|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Crítica/ "Avatar"
É convencional, mas não ingênuo
Longa, que entra em circuito na sexta, traz personagens capazes de viver duas vidas, em Pandora
INÁCIO ARAUJO
CRÍTICO DA FOLHA
"Avatar" é um desses
filmes que podem
se tornar vítimas da
excessiva expectativa em torno
deles. O que se espera de James
Cameron, no caso, é uma revolução dentro da revolução do
3D digital. É uma história tão
previsível como a de "Titanic" e
tão inesperada quanto a de "O
Exterminador do Futuro", ágil
como um videogame, mas grave como um Bergman.
Evidentemente, "Avatar"
não é tudo isso. Para começar,
desenvolve mais ou menos todos os aspectos da convenção
do filme de aventuras. Existe ali
uma cientista em busca de fantásticas descobertas num planeta chamado Pandora. Ela trabalha, a rigor, sob as ordens de
um militar, cujo objetivo é mobilizar forças terráqueas contra
o povo primitivo de Pandora.
Inútil dizer, por trás do militar
existe o financista, o interesse
econômico: esse planeta possui
um metal precioso e desconhecido no nosso tempo.
O filme não é ingênuo, porém. A ideia dos personagens
capazes de viver duas vidas, a
sua própria e a de duplo criado
cientificamente é, embora não
inédita, interessante e muito
bem desenvolvida.
A saber: Jake Sully é um ex-soldado que se
integra ao projeto Pandora
após a morte de seu irmão gêmeo, cientista, cujo lugar deve
ocupar. Jake é ignorante e paraplégico, portanto desprovido
de maior mobilidade. Mas, ao
tomar o lugar de seu duplo (adquirindo as feições do enorme
povo de Pandora), ele readquire a mobilidade. Com isso, torna-se um duplo feliz. É melhor
que seja, pois muitos são os perigos e mistérios de Pandora.
A desvantagem de "Avatar",
como argumento, talvez seja o
da excessiva legibilidade. Nesta
fábula não é difícil traduzir
Pandora por Iraque (do ponto
de vista militar), por exemplo,
um desses povos que os americanos se empenham mais por
subjugar do que por compreender, tendo em vista interesses
econômicos. Foi essa a marca
do governo Bush, não foi?
Ao mesmo tempo, os habitantes de Pandora são uma espécie de bons selvagens extraterrenos, em plena harmonia
com essa natureza que os terráqueos pretendem destruir. À
frente deles, um coronel que é
um clichê escarrado de militar
(como, aliás, a imensa maioria
dos militares reais).
Tudo até aqui parece conspirar para que "Avatar" não tenha
a posteridade de "Titanic", por
exemplo, um filme que cresceu
com o tempo. No entanto,temos aqui uma história em completa sintonia com os desejos
mais claros manifestados pela
humanidade nos últimos tempos (sua sobrevivência, seu elo
com a natureza, a compreensão
do outro). Isso, dirão seus opositores, não compensa as quase
três horas com máscara de 3D
no rosto e o sacrifício imposto à
visão. Pode ser.
Mas existe um
tal cuidado no espetáculo, na
produção das batalhas, que
"Avatar" parece capaz por vezes de reinventar o cinema como espetáculo de pura mágica,
que envolve o fantástico.
Ainda uma vez, porém, é
obrigatório reconhecer que,
apesar das virtudes do 3D, são
os momentos contemplativos
os melhores. A imagem da flor
branca pousando no arco da
guerreira é das mais poéticas
deste filme, pesados todos os
pesares, bem indispensável.
AVATAR
Direção: James Cameron
Produção: EUA, 2009
Onde: pré-estreia amanhã à noite
Classificação: 14 anos
Avaliação: bom
Texto Anterior: A revolução dos clichês Próximo Texto: Filme disputa 4 Globos de Ouro Índice
|