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São Paulo, sexta-feira, 26 de setembro de 2003

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ERROS E ACERTOS

As projeções sobre o crescimento do Produto Interno Bruto brasileiro neste ano convergem para um resultado pífio, situado entre 0,5%, segundo o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), e 0,98%, pelas contas do governo. Se confirmada, como tudo indica, essa diminuta expansão acarretará uma redução do PIB per capita do país, fato que aconteceu duas vezes nos últimos dez anos -em 1998 e 1999.
Obviamente, ao optar por um ajuste econômico de perfil ortodoxo, a nova equipe sabia que o crescimento em 2003 estaria, no mínimo, comprometido. O governo aparentemente decidiu fazer o "mal" de uma só vez: promoveu uma política de juros altos para "matar e esquartejar" a inflação e elevou voluntariamente a meta de superávit das contas públicas -ao mesmo tempo em que procurava reforçar a confiança dos mercados colocando as reformas no topo da agenda política do Congresso.
Ninguém informado a respeito das implicações dessa política acreditaria em anúncios de um "espetáculo do crescimento" em 2003. Como admitiu anteontem o ministro Palocci, da Fazenda, "em ano de combate ao desajuste não se cresce".
Hoje o governo pode argumentar -como de fato o faz- que, embora as medidas adotadas tenham deixado um rastro de mazelas, como a recessão industrial, a queda da renda e o aumento do desemprego, também conquistaram os troféus esperados: a inflação encontra-se sob controle, o risco-país despencou e a cotação do dólar cedeu fortemente. Tratar-se-ia, portanto, agora, de olhar para a frente, como sugere o ministro Palocci, que se declara "otimista" sobre as perspectivas de crescimento.
O ministro talvez se engane, no entanto, ao afirmar que "o que o Brasil tem de bom na área econômica é que tudo que poderia ser feito de errado já foi feito". Deduz-se da frase que a nova equipe considera sua atuação a prova de erros. No entanto não são poucos os que estimam que a Fazenda e o Banco Central têm cometido equívocos -alguns velhos e graves- na condução da política econômica. De fato, não parece recomendável que o ministro deixe-se ofuscar pelo "êxito" até aqui obtido. Não há nada de espetacular em acalmar mercados com reformas, conter a inflação com recessão e juros estratosféricos ou aproveitar-se da entrada de capitais de curto prazo para obter quedas inesperadas na taxa de câmbio. Ao contrário, nada disso foge às prescrições do problemático cânone econômico oficial.
O que esse receituário ainda não conseguiu produzir -e aí reside o verdadeiro desafio- são condições reais de crescimento sustentável. A economia continua pressionada pelo elevado endividamento do setor público, e são duvidosas as perspectivas de aumento da taxa de investimento. Também a vulnerabilidade externa permanece: as reservas do Banco Central precisam ser recompostas, os saldos comerciais tendem a cair e não estão afastados os riscos de novas crises cambiais.
Caso essas questões não sejam enfrentadas com políticas ativas, continuarão vivas as chances de o país repetir no futuro a conhecida dinâmica do "stop and go", demonstrando que, infelizmente, sempre se pode errar um pouco mais.


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