São Paulo, Sexta-feira, 27 de Agosto de 1999
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DEPOIS DA MARCHA

Muito barulho por nada seria uma avaliação exagerada, mas não muito, a respeito da atitude do governo sobre a manifestação de ontem em Brasília. O governo quis difundir a idéia de que a marcha-protesto da oposição seria de cunho golpista, rótulo que enfim se revelou apenas parte de hábil e bem-sucedida estratégia de levar confusão às hostes adversárias.
No entanto, a marcha não foi politicamente infértil. Em parte da coalizão fernandina, o protesto parece ter reforçado o sentimento de que é preciso demonstrar, de público ao menos, receptividade a reclamos da população, organizada ou não. Isto é, passar a imagem de certo descolamento da ortodoxia econômica governista, ou pressionar o presidente para que saque do fundo dos magros cofres públicos ou da também magra imaginação planaltina paliativo social de algum impacto.
Tal movimentação na base do presidente não é decerto nova e chegou mesmo a ser caótica nas últimas semanas, o que provocou sismos no mercado. Mas a perspectiva tanto da eleição municipal de 2000 como de mais manifestações de massa até o fim do ano deve criar, dentro da coalizão governista, demanda maior de sensibilidade social. Trata-se de equação difícil de resolver, pois é ainda lenta a recuperação da economia e a convalescença financeira do Estado depende de rigorosa dieta ortodoxa.
A oposição, combalida e desbaratada nos primeiros anos de governo Fernando Henrique Cardoso, ora parece crer que ganhou fôlego para proceder a protestos mensais, a começar pelo "dia dos excluídos", manifestação que se arma para o 7 de setembro, o que talvez venha a ser reforçado por uma greve nacional a seguir.
Há o risco de que o descompasso entre tal demanda social, no governismo e fora dele, e a impossibilidade de ofertar bastantes lenitivos possa ter como saldo mais conturbação política, sempre uma ameaça capaz de solapar a recuperação econômica. Além do equilíbrio fiscal, o governo terá de demonstrar habilidade e criatividade para ao menos minorar seu déficit de popularidade.


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