São Paulo, segunda-feira, 05 de dezembro de 2005

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Igreja Católica lança campanha para ficar menos dependente do Estado

DE BUENOS AIRES

Em rota de colisão com o governo Néstor Kirchner, a Igreja Católica argentina lançou ontem campanha para arrecadar fundos e ficar "independente" financeiramente do Estado -7% de seu orçamento sai dos cofres públicos.
"A igreja necessita de seus dons e também do seu aporte econômico", diz a carta assinada pelos bispos argentinos que seria lida ontem nas missas de todo o país, segundo publicou o diário argentino "La Nación".
A campanha é impulsionada pelo influente cardeal de Buenos Aires, Jorge Bergoglio, eleito presidente da Conferência Episcopal Argentina no começo do mês -segundo jornais argentinos, ele seria um dos possíveis sucessores de João Paulo 2�. É também uma resposta da igreja à crise que atravessa com o governo argentino.
O mais recente momento tenso dessa relação foi há duas semanas, quando Kirchner comparou a igreja a "um partido político" e cobrou dos bispos que olhassem a própria instituição. Fez também referência à riqueza da igreja.
O discurso foi uma resposta a um documento da cúpula católica, que apontava um "crescimento escandaloso" da desigualdade social na Argentina e questionava a visão "maniqueísta" do governo sobre a última ditadura do país (1976-83).
A igreja não respondeu ao ataque, mas demonstra agora querer se desvincular do Estado, de quem recebe 11,2 milhões de pesos anuais (cerca de R$ 8,3 milhões), e dar mais transparência ao seu caixa.
A tensão entre a igreja e o Estado ganha relevo na Argentina por dois motivos: além da ampla maioria católica no país e de sua influência política, há uma ligação legal. Pela Constituição, o Estado tem como dever "sustentar o culto" católico, daí o aporte que vai principalmente para o pagamento dos bispos. Até 1966, os religiosos eram considerados funcionários públicos do Estado.
Numa preocupação com sua imagem, a igreja ampliou a seção em sua página na internet que explica como se mantém. Uma das perguntas é "A igreja é rica?".
A principal crise entre a cúpula católica e Kirchner envolveu o orçamento. Neste ano, o presidente destituiu o bispo militar Antonio Baseotto e cortou seu salário, sem a licença do Vaticano. O religioso sugerira "lançar ao mar" o ministro da Saúde, que defendeu a descriminalização do aborto - expressão que lembrou os "vôos da morte" operados na ditadura.
No documento do começo do mês, a igreja considerou o caso uma "interferência" e disse que "nem sempre é respeitada" a liberdade da instituição. Também está na rota de colisão o projeto de educação sexual, em tramitação no Congresso. Um bispo chegou a pregar "desobediência civil" caso sejam aprovadas regras contra a moral cristã. (FM)


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