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Mundo

Eu tenho um Sonho 50 anos

Leia �ntegra do discurso feito por Martin Luther King na Marcha sobre Washington, em 1963, com coment�rios de Carlos Eduardo Lins da Silva

MARTIN LUTHER KING WASHINGTON, 28 DE AGOSTO DE 1963

Estou feliz em me unir a voc�s hoje naquela que ficar� para a hist�ria como a maior manifesta��o pela liberdade na hist�ria de nossa na��o.

Cem anos atr�s, um grande americano, em cuja sombra simb�lica nos encontramos hoje, assinou a proclama��o da emancipa��o [dos escravos]. Este decreto momentoso chegou como grande farol de esperan�a para milh�es de escravos negros queimados nas chamas da injusti�a abrasadora. Chegou como o raiar de um dia de alegria, pondo fim � longa noite de cativeiro.

Mas, cem anos mais tarde, o negro ainda n�o est� livre. Cem anos mais tarde, a vida do negro ainda � duramente tolhida pelas algemas da segrega��o e os grilh�es da discrimina��o. Cem anos mais tarde, o negro habita uma ilha solit�ria de pobreza, em meio ao vasto oceano de prosperidade material. Cem anos mais tarde, o negro continua a mofar nos cantos da sociedade americana, como exilado em sua pr�pria terra. Ent�o viemos aqui hoje para dramatizar uma situa��o hedionda.

Em certo sentido, viemos � capital de nossa na��o para sacar um cheque. Quando os arquitetos de nossa rep�blica redigiram as magn�ficas palavras da Constitui��o e da Declara��o de Independ�ncia, assinaram uma nota promiss�ria de que todo americano seria herdeiro. Essa nota era a promessa de que todos os homens, negros ou brancos, teriam garantidos os direitos inalien�veis � vida, � liberdade e � busca pela felicidade.

� evidente hoje que a Am�rica n�o pagou esta nota promiss�ria no que diz respeito a seus cidad�os de cor. Em lugar de honrar essa obriga��o sagrada, a Am�rica deu ao povo negro um cheque que voltou marcado "sem fundos".

Mas n�s nos recusamos a acreditar que o Banco da Justi�a esteja falido. Nos recusamos a acreditar que n�o haja fundos suficientes nos grandes dep�sitos de oportunidade desta na��o. Por isso voltamos aqui para cobrar este cheque --um cheque que nos garantir�, a pedido, as riquezas da liberdade e a seguran�a da justi�a.

Tamb�m viemos para este lugar santificado para lembrar � Am�rica da urg�ncia ferrenha do agora. N�o � hora de se dar ao luxo de esfriar os �nimos ou tomar a droga tranquilizante do gradualismo. Agora � a hora de fazermos promessas reais de democracia. Agora � a hora de sairmos do vale escuro e desolado da segrega��o para o caminho ensolarado da justi�a racial. � hora de arrancar nossa na��o da areia movedi�a da injusti�a racial e lev�-la para a rocha s�lida da fraternidade. Agora � a hora de fazer da justi�a uma realidade para todos os filhos de Deus.

Seria fatal para a na��o passar por cima da urg�ncia do momento e subestimar a determina��o do negro. Este ver�o sufocante da insatisfa��o leg�tima do negro n�o passar� enquanto n�o chegar um outono revigorante de liberdade e igualdade. 1963 n�o � um fim, mas um come�o.

Os que esperam que o negro precisasse apenas extravasar e agora ficar� contente ter�o um despertar rude se a na��o voltar � normalidade de sempre. N�o haver� descanso nem tranquilidade na Am�rica at� que o negro receba seus direitos de cidadania. Os turbilh�es da revolta continuar�o a abalar as funda��es de nossa na��o at� raiar o dia iluminado da justi�a.

Mas h� algo que preciso dizer a meu povo posicionado no morno limiar que conduz ao pal�cio da justi�a. No processo de conquistar nosso lugar de direito, n�o devemos ser culpados de atos errados. N�o tentemos saciar nossa sede de liberdade bebendo do c�lice da amargura e do �dio.

Temos de conduzir nossa luta para sempre no alto plano da dignidade e da disciplina. N�o devemos deixar nosso protesto criativo degenerar em viol�ncia f�sica. Precisamos nos erguer sempre e mais uma vez � altura majestosa de combater a for�a f�sica com a for�a da alma.

A nova e maravilhosa milit�ncia que tomou conta da comunidade negra n�o deve nos levar a suspeitar de todas as pessoas brancas, pois muitos de nossos irm�os, conforme evidenciado por sua presen�a aqui hoje, acabaram por entender que seu destino est� vinculado ao nosso destino e que a liberdade deles est� vinculada indissociavelmente � nossa liberdade.

N�o poderemos caminhar sozinhos.

E, enquanto caminhamos, precisamos fazer a promessa de que caminharemos para frente. N�o poderemos retroceder. H� quem esteja perguntando aos devotos dos direitos civis: Quando voc�s ficar�o satisfeitos?'. Jamais estaremos satisfeitos enquanto o negro continuar sendo v�tima dos desprez�veis horrores da brutalidade policial.

