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Crítica
Diretor é único no cinema americano
INÁCIO ARAUJO
CRÍTICO DA FOLHA
A respeito de "Invictus" é
possível sacar todas as
reservas que, mesquinhamente, constumamos formular nesses casos. Que Clint
Eastwood idealiza Nelson
Mandela, que sua visão da convivência entre brancos e negros
após o fim do apartheid é idílica. Que ele vê Mandela mais à
direita (ou à esquerda, é indiferente), mais genial (ou menos
do que era "na realidade") etc.
O fato, porém, é que Eastwood vai ao ponto de uma
questão, talvez a mais explosiva
de nosso tempo: a constituição
de sociedades multirraciais (e
multirreligiosas) e a necessidade de tolerância entre esses
grupos, desde que não se pretenda chegar a um desastre,
num momento em que as migrações são provavelmente
mais intensas do que em qualquer outra época. Eastwood,
que tanto pensou a América e
suas questões, aqui expande o
raio de seu pensamento.
No caso, temos um Mandela,
assim que toma posse, às voltas
com uma banalidade: o time
nacional de rúgbi, que disputará um campeonato mundial,
está uma porcaria. Pior, ele é
um signo da permanência dos
velhos tempos, já que o rúgbi é
um esporte de brancos (os negros preferem o futebol).
Diante disso, Mandela toma
todas as cautelas para que o time faça bonito no campeonato,
o que, para ele, é uma enorme
oportunidade de superar, simbolicamente, as muitas divergências entre brancos e negros.
Como em todo bom filme
com disputas esportivas, a
emocionalidade é intensa. Mas
o essencial vem menos do rúgbi
do que do projeto de Mandela:
fazer com que uma população
cindida por anos de disputas
aceite o outro. Nessa tarefa, vai
tourear alguns negros de seu
estafe (ele introduz brancos em
sua segurança), e contará com
Francis (Damon), o capitão do
time, como cúmplice.
Pode-se dizer, contra o filme,
que inúmeras questões são
abordadas e deixadas de lado.
Que cria "núcleos simplificantes". Ou que às vezes escorrega
do sentimental para o sentimentalista.
Em troca, podemos lembrar
a cena de abertura, num campo
de rúgbi tomado por brancos,
que passa para o outro lado da
rua, onde meninos negros jogam futebol como exemplo de
como as imagens podem dar
conta de determinada situação.
O essencial, porém, não está
na maior ou menor habilidade
para equacionar certos problemas, e sim na postura praticamente única de Eastwood entre os grandes diretores americanos: ele tem algo a dizer e diz.
Não está muito preocupado em
prestar contas de cada uma de
suas cenas ou em produzir brilharecos. Seus filmes parecem
oscilar, hoje, entre dois belos
modelos da tradição americana: Ford e Hawks. Este filme é
mais Ford: a história antes do
homem, o mito se impõe à realidade, o símbolo supera o fato.
INVICTUS
Direção: Clint Eastwood
Produção: EUA, 2009
Onde: estreia no Anália Franco UCI, Espaço Unibanco e circuito
Classificação: livre
Avaliação: ótimo
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