São Paulo, sexta-feira, 10 de setembro de 2004 |
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TENDÊNCIAS/DEBATES Os números da mediocridade
JORGE BORNHAUSEN
Os números apregoados da economia brasileira -observem que todos são tomados aleatoriamente, sem guardar relação entre si e, principalmente, sem comparação com séries históricas- estão sendo montados cavilosamente para dar a impressão de que resultam de genial ação de governo e que o Brasil finalmente alçou vôo para seu futuro prodigioso. Observando atentamente -basta ler os colunistas econômicos e as análises dos nossos principais consultores-, vê-se que a coisa não é bem assim. Pelo contrário. Primeiro, os números que o governo apresenta não são relevantes. Diz ele que as projeções apontam para um crescimento de 3,5% da economia brasileira. No entanto as previsões de outros países emergentes (China, Rússia, Índia e até a Venezuela, do tão querido coronel Chávez, estadista modelo para o Palácio do Planalto) são de 8%, 9%, ou até 10% e mais. Aliás, a média mundial de crescimento prevista é de 4,7%. Qual a razão para o governo do PT celebrar futuros 3,5% como grande feito, sem lembrar que em 2003 tivemos um crescimento negativo de 0,2%? Sem dizer que há um surto mundial de crescimento, celebrar um número nacional abaixo da média mundial é uma enganação insuportável, prova inaceitável de cinismo. Os números da economia brasileira são medíocres, revelam má gerência, imprevisão, irracionalidade -onde já se viu absurdo maior do que a CSLL (Contribuição Social sobre Lucro Líquido) ter aumento de 143%?- e temeridade, caso de os juros estarem em 16%, com ameaça de voltarem a subir, se o Copom aplicar sua própria lógica de que esse é o único remédio para inflação em alta. Números verdadeiros tornam-se fraudes quando usados da maneira que o governo Lula os está divulgando e representam uma mentira que precisa ser desmascarada. É equívoco pensar que a realidade atrai pessimismo ou condena ao desespero. Frustração é o que vai acontecer -e na verdade acontece ciclicamente neste país- quando essa euforia artificial for desmascarada e se demonstrar que tudo isso teve objetivos eleitorais. O governo está desesperado e o presidente caminha temerariamente no fio da navalha do capítulo das suas obrigações constitucionais ao apregoar esses números incompletos (e portanto falsos, pois a meia verdade é uma mentira). Já contrariou, por exemplo, o artigo 73, inciso VI, da Lei Eleitoral, que exige "motivo relevante ou de urgência" para justificar a convocação de rede de rádio e TV em período eleitoral. Lula foi ao rádio e à TV apenas para apregoar esses números incompletos, disfarçando a mediocridade que os reveste. O presidente falou do crescimento de empregos, sem lembrar que não compensa o milhão de vagas canceladas durante a recessão ocorrida já sob seu governo, em 2003. Cenários falsos em tempo eleitoral constituem ato de lesa-democracia e um truque que só marqueteiros irresponsáveis e gananciosos aceitam explorar, pois contrariam os próprios princípios de auto-regulamentação da propaganda comercial. Jorge Konder Bornhausen, 66, é senador pelo PFL-SC e presidente nacional do partido. Foi governador de Santa Catarina (1979-82) e ministro da Educação (governo Sarney) e da Secretaria de Governo da Presidência da República (governo Collor). Texto Anterior: Frases Próximo Texto: Fernando de Barros e Silva: Odorico, o fiscal de Lula Índice |
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