São Paulo, domingo, 10 de abril de 2005

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TV PAGA

Beleza supera precariedades em filme brasileiro

INÁCIO ARAUJO CRÍTICO DA FOLHA

Depois de uma breve primavera, sustentada por umas dúzias de filmes, não raro muito ruins, o filme brasileiro já registra um recuo nos cinemas e ameaça voltar à antiga pasmaceira.
O que leva quase obrigatoriamente à pergunta: existe de fato um cinema brasileiro? Não digo a simples produção de filmes, mas a instituição em que a sociedade se reconhece, se discute e se diverte. Em que ela se vê, enfim.
Esse é um problema antigo. Hoje a Sky passa "O Canto da Saudade" (TVE Brasil, 23h30), último longa e talvez o mais belo de Humberto Mauro. Mas quem sabe quem foi e o que fez Humberto Mauro? E, se confrontadas ao filme, saberá reconhecer suas belezas? Saberá identificar na história trágica e cômica do carreiro e seu amor rejeitado algo que ultrapassa as fronteiras de Minas? Saberá ver nas precariedades da produção um espírito que as supera?
Isso me parece improvável. O cinema tornou-se uma arte de classe média, e o cinema brasileiro só dialogou, de forma efetiva, com o público popular, hoje afastado dessa diversão outrora barata. O cinema nunca conseguiu estabelecer uma conexão entre o gesto intelectual e o poder econômico. Desde Adhemar Gonzaga, passando pela Vera Cruz, tenta se mostrar "respeitável". E respeitoso. E dá com os burros n'água: o cinema só interessa ao capital, normalmente, como forma de abater imposto. Mas aí é um problema de fisco, não de arte.
O capital aprecia a respeitabilidade, gosta de música, de livros de arte e de arte. Isso deixa o cinema brasileiro sem um braço. Sem uma arte industrial, por que só desenvolve o lado intelectual?
Penso numa exceção que é Cosette Alves, que move céus e terras pela preservação de nossas imagens, com sua Sociedade Amigos da Cinemateca. Mas quem percebe sua importância? Será preciso talvez retomar o assunto um dia.

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