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Crítica/"Alice no País das Maravilhas"
Moralista, "Alice" de Burton decepciona por pouca imaginação
Recriação da obra de Lewis Carroll tem visual arrebatador, mas peca por tom aventuroso e personagens sem vida
RICARDO CALIL
CRÍTICO DA FOLHA
A união artística entre o
escritor britânico Lewis Carroll e o cineasta
americano Tim Burton parecia
destinada a se tornar um casamento perfeito, já que ambos
são brilhantes cultores da fantasia. Mas "Alice no País das
Maravilhas" é, sob vários aspectos, uma decepção.
Como já havia feito nas adaptações de materiais não originais (como os dois "Batman" e
"A Fantástica Fábrica de Chocolate"), Burton busca um
olhar próprio para um universo
já conhecido. Em vez de simplesmente transpor o livro, cria
uma premissa nova.
Alice (Mia Wasikowska) é
uma garota de 19 anos diante
do dilema de aceitar ou não um
casamento de conveniência. Na
hora do pedido, corre atrás de
um coelho, cai no buraco que a
leva ao país das maravilhas e
encontra personagens como o
Chapeleiro Maluco (Johnny
Depp) e o Gato de Cheshire.
A
partir daí, duas questões se instauram. Será ela a mesma Alice
que visitou o lugar ainda criança? Será ela capaz de libertar o
país da Rainha Vermelha (Helena Bonham Carter) e reconduzir a Rainha Branca (Anne
Hathaway) ao poder?
O primeiro problema da recriação é introduzir, no prólogo
e no epílogo "realistas", uma
moral da história onde não havia antes. O conflito entre convenção e imaginação é encenado de forma convencional e
pouco imaginativa, ainda mais
se comparado à obra de Burton.
Já a parte não realista do filme, passada no país das maravilhas, tem outra limitação. Em
vez de se esbaldar com o fantástico material de origem, Burton
adota aquele tom aventuroso
meio genérico, de sucessivas
perseguições e batalhas, que
domina séries como "Harry
Potter" e até mesmo "O Senhor
dos Anéis".
Como de hábito na obra de
Burton, o visual é arrebatador,
incluindo aí cenários, figurinos
e composições dos personagens. Mas, como em seus trabalhos mais frágeis ("A Lenda do
Cavaleiro sem Cabeça"), o esforço estético é tão intenso que
parece sobrar pouca energia
para dar vida aos personagens.
O resultado lembra um desfile
de moda belíssimo, mas frio,
mecânico, artificial -sensação
reforçada pela interpretação
maneirista, calcada em trejeitos, de Depp e Hathaway.
Burton é um dos autores fundamentais do cinema contemporâneo (e não será "Alice" que
irá lhe roubar o status). Esse fato abre a possibilidade de uma
conclusão confortável: dizer
que um filme equivocado de
um autor é mais relevante do
que uma boa produção de alguém que não tem tal título.
Mais justo será afirmar que o
maior êxito comercial da carreira de Burton é um de seus
trabalhos menos memoráveis.
ALICE NO PAÍS DAS
MARAVILHAS
Diretor: Tim Burton
Produção: EUA, 2010
Com: Johnny Depp, Helena Bonham
Carter e Mia Wasikowska
Onde: nos cines Bristol, Espaço Unibanco Pompeia e circuito
Classificação: 10 anos
Avaliação: regular
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