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"Pedagogia da Indignação" reúne textos inéditos
do educador Paulo Freire escritos nos últimos anos de vida
Cartas às novas gerações
Marilene Felinto
da Equipe de Articulistas
Os textos escritos pelo educador
Paulo Freire em seus últimos dias
de vida, bem como artigos seus inéditos
produzidos em 1992 e 1996, estão reunidos agora neste "Pedagogia da Indignação".
O livro concentra na primeira parte
(intitulada "Cartas Pedagógicas") três
ensaios que apontam para o projeto que
Freire já começara a desenvolver desde a
publicação de "Cartas a Cristina" (1994):
o projeto de sistematizar seu pensamento teórico e político-pedagógico de forma mais acessível, como quem tivesse
mesmo urgência de comunicar.
O projeto de -segundo ele mesmo explica na "Primeira Carta"- "escrever
umas cartas pedagógicas em estilo leve
cuja leitura tanto pudesse
interessar jovens pais e
mães quanto, quem sabe,
filhos e filhas adolescentes
ou professoras e professores que, chamados à reflexão pelos desafios em sua
prática docente, encontrassem nelas elementos capazes de ajudá-los na elaboração de suas respostas".
O ponto de vista do pai
Escrita em
janeiro de 1997 (Paulo Freire morreria
em maio daquele ano), essa primeira
carta discute a educação de crianças e jovens numa época de mudanças comportamentais e tecnológicas aceleradas como a nossa. Revê o confronto entre licenciosidade e autoritarismo, entre liberdade e autoridade. Conforme comenta no
posfácio sua mulher, Ana Maria Freire, o
educador analisou nesse texto, "seu percurso enquanto pai e pela primeira vez
escreveu sobre a educação sob este ponto
de vista".
Na segunda carta ("Do Direito e do Dever de Mudar o Mundo"), o autor da
"Pedagogia do Oprimido" expõe toda a
sua visão otimista ao destacar a responsabilidade das mentalidades e dos educadores progressistas na conformação de um futuro democrático para o país.
"A tarefa progressista é
(...) estimular e possibilitar, nas circunstâncias mais diferentes, a capacidade de intervenção no mundo, jamais o seu contrário, o cruzamento de braços em face dos
desafios." Freire cita como exemplo de
persistência progressista o Movimento
dos Sem Terra, que descreve como "ético
e pedagógico", identificando suas raízes
na rebeldia dos quilombos e, mais recentemente, nas Ligas Camponesas esmagadas pelo regime de 64.
A terceira carta trata do assassinato do
índio pataxó Galdino Jesus dos Santos,
queimado vivo por um grupo de adolescentes de Brasília em abril de 97. É um
Paulo Freire indignado que retoma o tema da primeira carta, a importância da
educação dos adolescentes, a dicotomia
liberdade/licenciosidade: "Não é possível refazer este país, democratizá-lo, humanizá-lo, torná-lo sério, com adolescentes brincando de matar gente, ofendendo a vida, destruindo o sonho, inviabilizando o amor. Se a educação sozinha
não transforma a sociedade, sem ela
tampouco a sociedade muda".
Urgência da intervenção
Na atualidade dos temas dessas três cartas, bem
como no propósito de dar a elas uma forma mais "digerível" que a do ensaio tradicional, há talvez duas revelações. Primeira: a necessidade de interferir com
urgência no mundo que ele intuía talvez
estar lhe escapando aos pés -pouco antes de sua morte, Freire disse em uma entrevista que não viveria mais do que cinco ou dez anos.
A segunda revelação: dar vazão, nos últimos anos de vida, ao sonho um tanto
frustrado de não ter sido escritor de ficção, conforme confessou à Folha numa
entrevista, em 1994. A carta está muito
mais próxima da ficção do que do ensaio, e Paulo Freire era apaixonado pelo
ato de escrever: "Escrever, para mim,
vem sendo tanto um prazer profundamente experimentado quanto um dever
irrecusável, uma tarefa política a ser
cumprida. A alegria de escrever me toma
o tempo todo" ("Cartas a Cristina").
A segunda parte (intitulada "Outros
Escritos") dessa edição póstuma traz os
ensaios "Descobrimento da América"
(1992), "Alfabetização e Miséria", "Desafios da Educação de Adultos ante a Nova
Reestruturação Tecnológica", "A Alfabetização em Televisão", "Educação e Esperança" e "Denúncia, Anúncio, Profecia, Utopia e Sonho", todos de 1996.
Pedagogia da Indignação
134 págs., R$ 14,00
de Paulo Freire. Ed. Unesp
(praça da Sé, 108, CEP 01001-900, SP, tel. 0/xx/11/232-7171).
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