São Paulo, segunda-feira, 08 de janeiro de 2001

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Mesmo sem paz, governar outra nação é errado

AMOS OZ
ESPECIAL PARA A FOLHA

O movimento pacifista israelense deve agora reconsiderar sua posição. Por 30 anos, nós temos dito que nenhuma paz pode ser obtida enquanto Israel governar outra nação; alguns de nós temos até dito que a insistência de Israel em governar outra nação é a verdadeira razão da fragilidade da paz. Mas nosso governo não insiste mais.
Israel está oferecendo aos palestinos um acordo de paz baseado nas fronteiras de 1967, com pequenas alterações. Propõe-se a remover os assentamentos israelenses espalhados dentro dos territórios palestinos; a fazer de Jerusalém Oriental a capital da Palestina; e a colocar, sob a custódia islâmica, locais sagrados em disputa.
Essa é a melhor proposta que Israel pode oferecer. E é feita aos palestinos à custa de uma ruptura sem precedentes dentro da sociedade israelense, à custa de um terremoto político. O povo judeu terá de fazer uma retirada traumática, um retrocesso em muitas de suas demandas históricas e teológicas, em muitos de seus mais antigos sonhos e em muitas de suas aspirações religiosas.
A nação palestina está rejeitando essa paz. Seus líderes agora clamam abertamente pelo "direito de retorno" de centenas de milhares de palestinos que fugiram ou foram expulsos de suas casas na guerra de 1948.
Implementar o "direito de retorno" palestino equivale à anulação do direito de autodeterminação do povo judeu. Isso fará com que os judeus sejam um grupo étnico minoritário. A implementação do "direito de retorno" significa erradicar Israel.
A resolução original das Nações Unidas, em novembro de 1947, legaliza dois Estados independentes para se estabelecer no território disputado, um para o povo judeu e outro para o povo palestino. O "direito de retorno" clamado pelos palestinos, na prática, significa que, em vez de "dois Estados para duas nações", haverá dois governos árabes nessa terra.
Tendo em vista essa dramática radicalização da posição palestina, israelenses que trabalham pela paz não devem aspirar por esse acordo, como de costume. Não devem também continuar contestando, assim como vêm fazendo por muitas décadas, que "o único obstáculo de paz é a ocupação de Israel em territórios palestinos".
Os pacifistas de Israel devem reconfigurar sua posição. Em vez de reclamar que a ocupação israelense em zonas palestinas é uma forma de impedir a paz, poderíamos dizer que, ainda que sem paz, governar outra nação é errado. Errado e nocivo.
A ocupação, fortalecida por dezenas de pequenos assentamentos no interior do território palestino, com a intenção de prevenir um futuro compromisso, não torna Israel fortalecido, mas enfraquecido. Enfraquecido e menos defensível.
Eu não subscrevo o conceito unilateral de separação. Israel deve agora usar severamente sua força de acordo com a realidade demográfica. Deve se retirar de regiões palestinas populosas e permitir que o povo palestino possa estabelecer seu Estado independente imediatamente, mesmo que sem um acordo de paz.
Os novos caminhos servirão de base para futuras negociações de paz. Nesse meio tempo, qualquer ataque palestino será visto como uma agressão de um Estado soberano contra o território vizinho, autorizando Israel a exercer seu direito de autodefesa.


Amos Oz é um dos principais escritores israelenses da atualidade.


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