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SOB NOVA DIREÇÃO / ECOS DO PASSADO
Inspirado por Lincoln, Obama tem desafio como o de Roosevelt
Democrata se guia por responsável por abolição, mas encara crise econômica comparada à Grande Depressão dos anos 30
Analistas comparam novo presidente ainda a John Kennedy, por juventude e oratória, e Ronald Reagan, por representar mudança
ANDREA MURTA
ENVIADA ESPECIAL A WASHINGTON
Barack Obama, o primeiro
presidente negro dos EUA, chega ao poder hoje celebrado por
feitos inéditos, mas também
sobre as pegadas de alguns de
seus mais memoráveis antecessores. Com a história em seu
encalço, é inspirado por Abraham Lincoln, comparado a
John Kennedy e principalmente desafiado por uma crise como foi Franklin D. Roosevelt.
É com Roosevelt (1933-1945)
que os paralelos mais fortes são
traçados, devido ao momento
similar em que chegam ao poder. Roosevelt assumiu em
meio à Grande Depressão; Obama assume em meio à pior crise
econômica desde então.
Há similaridades também
nas propostas para lidar com a
economia, com fortes gastos
públicos, maior regulação e um
clima geral de intervencionismo. E, se foi provavelmente a
Segunda Guerra -e não o New
Deal- que acabou com a depressão, Obama lucraria em se
apoiar nas estratégias de Roosevelt, dizem especialistas.
"Algumas propostas de Roosevelt foram economicamente
ingênuas, mas politicamente
significativas. Ele usou a crise
para fortalecer seu partido e
criou caminho para décadas de
maioria democrata no Congresso", disse à Folha o cientista político Benjamin Ginsberg,
autor de "American Government: Freedom and Power"
(governo americano: liberdade
e poder, W.W. Norton, 2002).
Outro ponto em comum é
que, enquanto Roosevelt foi
eleito após Herbert Hoover
(1929-1933), que deixou o poder massacrado pela crise,
Obama assume após George W.
Bush, que termina o mandato
com impopularidade superior
a 80%. O que não se sabe é se o
final do mandato será parecido.
"Roosevelt é considerado um
marco; é com ele que presidentes posteriores foram comparados", disse Matthew Crenson, professor de desenvolvimento político americano na
Universidade Johns Hopkins.
"É preocupante estabelecer esse padrão para Obama."
Apelo estilístico
Com relação ao republicano
Lincoln (1861-1865), sua imagem é catapultada ao presente
por esforço do próprio novo
presidente, que o cita como inspiração. Lincoln, assim como
Obama, fez carreira política em
Illinois e se apoiou fortemente
no poder das palavras. Dizia
querer no governo um "time de
rivais", o que o democrata afirma repetir. E fez a viagem de
trem a Washington para a posse, que Obama copiou. Em
grande medida, ao citá-lo Obama faz um apelo por união.
Fora do aspecto estilístico,
analistas apontam poucos pontos em comum. Lincoln assumiu quando os EUA entravam
em colapso e lutou a sangrenta
Guerra Civil para mantê-los
unidos. Também não era defensor nato da igualdade racial.
"Lincoln acabou com a escravidão, e há apelo para um presidente negro nisso; mas ele a
aboliu com bastante relutância,
por motivos estratégicos, não
morais", diz Ginsberg.
Mais propriamente comparável seria Kennedy (1961-1963). Crenson vê similaridades em três níveis: poder da
oratória, mudança geracional
no poder e por ele também ter
tido que superar preconceitos
para ser eleito (foi o primeiro
presidente católico dos EUA).
Além disso, também chegou ao
poder com pouca experiência.
Em termos de sensação de
mudança política, o historiador
da Universidade Harvard Timothy McCarthy compara
Obama a Ronald Reagan (1981-1989), que "despertou o sentimento de que uma nova era estava chegando a Washington".
Reagan frequentemente aparece em pesquisas como um dos
dez melhores presidentes dos
EUA de todos os tempos.
Os três primeiros, especialmente entre historiadores, costumam ser Lincoln, Roosevelt e
George Washington, primeiro
presidente (1789-1797). As pesquisas populares variam. Estudo do Gallup de 2007 teve nos
primeiros lugares Lincoln (citado por 18%), Reagan (16%),
Kennedy (14%), Bill Clinton
(13%) e Roosevelt (9%).
Obama terá o desafio se manter à altura das expectativas,
mas não é o primeiro a enfrentar o problema. "Há sempre
certa euforia com um novo presidente, o que eu acho meio
triste", diz Ginsberg. "Somos
como camponeses russos celebrando a chegada de um novo
czar; mas de czar em czar, pouca coisa muda."
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