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"FRANCISCO JULIÃO - LUTA, PAIXÃO E MORTE DE UM AGITADOR"
Filho da casa-grande foi líder sem-terra
XICO SÁ
DA REPORTAGEM LOCAL
Comparado no Nordeste a
Joaquim Nabuco, burguês
branco que saiu em defesa intransigente da abolição dos escravos,
o líder político Francisco Julião
(1915-99) largou a casa-grande,
seu berço, para ser o primeiro líder político em defesa da reforma
agrária -"na lei ou na marra",
como pregava- no país.
Julião fundou, na segunda metade dos anos 50, na oligárquica
zona canavieira de Pernambuco,
as Ligas Camponesas, espécie de
MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra) da época. Foi um escândalo. A saga do
homem acaba de sair em livro,
com reportagem substanciosa e
correções de erros que já haviam
tomado ares de história oficial.
Lançado no Recife, em coleção
da Assembléia Legislativa sobre
parlamentares ilustres, "Francisco Julião - Luta, Paixão e Morte de
um Agitador" é de autoria do jornalista Vandeck Santiago, 39, ex-repórter da Agência Folha.
O livro mostra a assombração
que representava o líder dos camponeses para a oligarquia brasileira e como deixou de orelha em pé
o presidente norte-americano
John Kennedy. Reportagem de
capa do "The New York Times",
de 31 de outubro de 60, assinada
por Tad Szulc (autor de recentes
biografias de Fidel Castro e João
Paulo II) revelava esse temor.
A revolução que acabara de ser
feita em Cuba, em 59, ajudava a
criar o pânico. O medo era que
chegassem por aqui os mesmos
ventos do Caribe, a partir da experiência de Pernambuco, com Julião e seus agitadores do campo.
Em 1� de novembro de 60, o
mesmo Szulc, nesse embalo, cravava a seguinte manchete: "Marxistas estão organizando os camponeses no Brasil".
Com foices, enxadas e facões, as
"Ligas Camponesas" revelavam
ao cotidiano das grandes cidades,
como anota Santiago, uma classe
até então "invisível". Pouco depois, as marchas ocupavam o noticiário policial dos jornais, espaço reservado aos "desordeiros".
Quando iniciou a formação das
ligas, os trabalhadores do campo
eram tratados, no discurso oficial
de políticos e na imprensa, como
"rurícolas".
Julião passou a adotar o termo
camponês, o que era tido como
uma palavra com tintas esquerdistas, quase banida.
O líder político, deputado estadual e federal, cassado e exilado
em 64, tinha um zelo e tanto pela
linguagem a ser utilizada pelo
movimento que comandava.
"Antes da luta pela desapropriação de terras, cuidou de desapropriar os substantivos", diz o autor
da sua biografia.
Advogado de causas rejeitadas
na época, como a das prostitutas
perseguidas no Recife pela Delegacia de Costumes, Julião foi também um contista que mereceu
elogios de gente do ramo, como
Gilberto Freyre, por exemplo.
O homem que agitou pela primeira vez o campo no Brasil morreu aos 84 anos, de infarto, na penúria, esquecido, na cidade mexicana de Tepoztlán.
Três anos antes, havia tentado,
em uma melancólica aliança com
usineiros e latifundiários de Pernambuco (seus ex-inimigos), a
eleição para a Câmara dos Deputados, pelo PDT. Obteve menos
de 4.000 votos. Desgostoso, rumou para o México, queria esquecer o personagem que foi.
FRANCISCO JULIÃO - LUTA, PAIXÃO E MORTE DE UM AGITADOR. De: Vandeck
Santiago. Lançamento: Assembléia
Legislativa de Pernambuco, 201 págs.
Quanto: distribuição gratuita (pedidos
para Departamento de Imprensa da
Assembléia Legislativa de Pernambuco,
rua da Aurora, 631, Cep 50050-010,
Recife - PE ou pelo e-mail
trumbo@uol.com.br)
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