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LIVROS/LANÇAMENTOS
"BILAC VÊ ESTRELAS"
Estréia de Castro é policial sutil
LUÍS FRANCISCO CARVALHO F�
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS
"Bilac Vê Estrelas", primeiro romance de Ruy
Castro, surpreende pela ingenuidade da trama policial. Não há
tensão dramática ou suspense. Sexo e violência não são fios condutores da história. Há humor, sutileza, saudosismo. Tudo termina
bem, sem mortos e com alguns levemente feridos.
Adaptada a obra para o cinema,
o filme seria classificado pelo vigilante Ministério da Justiça como
obra recomendável para todas as
idades.
O livro é protagonizado por
duas personalidades do passado,
bastante populares em sua época
e que, por diferentes motivos, são
desconhecidas das novas gerações e, não por acaso, merecedoras do interesse de um biógrafo.
O nome de Olavo Bilac está inscrito na história da literatura como o grande poeta parnasiano,
aliás, como o "Príncipe dos Poetas
Brasileiros", lido e recitado com
admiração pelos contemporâneos. Com o tempo, no entanto,
sua poesia adquiriu a fama de ser
perfeita, mas entediante, um pesadelo para vestibulandos, injustamente contaminada pela imagem de quem incentivara civismo
e serviço militar obrigatório.
Já o negro José do Patrocínio
brilhou como ativista da abolição
da escravatura. Jornalista poderoso e orador destemido, morreu no
ostracismo, tentando construir
uma aeronave, um enorme balão,
para alçar vôo sobre o Rio de Janeiro.
Seus três romances, publicados
como folhetins em sua juventude,
sumiram de circulação e não integram as antologias. Durante anos,
sacudiu "as teclas dos corações",
como uma "pilha elétrica" (nas
palavras de Sílvio Romero), mas,
dada a atitude ambígua em relação ao Império, acabou renegado
pelos republicanos.
A espinha dorsal da obra de Ruy
Castro é justamente a crônica de
Bilac sobre Patrocínio e a construção do balão Santa Cruz, publicada na "Gazeta de Notícias" em
1903 e que faz parte da bela edição
"Vossa Insolência", da Companhia das Letras (1996).
O cronista descreve com entusiasmo o "emaranhado rutilante
de hastes metálicas" concebido
pelo "gênio humano" e prestes a
voar, fala das dificuldades materiais para o término do empreendimento que deveria encher de
orgulho o país e menciona o desgosto que devorava a alma de Patrocínio, ridicularizada "pela pilhéria grosseira das badernas carnavalescas".
Ruy Castro reúne Bilac e Patrocínio, apogeu e melancolia, no
centro de uma intriga internacional articulada para a apropriação,
a qualquer custo, dos desenhos da
preciosa aeronave, a eliminação
do inventor e a venda do invento
para potências européias.
Um cadáver. Um acidente automobilístico. Um duelo. Um jantar
de gala com a princesa Isabel.
Santos Dumont. Uma bonita mulher. A anatomia de uma sedução
amorosa. Um padre católico mulherengo e vigarista. Malandros
cariocas. Correrias. Maledicências. Pequenas aventuras vão se
sucedendo numa atmosfera provinciana e divertida.
Há uma passagem que sintetiza
o humor ao mesmo tempo pastelão, como registra Cony, e refinado do livro.
Ao dobrar uma esquina em Paris, um desastrado Bilac tromba
com mulher que volta da feira
carregando uma cesta. Era Gertrude Stein levando frutas que
serviriam de modelo para naturezas-mortas de Picasso e Juan Gris:
"Pode ser que, pelo estado em que
ficaram as frutas ao cair da cesta
(o melão se rachara, as pêras e as
maçãs ganharam ângulos inesperados), tenham sido elas as primeiras inspiradoras do cubismo".
A narrativa nos remete ainda
para um universo vocabular que
também desapareceu. Assim como deixaram de existir pedaços
do Rio de Janeiro que servem de
cenário para o livro. Leitura fácil e
saborosa.
Bilac Vê Estrelas
Autor: Ruy Castro
Editora: Companhia das Letras
Quanto: R$ 19 (152 págs.)
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