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CARLOS HEITOR CONY
Condenados à modernidade
RIO DE JANEIRO - Louvo o pessoal que, no afã de defender o governo e
de considerá-lo o máximo em talento
e formosura, começa a descobrir que
o apagão será mais um benefício que
o despreparo de FHC trará para a sociedade.
A turma se esbofa para provar que
velas e lampiões serão um benefício
para todos. Teremos tempo para pensar em nós mesmos, sem a poluição
provocada pelos ruídos e imagens
que a eletricidade nos traz.
Voltaremos a usar camisolões e
gorros, que nem nos filmes do Gordo
e o Magro. Levaremos o castiçal para
a mesinha de cabeceira e, como poderá faltar água, que é bombeada pela
eletricidade, teremos também penicos sob a cama.
Lágrimas enchem-me os olhos. A
perspectiva bucólica das velas, dos
castiçais e dos penicos me comove.
Voltaremos àquilo que os americanos chamam de ""bons tempos". É a
modernidade que FHC trouxe ao
Brasil.
Vi um técnico no assunto dizer que
entre as causas da atual crise de energia está a leviandade com que abrimos a geladeira. Sinceramente, nunca prestei atenção a esse crime que
cometo todos os dias, abrindo a geladeira não sei quantas vezes.
Como muitos outros, surpreendi o
presidente da República, que foi obrigado a admitir, diante da nação, que
não sabia da leviandade que todos
cometemos ao abrir a geladeira.
Olhando o lado bom do apagão, teremos mais tempos para a interiorização. Estaremos mais concentrados.
Seremos românticos jantando à luz
de velas.
Para incrementar esse clima, aposentaremos nossos equipamentos de
som e voltaremos aos gramofones,
que não precisam de eletricidade. A
banda da Casa Édison, Caruso, o
Bando dos Tangarás entrarão nas
paradas.
Só falta agora o ministro da Saúde
trazer de volta as ventosas e as sanguessugas usadas para prevenir insultos cerebrais.
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