São Paulo, Domingo, 21 de Novembro de 1999
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

O Estado apodreceu

CLÓVIS ROSSI

São Paulo - É de perder o fôlego a sucessão de escândalos de diferentes naipes que ocupam as páginas dos jornais, uma após a outra, como se o noticiário policial, de repente, tivesse suplantado todos os demais.
Fica a nítida sensação de que o Estado brasileiro, do poder central ao municipal, apodreceu de vez. Aliás, o simples fato de que uma CPI que começou de modo obscuro tenha sido capaz de expor tamanhas mazelas é uma prova da falência do Estado: todos os crimes estavam lá. Era apenas uma questão de investigá-los e puni-los.
Os chamados canais competentes (as polícias e o sistema judicial) não o fizeram em momento nenhum, como já assinalou com a competência de sempre a Eliane Cantanhêde.
É bom, de todo modo, pôr a coisa em perspectiva, antes que alguém comece a achar que foi a democracia que causou os estragos agora visíveis. Foi exatamente o contrário: a partir do momento em que agentes da repressão tiveram luz verde para torturar, matar e mesmo roubar, à margem até das leis draconianas do período militar, instala-se a anarquia. É fácil para um policial confundir a licença para torturar um "subversivo", sabidamente um crime, com a licença para aderir ao crime organizado, outra ilegalidade, embora diferente.
Culpas à parte, o equívoco que o presidente Fernando Henrique Cardoso e alguns governadores eleitos em 1994 cometeram foi confundir a necessária reforma do Estado com a mera contenção do déficit público. Era -e ainda é- necessário de fato conter o déficit, mas com uma finalidade: devolver ao Estado a capacidade de fornecer segurança, educação, saúde etc.
O que se fez foi apenas punir o funcionalismo público, na ativa ou aposentado, sem tocar, em momento nenhum, na estrutura apodrecida do Estado brasileiro.
As consequências estão à vista de todos. Invertê-las é a tarefa principal de qualquer presidente que se eleja em 2002. Se for possível.



Texto Anterior: Editorial: NEM TUDO PIORA
Próximo Texto: Brasília - Eliane Ctanhêde: A sangue-frio
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Agência Folha.