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Imigração e deslocamentos culturais permeiam exposição de Maurício Dias e Walter Riedweg, em cartaz e m SP
Eu é um outro
JULIANA MONACHESI
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
Os deslocamentos no espaço geográfico e os conseqüentes deslocamentos
culturais e econômicos na
sociedade são o maior interesse da
pesquisa estética de Maurício Dias e
Walter Riedweg, que estão com exposição em cartaz na galeria Vermelho (tel. 0/xx/11/3257-2033), em SP.
Mais ou menos explícita, a temática
da imigração perpassa todas as
obras da dupla, eles mesmos imigrantes -o brasileiro Dias viveu
mais de dez anos na Suíça e o suíço
Riedweg vive há sete no Brasil. Isso o
público paulistano pôde ver em 1998
na videoinstalação "Os Franciscos,
os Severinos e os Raimundos", apresentada na 24� Bienal de SP, que documentava a vida e o trabalho de 33
porteiros nordestinos com esses
prenomes na cidade de São Paulo.
O imigrante é aquele que desafia a alteridade
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Na mostra "Cabra Criada" há dois
trabalhos mais diretamente relacionados ao tema: "Voracidade Máxima", que a dupla comenta na entrevista a seguir, e "David & Gustav",
em que os artistas Gustav Metzger,
polonês, e David Medalla, filipino,
mantêm uma conversa imaginária
sobre o exílio.
Folha - O conceito de imigração parece nortear o trabalho de vocês. Essa
idéia é definidora da condição humana hoje, na visão de vocês?
Maurício Dias e Walter Riedweg - O
que norteia nosso trabalho é a alteridade, as relações entre os indivíduos
e grupos que compõem a sociedade,
desde sua forma mais subjetiva entre uma pessoa e outra (que ela deseja ser, ter, se comunicar) à alteridade
sociopolítica entre as identidades
culturais (prisioneiros, policiais, políticos, refugiados etc.). O imigrante
é aquele que desafia a alteridade, que
migra de uma posição a outra, de
uma realidade a outra, no espaço e
no tempo, sempre acumulando suas
experiências de percurso em sua
subjetividade luxuosa. Nesse sentido, o imigrante redefine a condição
humana na contemporaneidade.
Folha - Outra marca de sua produção é o trabalho colaborativo.
Dias e Riedweg - A alteridade é o tema e, portanto, o encontro é a forma, a metodologia de nosso trabalho. Nosso trabalho é provocar, promover encontros com o outro ou
um grupo de pessoas (definidos por
uma condição social, geográfica,
econômica mas também por um
simples conceito de trabalho que as
reúna). Esses encontros são baseados em um conteúdo e têm um roteiro, um conceito que promove um
exercício visível de alteridade em diversos níveis, o que tentamos registrar da forma mais aberta e complexa possível em vídeos, videoinstalações, textos, fotografias etc.
Folha - Em "Voracidade Máxima",
dois movimentos migratórios se mesclam (o de imigrantes ilegais vivendo
em Barcelona e o de sexualidades
cambiantes no interior dos próprios
michês), conjugando subjetividade e
política. Essa é uma busca constante
de vocês? Ocorre em outras obras?
Dias e Riedweg - Em todas, com
acentos e focos diferentes. Em "Voracidade Máxima", a cama serve como palco do improvável encontro
entre subjetividades tão distintas como as de um michê imigrante ilegal
e seu cliente banqueiro europeu.
A cama é o ponto de encontro entre duas urgências que ali se conjugam: a urgência da situação econômica do imigrante ilegal e a urgência
subjetiva e sexual de seu cliente. Esse
encontro improvável na cama permite reinvestigar a proximidade e o
distanciamento (sempre mutáveis)
entre duas pessoas e suas respectivas
significações político-sociais. A alteridade é uma das coisas que mais definem o espaço social e político. Nosso trabalho consiste em investigar
como essas psicologias privadas afetam e constituem o espaço público.
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