|
Próximo Texto | Índice
OUTRO ESTADO
Governabilidade ou governança tornaram-se expressões
cada vez mais frequentes nos últimos anos. Não deixa de ser um paradoxo. Afinal, elas denotam problemas políticos e institucionais que,
em tese, seriam ou secundários ou
superáveis de modo natural pela globalização, pela abertura dos mercados e pela desestatização.
No entanto, o consenso em favor
da globalização perdeu vigor e consistência também porque ganhou
força a percepção de graves distorções políticas e institucionais criadas
ou acentuadas pela agenda liberal.
Talvez nunca se alcance um novo
consenso, ao menos nada comparável ao chamado "consenso de Washington" dos anos 80.
Ainda assim, é positivo que estejam
voltando a merecer atenção temas
como a reforma do Estado, a qualidade do gasto público, o viés concentrador de renda do sistema tributário, a emergência de novas organizações sociais e o desenho de políticas
públicas que criem direitos e ampliem a noção de cidadania.
Em vez de limitar-se, como ocorria
até pouco tempo, a apenas criticar e
desmontar modelos ultrapassados,
lideranças da sociedade civil, empresários, políticos e burocratas começam a dar mais atenção aos desafios
de recriar espaços públicos.
Essa é outra reforma do Estado, cujas tarefas são menos óbvias e menos
consensuais que as inauguradas pelas políticas de Reagan ou Thatcher.
Nem por isso são menos urgentes.
Da produção acadêmica dos novos
Prêmios Nobel em economia às novas preocupações que ganham espaço em organismos multilaterais, o
que se percebe é a urgência de medidas em favor da distribuição de renda, de modalidades de regulação da
atividade econômica e de estímulos à
democratização do conhecimento.
O desenvolvimento sem políticas
públicas é hoje impensável. A economia e as empresas ficam ingovernáveis, tragadas de modo brutal pela
instabilidade dos mercados financeiros que têm o foco restrito ao curtíssimo prazo. O Estado, sem uma evolução em seus modelos de gestão, fica cego, surdo e perde o sentido.
A partir de amanhã esses temas começam a ser examinados no 2� Fórum Global, em Brasília, cuja primeira edição ocorreu no ano passado,
nos EUA. É uma iniciativa que pode
colocar a questão da reforma do Estado sobre bases positivas e construtivas, em vez da ênfase nos cortes de
gastos lineares, sujeitos apenas a critérios macroeconômicos, quantitativos, definidos em pacotes de ajuste
fiscal e financeiro de curto prazo.
É promissor que o evento tenha como anfitrião o Ministério do Orçamento e Gestão, uma instância do
Executivo que poderia ter um papel
importante no desenho de políticas
de desenvolvimento no Brasil.
Mas nos últimos anos esse ministério (e outros voltados a questões estruturais e à qualidade de vida) sujeitou-se ao horizonte estreito do corte
de gastos, dos pacotes fiscais e da
privatização a qualquer custo.
A governabilidade depende da mobilização para construir uma sociedade mais justa, mais confiante em
um horizonte de longo prazo. Os esforços nessa direção ainda são insuficientes. É preciso ampliar o debate
para que as novas políticas reflitam
os interesses da sociedade e propiciem uma distribuição de renda mais
intensa e mais rápida.
É urgente que o governo recupere a
disposição para um diálogo político
que conduza a uma nova reforma do
Estado, sem a qual até a estabilidade
de preços, que foi duramente conquistada, será um fundamento insuficiente da governabilidade.
Próximo Texto: Editoriais: ARGENTINA EM CRISE
Índice
|