São Paulo, segunda-feira, 08 de janeiro de 2001

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

VINICIUS TORRES FREIRE
Apartheid paulistano

SÃO PAULO - "Fuga do aluguel dissemina favelas em SP" dizia ontem nesta Folha reportagem de Gabriela Athias. Mas, para quase todo paulista "bem", favelas parecem inexistir.
Se um estrangeiro civilizado caísse de pára-quedas nos bairros melhores de São Paulo saberia logo que fora parar numa cidade de Terceiro Mundo, "emergente", subdesenvolvida, sei lá.
Não que o visitante logo visse miséria. Notaria de pronto o mau gosto dos prédios, os "sinais ostensivos de riqueza" burra, a indiferença à poluição visual.
Os pedintes nos sinais? Até que diminuíram, espantados pelos carros de polícia nos cruzamentos das avenidas mais ricas da cidade. Trata-se de um efeito colateral de uma tentativa de diminuir os assaltos, providência que só demorou devido à falta de senso de marketing de Covas. Não interessa que a violência seja uma praga na cidade toda, importa é que os mais ricos, que fazem mais barulho, reclamem menos.
É possível passear durante horas com nosso visitante sem que ele veja favela. Parte do sucesso dos prefeitos reacionários se deve ao fato de que eles cumprem o desejo secreto de parcela razoável do eleitorado: expulsar os favelados.
Favela quase deixou de ser tema de conversa na "boa" São Paulo. Ressurgiu devido à mais recente, e talvez última, frente de expansão imobiliária da classe média para terra virgem, o Panamby e pontas do Morumbi, que chegou perto de alguns bantustões, ora em devida remoção.
Favela não dá muito voto. Covas, quando prefeito em 1983-85, investiu em posto de saúde e melhorias na periferia. Não fez sucesso -"ninguém" conhece miserável e o dinheiro era ínfimo perto das necessidades. Mesmo prefeituras democráticas, como as do PT em Porto Alegre, em 11 anos tiraram menos de 50 mil pessoas dos barracos.
Favela é uma peste que leva décadas para curar, uma peste do desenvolvimento cruel e desigual do Brasil, que só se ameniza com muito governo democrático e muita distribuição de renda, remédios ainda em falta.


Texto Anterior: Editorial: SUCATA PAULISTANA
Próximo Texto: Brasília - Fernando Rodrigues: Os riscos para FHC
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.