São Paulo, domingo, 28 de maio de 2000


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ARGENTINA EM CRISE


Pacotes fiscais, socorro do FMI, reafirmação de compromissos com a estabilidade monetária. O roteiro da operação de salvamento do peso argentino, ora em curso, tem todos os ingredientes de uma crise cambial clássica.
Até o Mercosul, um projeto ainda distante da consolidação, serviu como bóia importada para a âncora argentina. Há poucas semanas foi anunciada a intenção de promover a "convergência macroeconômica" entre Brasil e Argentina.
Ao fazer a opção por uma taxa de câmbio fixa e com plena conversibilidade entre pesos e dólares, o governo argentino abriu mão do uso de colchões amortecedores entre os mercados domésticos e o mercado financeiro internacional. Assim, quando cai a oferta de capitais para o país, pelo aumento dos juros nos EUA, ou quando aumenta a desconfiança quanto aos rumos de sua política econômica, não há saída senão aceitar a imediata contração da atividade econômica interna.
Pior. Para tentar recuperar a confiança externa, o governo argentino anuncia sucessivos pacotes de corte de gastos e aumento de impostos. Isso apenas aprofunda ainda mais as tendências recessivas e de fragilização das empresas do país.
O resultado prático é um círculo vicioso em que a recessão imposta de fora leva a mais recessão gerada pela política econômica doméstica. Os riscos de insolvência de consumidores e empresas aumentam, jogando por terra o próprio esforço de recuperação da confiança internacional.
A desvalorização do euro e a alta dos juros nos EUA contribuem para agravar o quadro, pois a Argentina, em recessão, não tem como fazer das exportações uma tábua de salvação.
Os investidores internacionais passam então a evitar o país.
O cenário político instável na América Latina cria mais dificuldades. Se as agências de risco classificam individualmente os países, há também uma percepção de riscos regionais. Como se viu em outras crises, recentes, há uma espécie de contágio. O risco latino-americano aumenta com o risco argentino, e vice-versa.
É inevitável que o Brasil sinta os efeitos dessa turbulência regional.
Se a Argentina abandonar o câmbio fixo, serão necessários no mínimo meses até que o país reconstrua sua política econômica. Se houver uma dolarização completa, o Mercosul se tornará inviável.
Nos dois casos, algum grau de contaminação afetaria a imagem do Brasil e da América Latina.
Parece portanto inevitável que aumente a incerteza, depois de quase duas décadas de modelos econômicos centrados na estabilização monetária e no aumento da dependência financeira externa.



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