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Ibirapuera
OSCAR NIEMEYER
Na última quinta-feira, lendo este
jornal, senti que qualquer coisa
pode acontecer, quebrando o ritmo
com que o Ibirapuera vem se recuperando. E, como arquiteto daquele conjunto, vejo-me na obrigação de me manifestar. De recordar como, durante
anos, muitos anos, aquela obra ficou paralisada, com a entrada principal capenga, sem o teatro que, com a cúpula já
construída, deveria completá-la. E a
grande marquise ocupada por obras
que nela nunca poderiam ter sido permitidas. Uma exibição de desprezo pela
arquitetura, impossível de aceitar.
Os edifícios exigindo reparos, com
graves problemas de infiltração, iluminação, proteção etc., e a cúpula, destinada a exposições de arte, sendo utilizada
de maneira inadequada, desmerecendo
assim a sua arquitetura.
Durante esse longo período de incompreensível descaso, procuramos sempre
encontrar uma solução viável, que a
mediocridade ativa recusava implacável. De uns tempos para cá, a começar
com Carlos Bratke, que com o maior
empenho cuidou da recuperação dos
prédios da Bienal, um clima de entusiasmo e interesse cresceu com relação
ao Ibirapuera. E, com a presença de Ricardo Ohtake, Edemar Cid Ferreira e
Paulo Mendes da Rocha, que, competente, os assessorou, uma nova esperança surgiu para mim.
A marquise, sem as entradas existentes, assumiu sua verdadeira escala, e as
obras sob ela construídas -com uma
única exceção, que acredito provisória- foram removidas. É a coluna vertebral do conjunto, onde o povo passou
a circular protegido. Um lugar de passagem, pausa e conversa que o projeto
previa.
A cúpula que projetei 50 anos atrás foi
liberada, e Paulo Mendes da Rocha,
com seu especial talento, a atualizou,
declarando aos jornais, generoso: "É a
oca mais bonita do mundo".
De longe, eu acompanhava feliz tudo
isso, quando, como disse antes, li nos
jornais que um impasse aconteceu naquele ambiente tão promissor. E resolvi
escrever este pequeno texto, lembrando
como foi importante para o conjunto
do Ibirapuera e para a própria cidade de
São Paulo a atuação corajosa daqueles
quatro amigos a quem, como um dos
autores desse projeto, mais uma vez
abraço e agradeço.
Leio este texto, olho o desenho que
elaborei para a entrada do Ibirapuera e
sinto como seria bom realizá-lo. A cúpula e o teatro criando o espetáculo arquitetural. Duas formas brancas e puras
a lembrarem a singeleza magnífica das
velhas obras do período colonial.
Oscar Niemeyer, 92, arquiteto, é um dos criadores de Brasília; é autor do projeto do Memorial
da América Latina, em São Paulo, e de obras na
França, na Itália, na Inglaterra, nos EUA, na Venezuela e em Israel, entre outros países.
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