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MOSTRARIO
"Velvet Goldmine" reedita a era glitter
PEDRO ALEXANDRE SANCHES
enviado especial ao Rio
O Rio de Janeiro vê hoje, em sessão por enquanto única no Brasil,
o primeiro grande esforço cinematográfico a pesquisar o caldo de
cultura de um período que acabou
relativamente obscurecido dentro
da história da música pop: a era
glitter, mais ou menos circunscrita
entre 1969 e 1974.
Trata-se de "Velvet Goldmine",
do norte-americano Todd Haynes,
estrelado por Ewan McGregor e Jonathan Rhys Meyers.
Este último protagoniza o filme,
interpretando o pop star Brian Slade, inspirado no mais popular dos
ídolos glitter (ou glam -era outro
apelido), o inglês David Bowie.
Curt Wild, personagem de
McGregor, é um híbrido de Iggy
Pop e Lou Reed, precursores do
glitter à época mergulhados no ostracismo e, em 72, resgatados pelas
mãos de produtor de Bowie.
O filme, que levou prêmio de melhor contribuição artística na última edição de Cannes, tem sessão
às 21h30, sem legendas em português, dentro da MostraRio. Estréia
em outubro na Inglaterra e em novembro nos EUA; no Brasil, nem
há previsão de estréia oficial.
O filme, caracterizado por Todd
Haynes (antes diretor de "Veneno") como estritamente de ficção,
aborda o romance entre os roqueiros Slade e Wild como pretexto para esmiuçar o viés comportamental do período glitter.
Assim, ganham a tela grande pela
primeira vez os artistas que ousaram, no ocaso dos anos hippies,
vestir a agressividade do rock com
plumas, purpurina, sapatos plataforma e maquiagem abundante.
Tudo se deu em torno dos ingleses Marc Bolan (líder da banda T.
Rex e algo eclipsado no filme) e
Bowie (já encharcado da sexualidade ambígua do Velvet Underground, de Lou Reed). Na ponta
norte-americana, os New York
Dolls, declarados heterossexuais,
fizeram eco tocando rock pesado
vestidos de mulher.
Bowie, sempre marketeiro, assumiu a liderança da onda, declarando-se gay na imprensa inglesa
(mais tarde ele desmentiria) e, em
seguida, inventando a persona
Ziggy Stardust, pop star andrógino
que veio do espaço e vive na Terra
a ascensão e queda do próprio ego.
"Velvet Goldmine" -o título é
ode a uma explícita e obscura canção de Bowie, que entraria no álbum "The Rise and Fall of Ziggy
Stardust and The Spiders from
Mars" (72) e foi limada- retoma e
amplia a "lenda" de Ziggy.
O Ziggy do filme, Brian Slade (o
nome é referencial a Brian Eno e
Bryan Ferry, líderes do Roxy Music, outro dos expoentes do glam, e
a Slade, banda glitter de segundo
time), simula o próprio assassinato por não aguentar as pressões do
estrelato -e desaparece.
Discretos, quase desaparecidos
em "Velvet Goldmine" estão também vários astros pop dos anos 90,
recrutados pelo produtor-executivo do filme, Michael Stipe (também líder da banda R.E.M.) para
participações especiais.
Bandas fictícias que recriam (devidamente fantasiados) emblemas
do glitter rock são compostas por
integrantes dos grupos Sonic
Youth, Radiohead, Teenage Fanclub, Elastica, Spacehog, Placebo.
As bandas Pulp, Grant Lee Buffalo e Shudder to Think contribuem
com canções inéditas, compostas
no espírito do glam rock. Só o que
não aparece é a música de David
Bowie, que proibiu a utilização de
qualquer sua canção.
A imprensa especulou que ele
não teria gostado do enfoque. Há
pouco, Bowie afirmou à revista
musical inglesa "Mojo" que planeja conduzir, em pessoa, um filme
sobre Ziggy Stardust, que incluiria
canções inéditas daquele período.
Sem Bowie, Todd Haynes extraiu
dos repertórios de Roxy Music, T.
Rex e Stooges parte dos temas cantados por Wild e Slade -sim, os
atores McGregor e Rhys Meyers
cantam em "Velvet Goldmine".
Em formato original, ressurgem
canções semi-esquecidas de Lou
Reed, Roxy Music, T. Rex, Brian
Eno, Gary Glitter e Slade. Ao todo,
são 34 temas na trilha sonora
-noutros tempos, chamariam
"Velvet Goldmine" de ópera-rock.
�
O jornalista
Pedro Alexandre Sanches viajou a
convite da organização da MostraRio.
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