São Paulo, Domingo, 21 de Novembro de 1999
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Barriga cheia

CARLOS HEITOR CONY
Rio de Janeiro - Uma das manias do presidente da República é reclamar da mídia, das entidades que representam classes e, sobretudo, do Congresso Nacional. Ele se comporta como um prisioneiro, manietado pelas forças políticas.
Daí que suas declarações são como se ele nada tivesse com o poder, fosse apenas um cidadão irritado com as coisas erradas de nossa vida pública.
Na verdade, nunca tivemos, em regime democrático, um presidente tão centralizador como ele. E com poderes que outros não tiveram -afora aqueles outros poderes que exerce por meio de sua decantada ""persuasão", como aquela em que persuadiu congressistas a aumentar o seu mandato. FHC é recordista em assinar medidas provisórias.
Os números oficiais foram recentemente divulgados. Das 4.026 MPs assinadas pelos últimos presidentes, 3.223 levaram seu jamegão. Não cola o argumento de que ele governou mais tempo do que Collor e Itamar. Governou menos do que Sarney, pelo menos até agora.
Podemos dar de barato que metade ou pouco mais dessas medidas tenham sido de rotina, prorrogando prazos ou regras provisórias para tocar o expediente miúdo do governo. Mas o conjunto revela que o presidente da República, mesmo em regime democrático, tem um poder que se equipara aos ditadores useiros e vezeiros em baixar decretos-lei.
A questão é saber usar essa regalia com moderação, em momentos de extrema necessidade administrativa. Não é esse o caso de FHC. Por temperamento, por alucinado gosto pelo poder, ele se desaperta além da conta e da conveniência.
Não aprecio estatísticas nem sou bom nelas. Mas as 3.223 MPs que ele assinou nos quatro anos e 11 meses de seu mandato equivalem a duas por dia -contando sábados, domingos e dias santificados.


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