Cr�tica: Edi��o mostra novas facetas de 'Dorian Gray', de Oscar Wilde
"O Retrato de Dorian Gray", livro mais conhecido do irland�s Oscar Wilde (1854-1900), parece ter voltado � moda.
N�o apenas acaba de receber uma adapta��o para TV e cinema, � maneira de um soft porn� de "Downton Abbey", como novos debates sobre o livro t�m ocorrido ap�s a edi��o de Nicholas Frankel, professor em Richmond, na Virg�nia.
Diversamente do filme, a edi��o � interessante at� para aqueles que j� conhecem o romance. Trata-se da primeira vers�o datilografada, corrigida � m�o e enviada por Wilde ao Lippincott's Monthly Magazine, da Filad�lfia, em mar�o ou abril de 1890.
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Detalhe de ilustra��o da nova edi��o de 'O Retrato de Dorian Gray' |
Frankel recuperou o datiloscrito, atualmente na Universidade da Calif�rnia, e o lan�ou, com fartas anota��es, por Harvard, em 2011. � esta a vers�o que a Editora Globo traz para o Brasil.
O datiloscrito de Wilde, com v�rios cortes do editor da Lippincott's, foi publicado no n�mero de julho de 1890 da revista. J� a edi��o do romance em livro, bastante aumentada, apenas sairia em 1891, mantendo alguns cortes e produzindo outros, que aparentemente levaram em conta a recep��o escandalizada da edi��o anterior.
Para Frankel, o grande destaque da vers�o original � que "traz [o romance] um pouco mais para fora do arm�rio". Da� a capa do livro da Globo anunciar uma "edi��o anotada e sem censura".
N�o �, entretanto, a falta de censura que mais atrai nessa vers�o, mas dois outros aspectos, talvez menos vis�veis na edi��o em livro.
quebra do andamento
O primeiro � estrutural, pois fica evidente uma quebra do andamento do romance no cap�tulo nono, de escopo bem diverso dos anteriores e ainda dos posteriores, embora, nestes, deixe marcas.
� f�cil notar a quebra: at� ent�o, os cap�tulos praticamente se resolvem num esquema teatral, no qual duas ou tr�s pessoas conversam em ambientes requintados (bibliotecas, est�dios, clubes, jardins amenos) e pronunciam o m�ximo de aforismos poss�vel, geralmente de natureza chistosa, como revers�o de lugares-comuns.
J� o nono, que apresenta os anos de lux�ria vividos por Dorian depois de seu pacto demon�aco, n�o apenas suspende os aforismos, como ganha um tom descritivo e minucioso, marcado pela leitura do "livro venenoso" que Dorian recebe de Lorde Henry, seu mentor.
� um livro de capa amarela, com t�tulo e autores fict�cios, mas que certamente emula "�s Avessas" (1884), do escritor franc�s Joris-Karl Huysmans (1848-1907).
Todo o cap�tulo, a rigor, � uma aplica��o simplificada (e muito inferior literariamente) dos espantosos experimentos sensoriais e mentais de Des Esseintes, o her�i de Huysmans, � vida de Dorian.
O segundo aspecto not�vel do datiloscrito � a oscila��o entre dois sentidos atribu�dos ao pacto: o de ser um espelho do mal cometido pelo jovem --e, portanto, uma forma de manifesta��o da consci�ncia moral--, e o de ser uma evid�ncia dos estragos da idade sobre a beleza do jovem.
O dilema � predominantemente �tico ou est�tico?
O que exatamente se condena: a ignom�nia da idade ou a do mal?
Wilde se esfor�a para encadear os dois sentidos, de modo que entregar-se ao desejo de permanecer jovem equivalha a se tornar ref�m do mal. Tal arranjo, por assim dizer, acomoda o moralismo, indicia o narcisismo e justifica o castigo do malvado.
Algum veneno, entretanto, ainda vibra no arm�rio: n�o o homoerotismo, mas a suspeita de que n�o pode haver pecado pior que o tempo que passa.
ALCIR P�CORA � professor de teoria liter�ria da Unicamp e autor de "M�quina de G�neros" (Edusp).
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