Jamais estaremos satisfeitos enquanto nossos corpos, pesados da fadiga de viagem, n�o puderem hospedar-se nos hot�is de beira de estrada e nos hot�is das cidades. N�o estaremos satisfeitos enquanto a mobilidade b�sica do negro for apenas de um gueto menor para um maior. Jamais estaremos satisfeitos enquanto nossas crian�as tiverem suas individualidades e dignidades roubadas por cartazes que dizem exclusivo para brancos'.

Jamais estaremos satisfeitos enquanto um negro no Mississippi n�o puder votar e um negro em Nova York acreditar que n�o tem nada em que votar.

N�o, n�o estamos satisfeitos e s� ficaremos satisfeitos quando a justi�a rolar como �gua e a retid�o correr como um rio poderoso.

Sei que alguns de voc�s aqui est�o, vindos de grandes prova��es e atribula��es. Alguns vieram diretamente de celas estreitas. Alguns vieram de �reas onde sua busca pela liberdade os deixou feridos pelas tempestades da persegui��o e marcados pelos ventos da brutalidade policial. Voc�s t�m sido os veteranos do sofrimento criativo. Continuem a trabalhar com a f� de que o sofrimento imerecido � redentor.

Voltem ao Mississippi, voltem ao Alabama, voltem � Carolina do Sul, voltem � Ge�rgia, voltem � Louisiana, voltem aos guetos e favelas de nossas cidades do norte, cientes de que de alguma maneira a situa��o pode ser mudada e o ser�. N�o nos deixemos atolar no vale do desespero.

Digo a voc�s hoje, meus amigos, que, apesar das dificuldades de hoje e de amanh�, ainda tenho um sonho.

� um sonho profundamente enraizado no sonho americano.

Eu tenho um sonho de que um dia esta na��o se erguer� e corresponder� em realidade o verdadeiro significado de seu credo: Consideramos essas verdades manifestas: que todos os homens s�o criados iguais'.

Tenho um sonho de que um dia, nas colinas vermelhas da Ge�rgia, os filhos de ex-escravos e os filhos de ex-donos de escravos poder�o sentar-se juntos � mesa da irmandade.

Tenho um sonho de que um dia at� o Estado do Mississippi, um Estado des�rtico que sufoca no calor da injusti�a e da opress�o, ser� transformado em um o�sis de liberdade e de justi�a.

Tenho um sonho de que meus quatro filhos viver�o um dia em uma na��o onde n�o ser�o julgados pela cor de sua pele, mas pelo teor de seu car�ter.

Tenho um sonho hoje.

Tenho um sonho de que um dia o Estado do Alabama, cujo governador hoje tem os l�bios pingando palavras de rejei��o e anula��o, ser� transformado numa situa��o em que meninos negros e meninas negras poder�o dar as m�os a meninos brancos e meninas brancas e caminharem juntos, como irm�s e irm�os.

Tenho um sonho hoje.

Tenho um sonho de que um dia cada vale ser� elevado, cada colina e montanha ser� nivelada, os lugares acidentados ser�o aplainados, os lugares tortos ser�o endireitados, a gl�ria do Senhor ser� revelada e todos os seres a enxergar�o juntos.

Essa � nossa esperan�a. Essa � a f� com a qual retorno ao Sul. Com esta f� poderemos talhar da montanha do desespero uma pedra de esperan�a. Com esta f� poderemos transformar os acordes dissonantes de nossa na��o numa bela sinfonia de fraternidade. Com esta f� podemos trabalhar juntos, orar juntos, lutar juntos, ir � cadeia juntos, defender a liberdade juntos, conscientes de que seremos livres um dia.

Esse ser� o dia em que todos os filhos de Deus poder�o cantar com novo significado:"["Meu pa�s, � de ti, doce terra da liberdade, � de ti que canto. Terra em que morreram meus pais, terra do orgulho do peregrino, que a liberdade ressoe de cada encosta de montanha".

E, se quisermos que a Am�rica seja uma grande na��o, isso precisa se tornar realidade.

Ent�o que a liberdade ressoe dos prodigiosos picos de New Hampshire.

Que a liberdade ecoe das majestosas montanhas de Nova York!

Que a liberdade ecoe dos elevados Alleghenies da Pensilv�nia!

Que a liberdade ecoe das Nevadas Rochosas do Colorado!

Que a liberdade ecoe das suaves encostas da Calif�rnia!

Mas n�o s� isso --que a liberdade ecoe da Montanha de Pedra da Ge�rgia!

Que a liberdade ecoe da Montanha Sentinela do Tennessee!

Que a liberdade ecoe de cada monte e mont�culo do Mississippi. De cada encosta de montanha, que a liberdade ecoe.

E quando isso acontecer, quando deixarmos a liberdade ecoar, quando a deixarmos ressoar em cada vila e vilarejo, em cada Estado e cada cidade, poderemos trazer para mais perto o dia que todos os filhos de Deus, negros e brancos, judeus e gentios, protestante e cat�licos, poder�o se dar as m�os e cantar, nas palavras da velha can��o negra, "livres, enfim! Livres, enfim! "Louvado seja Deus Todo-Poderoso. Estamos livres, enfim!"


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