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SHOW/CRÍTICA
Percussão e programações prevalecem
Lulu faz trajeto rumo ao samba
PEDRO ALEXANDRE SANCHES
da Reportagem Local
Houvesse lógica linear orientando Lulu Santos, seu próximo disco seria de samba, ao
que indica o show "Calendário", em cartaz até domingo.
A lógica interna de "Calendário" traça esse conduto: começa no rock, namora o tecno e
descamba no samba -o rock
de entrada, "Fogo de Palha",
volta ao final, gravado, num retro-remix de puro samba.
Entre o rock e o samba, o que
importa é o mais desabalado
duelo do ano. De um lado, o
sambista Armando Marçal
comprova-se gênio musical, fazendo mágica na percussão.
Do outro, o produtor pop Fábio Fonseca comanda teclados
e sintetizadores, forrando o ar
de barulhos de 2001.
Lulu Santos dá a liga e comanda a massa, mas seria só
mais um seu show, não fosse o
duelo que quer dizer que no
samba e no tecno está o futuro
pop brasileiro.
Primeiro ponto: não está no
rock. Por isso é lamentável que
Lulu tenha abortado o projeto
rocker com o trio Jakaré, que
ele manteve em cartaz no Rio e
pensou em transformar em
CD. Era o lado B de Lulu, seus
não-sucessos embalados no
tradicional rock'n'roll, e era
um documento precioso dos
lulus que brigam em Lulu.
Agora, ele se acolchoa no que
há de mais quadrado em seu
histórico: aquele rosário interminável de sucessos pop inquestionáveis e indestrutíveis.
Não adianta nem citar, não falta nenhum. Com Marçal e Fonseca, o quadradismo dos seus
versos se inverte numa enxurrada de soluções inesperadas,
que faz matutar por que diabos
"Calendário", o CD, é tão pouco ousado.
O set "do coração", com várias de suas melhores criaturas
("Tempos Modernos", "Um
pro Outro", "Tudo Azul", o trio
zen-surfismo "Sereia"/"De Repente Califórnia"/"Como uma
Onda") levadas em total delicadeza, é desde já antológico.
Num espetáculo que dispõe,
com doses iguais de brilho e
marketing, de recursos de cenografia, iluminação, entusiasmo e entrosamento de banda,
Lulu domina até mesmo interpretação (embora vá se cansando ao longo do show). Intérprete, convulsiona a platéia
em "Descobridor dos Sete Mares" (de Tim Maia, sensacional
nas interferências sintéticas de
Fonseca e nas "naturais" de
Marçal) e "Dancin" Days".
Na síntese, entre um "Fogo
de Palha" e o outro -e entre as
simpáticas intervenções "easy
listening" no início e antes do
bis- fica "Certas Coisas", bem
no meio do show, levada primeiro nos conformes e depois
transformada em samba, em
Jorge Ben, em tecno, em música do século que vem.
É, enfim, um acontecimento.
Se não é o mais criativo entre os
pares de sua idade ou mais velhos, Lulu se confirma cada vez
mais um dos menos acomodado entre eles. É frio, calculista e
preciso. São as mãos sujas do
rabo preso com a indústria a
serviço da depuração do pop,
tanto quanto o contrário. É vida e samba e tecno no mofo. O
monstro respira.
Avaliação: ![](https://cdn.statically.io/img/www.uol.com.br/fsp/images/ep.gif)
Show: Calendário
Artista: Lulu Santos
Onde: Palace (al.dos Jamaris, 213,
Moema, tel. 0/xx/11/5051-4900)
Quando: hoje e amanhã, às 22h, e
domingo, às 19h
Quanto: R$20 a R$55
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