São Paulo, domingo, 20 de maio de 2001

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ANTÔNIO ERMÍRIO DE MORAES

O resultado de um fracasso

O tempo de acertar passou. O tempo de alertar se foi. O tempo de lamentar acabou. Chegou a hora de cuidar das feridas. O problema está colocado. O Brasil não tem energia para permitir que seu povo cresça.
A leviandade da inércia passada nos faz comparecer perante o mundo como um país rico gerenciado por gente que submete seu povo à pobreza crônica. Um vexame!
Para os espertos e demagogos, esta é a hora de explorar o infortúnio e de abrir suas caixas de ilusões. Para os patriotas, que produzem e trabalham, é hora de buscar a solução. A nação está sendo chamada a mais um sacrifício.
É impossível distribuir migalhas sem dor. A fórmula definida pelo governo está dentro dessa regra. Só que, neste caso, todos gritam e todos têm razão, pois a catástrofe poderia ter sido evitada.
O plano é duro. Serão punidas as famílias e as empresas que mais gastam eletricidade. Para os domicílios modestos, há a alternativa de manter-se dentro dos 100 kWh mensais e até de ganhar um bônus. Os de maior porte nada sofrerão se cumprirem as metas estabelecidas, mas pagarão pesadas sobretaxas se as ultrapassarem, cortando-se, assim, o poder de compra da classe média. Aos ricos, é uma oportunidade histórica para trocar excedentes por solidariedade.
Para as empresas, o mecanismo é diferente. As que cumprirem as metas terão aumento de custo proporcional ao corte de energia. As que superarem as metas pagarão o excedente a preços do Mercado Atacadista de Energia -o MAE-, que são exorbitantes, cerca de 500% do preço normal.
Ou seja, a Câmara de Gestão da Crise de Energia Elétrica transformou o MAE numa câmara mortuária. Pouquíssimas empresas terão condições de pagar energia a tal preço.
Há exceções, é claro. Algumas empresas poderão interessar-se por vender energia ao preço do MAE, deixando de lado a sua vocação original de produzir e de gerar empregos. O que, para a maioria, será um castigo, para elas, poderá tornar-se um atraente cassino de especulação. Mas, como em todo cassino, alguns ficarão com o mico. Azar deles!
No curto prazo, a situação do setor empresarial está definida. Para obedecer às metas (ou especular com energia), as empresas terão de cortar parte da produção, com a conhecida perversidade sobre o emprego, a inflação, as exportações, a balança de pagamentos, as dívidas públicas e as taxas de juros.
No médio prazo, algumas conseguirão readaptar seus equipamentos de forma a utilizar outras fontes de energia. Mas isso, além de ser demorado e caro, nem sempre é viável, em especial quando se combina redução de produção com redução de vendas.
Como julgar o plano? Ruim, muito ruim. Qual seria melhor? Nenhum. A energia mais cara é a que não existe. O Brasil terá de pôr um pé no freio. Entramos num tempo de enorme sacrifício e de etapas dolorosas. O importante é vencer cada uma delas para, no fim, espantar de vez o funesto fantasma da irresponsabilidade, esperando que nunca mais apareça.


Antônio Ermírio de Moraes escreve aos domingos nesta coluna.



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