São Paulo, sábado, 12 de fevereiro de 2000


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A integração total dos perueiros ao transporte público oficial é viável?

NÃO
Nem uma perua a mais

GETÚLIO HANASHIRO

Os perueiros chamaram a atenção da população para o problema do transporte de passageiros na cidade de São Paulo. Muito se fala sobre o assunto, mas poucos são os que conseguem tratar a questão sem passionalismo. A solução ideal é a implantação de novas linhas de metrô. Mas não há recursos disponíveis para, no curto prazo, implantar linhas suficientes. Um quilômetro de metrô custa US$ 100 milhões.
Em dez anos a frota de São Paulo dobrou. Hoje são 5 milhões de veículos. Um carro para cada dois habitantes. O trânsito tornou-se mais difícil. A média de velocidade dos ônibus hoje é de apenas 14 km/h. Há dez anos era de 25 km/h. Depois de quase dois anos de muita negociação, o prefeito Celso Pitta conseguiu com o BNDES US$ 750 milhões para investimento nos corredores de ônibus e nos Veículos Leves sobre Pneus, VLP (fura-fila). Há muito os projetos técnicos estavam aprovados, mas o governo federal não liberou os recursos. Essa demora foi fatal para a cidade e contribuiu para o aumento do número de peruas.
O surgimento das peruas e sua popularidade estão associados ao tempo que os usuários de ônibus gastam para chegar ao centro da cidade. As peruas clandestinas, por exemplo, não têm compromisso com horários, itinerários e nem mesmo com a segurança dos passageiros. Por isso oferecem viagens mais rápidas. Pelos dados da Associação Nacional de Transportes Públicos, 76% das pessoas escolhem as peruas para ganhar tempo.
A Secretaria Municipal dos Transportes legalizou, em novembro de 1997, antes de eu assumir o cargo, portanto, 2.700 peruas, por uma lei que foi considerada posteriormente inconstitucional. As peruas foram legalizadas por pressão dos perueiros, da opinião pública e da própria imprensa. A justificativa era o desemprego.
A comunidade técnica é contra esse tipo de transporte. Muitos dos veículos utilizados não são adequados, e a proliferação das peruas pode destruir o sistema formal de transporte. Mesmo assim, a Secretaria Municipal dos Transportes, depois de um estudo detalhado, elaborou um projeto para a legalização de 4.042 peruas, que já está na fase de licitação. Esse não é um número cabalístico. É o que o sistema suporta.
A lógica do sistema é transportar a maior quantidade de passageiros no menor espaço de tempo. É por isso que se fala em rede estrutural de alta capacidade (metrô e ferrovia) e rede estrutural de média capacidade (corredores de ônibus, fura-fila etc.). O metrô, por exemplo, transporta 100 mil passageiros por hora. Para apresentar o mesmo desempenho, só no trecho que hoje é coberto pelo metrô, precisaríamos de pelo menos 10 mil peruas.
O projeto da SMT determina que as peruas vão complementar o sistema, se encarregando da ligação entre os bairros mais afastados e as linhas de ônibus que vão até o centro da cidade. No entanto, não vamos admitir uma perua a mais. Entendemos a legalização dessas 4.042 peruas como uma concessão, em razão de uma situação excepcional.
O acidente que causou a morte de quatro pessoas e deixou nove feridos, os 14 ônibus incendiados, os motoristas sem habilitação, as armas apreendidas, as agressões aos fiscais e principalmente a falta de segurança da maioria dos veículos já provaram que as peruas, do jeito como estão atuando, são uma ameaça e de forma nenhuma resolvem os problemas dos passageiros e da cidade.
Com os incidentes das últimas semanas, as peruas clandestinas deixaram de ser uma questão de transporte para se transformar num caso de polícia. Isso a população, que em princípio tinha simpatia pelos perueiros, já percebeu. As últimas pesquisas de opinião sobre os perueiros mostraram que a população repele o desrespeito às leis e a violência.


Getúlio Hanashiro, 56, sociólogo, é secretário Municipal dos Transportes de São Paulo. Ocupou o mesmo cargo em 1993-94 (administração Maluf) e em 1983-85 (administração Covas). Foi secretário de Estado dos Negócios Metropolitanos (governo Quércia).



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