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MULTIMÍDIA
"Xuxa colombiana" foge para Miami
ARMANDO ANTENORE
EM BOGOTÁ
Brasileiros, se a vêem de perto,
dificilmente resistem à provocação: "Você é a Xuxa colombiana,
não é?".
Ela sorri e, meio sem jeito, balança a cabeça -não, claro que
não. Loira de olhos verdes, o corpo magro, mas bem definido,
Claudia Gurisatti sabe que guarda
semelhanças físicas com a apresentadora gaúcha. "Um dia, ainda
vou comandar programas infantis. Está em meus planos. Juro."
Por ora, no entanto, "la Guri"
-como costumam chamá-la- é
uma das jornalistas de TV mais
populares da Colômbia e talvez a
mais controvertida. Tem 27 anos
e já divide com os veteranos Darío
Arizmendi e Yamid Amat a prerrogativa de influenciar decisivamente a opinião pública do país.
Uma influência que a empurrou
para o exílio. Desde o final de janeiro, Claudia mora em Miami.
Precisou deixar Bogotá às pressas,
sob ameaças de morte.
Dos Estados Unidos, segue dirigindo e apresentando o programa
"La Noche", de entrevistas. A
RCN -rede que disputa a preferência dos colombianos com a
Caracol- o exibe de segunda a
quinta, das 22h30 às 23h.
A emissora montou em Miami
um estúdio idêntico àquele que a
jornalista ocupava na Colômbia.
Pôde, assim, preservar a rotina do
"La Noche". Os entrevistados
continuam comparecendo à sede
da RCN, em Bogotá, só que agora
Claudia os interpela via satélite.
O sucesso do programa permanece intocado. São 3 milhões de
espectadores por noite -ou 7,5%
da população nacional. Quando
tomou conhecimento de que "la
Guri" se exilara, parte da audiência reagiu com paixão. Numa única semana, a jornalista recebeu 10
mil e-mails de solidariedade.
O conturbadíssimo quadro político-social da Colômbia não permite definir de onde saíram as
ameaças contra Claudia. O conflito armado, que desde 1964 sacode
o país e que provocou 35 mil mortes na última década, contabiliza
hoje cinco protagonistas: duas
guerrilhas de esquerda (as Farc e
o ELN), um grupo paramilitar de
extrema direita, o Exército regular
e os chefões do narcotráfico.
Vários desses personagens já
participaram do "La Noche". A
principal marca do programa é
discutir o tema mais quente do
dia -o que, não raro, significa
abraçar um barril de pólvora.
No ano passado, por exemplo,
enquanto entrevistava o guerrilheiro Raúl Reyes, das Farc, Claudia o colocou em contato com as
mães de duas crianças sequestradas pelos rebeldes. O debate não
agradou à guerrilha.
Em outra ocasião, a jornalista
abriu espaço para Carlos Castaño,
chefe dos paramilitares, que se
encontrava nas montanhas do
norte colombiano, de onde controla cerca de 8.000 homens. Intelectuais consideraram a entrevista
amena e acusaram "la Guri" de fazer o jogo da direita.
Há, ainda, quem julgue que
Claudia cultiva excessiva proximidade com a equipe do presidente Andrés Pastrana, amigo do
dono da RCN. O governo, aliás,
sustenta que o plano para matar a
jornalista partiu das Farc. Baseia a
afirmação no depoimento de um
guerrilheiro de 18 anos, o Pantera,
acusado de assassinar o deputado
Andrés Páez. Preso pelo crime em
27 de janeiro, o jovem teria revelado que também recebera a incumbência de eliminar Claudia.
Por causa de tal testemunho, o
próprio governo a aconselhou a
abandonar o país. A cúpula das
Farc, porém, insiste que a organização não planejou a emboscada.
"Sinto-me perdida. Respeito a
versão oficial, mas ninguém me
garante que não haja outras coisas por baixo da mesa", disse
Claudia à Folha no dia 2 de maio.
Ela estava secretamente em Bogotá -o primeiro regresso após
três meses de afastamento. Veio
para tratar de assuntos pessoais e
logo voltou a Miami, aumentando a fila dos 14 jornalistas que
desde 1999 fugiram da Colômbia.
Nos últimos 20 anos, mais de cem
profissionais do país morreram
em atentados, de acordo com a
ONG Repórteres sem Fronteiras.
Enfática, "la Guri" rejeita as insinuações de que corteja os paramilitares. "Absurdo. Não me ponho nem de um lado nem do outro. Como posso tomar partido
em uma guerra tão sangrenta?"
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