho que � algo sobre o qual as pessoas deveriam falar.
Boa parte do mundo ocidental acha que est� tudo bem, que se as mulheres podem votar, ent�o est� tudo bem, mas eu acredito que g�nero seja um problema no mundo inteiro e que n�s dever�amos discuti-lo mais.
Que papel os homens podem exercer no feminismo?
A primeira coisa � reconhecer que h� um problema. Eles n�o deveriam achar que merecem parab�ns quando fazem atividades que s�o consideradas femininas, como ser celebrados s� porque sabem trocar a fralda do seu filho. Isso n�o � ser feminista.
H� um movimento feminista na Nig�ria?
Acredito que sempre houve um, mas n�o tinha esse nome. As nigerianas s�o muito fortes, e h� uma �tica feminista muito mais forte na classe trabalhadora e sem educa��o formal do que entre as mulheres escolarizadas.
A diferen�a entre o feminismo na Nig�ria e nos EUA � que se uma americana, escolarizada e de classe m�dia, fica incomodada com algo no trabalho, o mais prov�vel � que ela fique quieta e v� chorar depois. No Ocidente, a ideia de uma mulher que fala o que pensa � assustadora.
Na Nig�ria, a mulher n�o ficaria quieta. Mas quando vai para casa, espera-se que seja submissa ao marido.
Quais as suas perspectivas sobre a elei��o na Nig�ria [adiadas por seis semanas pelo governo de Goodluck Jonathan, candidato � reelei��o, e previstas para 28/3]?
N�o estou animada com nenhum dos candidatos, mas tamb�m n�o acho que a Nig�ria v� se despeda�ar nem nada assim. Acho que havia outras pessoas que poderiam ser muito inspiradoras, mas elas n�o conseguiram chegar l�.
Por que voc� acha que o Boko Haram ficou t�o poderoso?
Eu diria que a maioria dos nigerianos est� t�o confusa quanto o resto do mundo.
Para muitos nigerianos, o Boko Haram � muito mais um problema pol�tico do que religioso. � fundamentalismo isl�mico, mas eles come�aram sendo utilizados por pol�ticos, que os financiavam para usar como for�a nas elei��es. O que aconteceu � que o Boko Haram ficou grande demais e saiu do controle, se aproximou de outros grupos fundamentalistas.
Em "Americanah", voc� diz que as pessoas s�o tratadas diferente quando s�o "visivelmente negras, n�o quando podem ser confundidas com brasileiros". Como assim?
[risos] A personagem estava tirando sarro da percep��o americana de como o brasileiro �. Nos EUA, "brasileiro" � algu�m racialmente amb�guo, que n�o � branco, mas tamb�m n�o � negro.
Eu acho que o Brasil est� em nega��o sobre a quest�o racial. Amigos brasileiros comentam que voc�s n�o falam de ra�a e isso me surpreendeu. [Quando veio ao Brasil, em 2008] n�o consegui deixar de notar como ra�a e classe est�o conectadas no Brasil. Eu ia a restaurantes bons e n�o via uma �nica pessoa negra.
H� um personagem no livro que vai ao Brasil e as pessoas o olham de forma estranha, porque ele tem a pele bem escura e est� na fila da primeira classe.
SEJAMOS TODOS FEMINISTAS
AUTORA Chimamanda Ngozi Adichie
TRADU��O Cristina Baum
EDITORA Companhia das Letras
QUANTO R$ 11,90 (64 p�gs.)
Livraria da Folha
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