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MÍDIA
Crítico do trabalho da repórter Judith Miller, Daniel Okrent diz que ela "é um problema que o jornal terá de resolver"
"Times" é arrogante, diz ex-ombudsman
SÉRGIO DÁVILA
DA REPORTAGEM LOCAL
Os vários problemas pelos quais
o mais influente jornal do mundo
vem passando têm uma só raiz:
arrogância. A opinião é do primeiro ombudsman a ocupar o
cargo no "New York Times", lá
chamado de "editor público",
função criada na esteira dos escândalos que começaram a chacoalhar o diário em 2003.
Daniel Okrent, 57, não era funcionário do "Times" quando assumiu a função, com um mandato pré-combinado de 18 meses, do
qual se despediu em maio último.
Autor de vários livros, um dos
quais lhe valeu uma indicação ao
importante prêmio Pulitzer, fez
sua carreira jornalística mais em
revistas como a "Time" e a extinta
"Life". Sua última obra foi "Great
Fortune: The Epic of Rockefeller
Center" ("a grande fortuna: o épico do Rockefeller Center"), publicado pela editora Viking Penguin,
em 2003.
Ele conversou com a Folha sobre a repórter Judith Miller, que
passou de vilã a mártir e a vilã de
novo em menos de um ano (leia
texto nesta página).
Falou por telefone de Manhattan, onde faz pesquisa para um livro sobre a Lei Seca, a sair em
2008, prepara a coletânea de seus
artigos como ombudsman e treina palestras que dá pelo país cujo
tema é: "Como sobrevivi às entranhas do "Times'".
Folha - A repórter Judith Miller foi
assunto principal de três colunas
suas durante seu mandato como
ombudsman. O sr. já tinha a sensação de que ela poderia vir a ser um
problema para o jornal?
Daniel Okrent - Ela já era um
problema! Antes mesmo de eu assumir. Aliás, continuo achando
que a repórter é um problema que
o jornal terá de resolver...
Folha - Em um desses artigos,
chamados "Armas de Decepção em
Massa", o sr. foi extremamente rigoroso com ela. Que resposta ou
reação teve da repórter então?
Okrent - Ela foi cordial comigo,
apesar de tudo. Não houve sinal
de hostilidade. Eu a entrevistei
por duas horas, então qualquer
admissão de culpa estaria transcrita no meu texto. Ou seja, não
houve mea culpa, não.
Folha - Ela mentia, o sr. acha?
Okrent - Creio que ela tenha sido
sincera e franca comigo, não achei
que tentou me enganar em nenhum momento. O que penso hoje é que ela tentava se enganar a si
mesma.
Folha - Em sua última coluna, o sr.
escreveu que a perspectiva de Judith Miller ir para a cadeia era
"nauseante". O sr. ainda pensa da
mesma maneira, hoje em dia?
Okrent - Sim. Isso não quer dizer
que eu aprove o jeito de ela ser como repórter. Mas a noção de jornalistas indo para a cadeia é nauseante para mim, qualquer um.
Folha - O atual ombudsman,
Byron Calame, ex-"Wall Street
Journal", vem ignorando a polêmica em relação a Judith Miller desde
que ela saiu da cadeia. Se estivesse
ainda em seu cargo, faria o mesmo? Aliás, o sr. sente falta de lá?
Okrent - Começando pelo fim,
não. Estou satisfeito (risos). Estava combinado desde o começo
que seriam apenas dezoito meses,
que, passado esse tempo, eu continuaria com minha vida. Quanto
à primeira parte da pergunta, sim,
é um assunto muito interessante.
Mas outros assuntos me interessam além do "New York Times"...
Folha - Qual sua opinião pessoal
sobre Judith Miller?
Okrent - Prefiro não comentar
nada, sofreria muita pressão.
Folha - Em sua visão, qual é o
principal problema do "New York
Times" de hoje e de então?
Okrent - É difícil resumir numa
frase, havia então uma gama de
problemas com o jornal naqueles
dias. Alguns deles surgiram por
razões as mais variadas. Mas diria
que o principal problema do "Times" é a arrogância, aquela crença de que o jornal está acima de
qualquer crítica. E não reagir às
críticas, internas ou externas.
Folha - E esses problemas diminuíram desde a sua saída?
Okrent - (Risos) Bem, acho que a
própria criação do cargo de ombudsman ajudou muito.
Folha - Há rumores de que os
acionistas da empresa estão pedindo a cabeça de Arthur Sulzberger
Jr., CEO da The New York Times
Company, por conta dos seguidos
problemas na Redação, agravados
pela diminuição na venda e na publicidade do jornal e na queda dos
lucros da empresa. Isso é plausível?
Okrent - Bem, primeiro temos
de nos lembrar que os únicos
acionistas que têm poder de mando na sociedade são os membros
da família Sulzberger, cerca de 30
parentes. Eles controlam a votação dos acionistas. E, se você não
falou com alguém que esteja na
sala na hora da discussão desse
grupo, não dá para confiar muito
nos rumores. Mas talvez eles tenham pedido a cabeça mesmo,
talvez eles estejam realmente descontentes.
Mas o importante é lembrar
que, mesmo acontecendo em
uma empresa de capital aberto, as
decisões dentro do "New York Times" são familiares, não de acionistas.
Folha - O sr. tem dado palestras
sobre seu período no "Times" pelo
país. Qual a pergunta mais recorrente dos espectadores?
Okrent - "Conte-me tudo sobre a
Judith Miller".
Folha - E qual a sua resposta?
Okrent - (Risos) É uma resposta
longa e complicada... Eu prefiro
não dizer.
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