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VINICIUS TORRES FREIRE
Apartheid paulistano
SÃO PAULO - "Fuga do aluguel dissemina favelas em SP" dizia ontem
nesta Folha reportagem de Gabriela
Athias. Mas, para quase todo paulista "bem", favelas parecem inexistir.
Se um estrangeiro civilizado caísse
de pára-quedas nos bairros melhores
de São Paulo saberia logo que fora
parar numa cidade de Terceiro Mundo, "emergente", subdesenvolvida,
sei lá.
Não que o visitante logo visse miséria. Notaria de pronto o mau gosto
dos prédios, os "sinais ostensivos de
riqueza" burra, a indiferença à poluição visual.
Os pedintes nos sinais? Até que diminuíram, espantados pelos carros
de polícia nos cruzamentos das avenidas mais ricas da cidade. Trata-se
de um efeito colateral de uma tentativa de diminuir os assaltos, providência que só demorou devido à falta
de senso de marketing de Covas. Não
interessa que a violência seja uma
praga na cidade toda, importa é que
os mais ricos, que fazem mais barulho, reclamem menos.
É possível passear durante horas
com nosso visitante sem que ele veja
favela. Parte do sucesso dos prefeitos
reacionários se deve ao fato de que
eles cumprem o desejo secreto de parcela razoável do eleitorado: expulsar
os favelados.
Favela quase deixou de ser tema de
conversa na "boa" São Paulo. Ressurgiu devido à mais recente, e talvez última, frente de expansão imobiliária
da classe média para terra virgem, o
Panamby e pontas do Morumbi, que
chegou perto de alguns bantustões,
ora em devida remoção.
Favela não dá muito voto. Covas,
quando prefeito em 1983-85, investiu
em posto de saúde e melhorias na periferia. Não fez sucesso -"ninguém"
conhece miserável e o dinheiro era
ínfimo perto das necessidades. Mesmo prefeituras democráticas, como
as do PT em Porto Alegre, em 11 anos
tiraram menos de 50 mil pessoas dos
barracos.
Favela é uma peste que leva décadas para curar, uma peste do desenvolvimento cruel e desigual do Brasil,
que só se ameniza com muito governo democrático e muita distribuição
de renda, remédios ainda em falta.
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