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ELE VOLTOU!
Prestigiado pela trilogia "O Senhor dos Anéis", o diretor fala sobre "King Kong", filme que tenta fazer desde a infância
Peter Jackson sobe ao topo do mundo
SÉRGIO DÁVILA
ENVIADO ESPECIAL A NOVA YORK
"King Kong", o novo, começa
com a voz de Al Jolson cantando
"I'm Sitting on the Top of the
World" (estou sentado no topo
do mundo), um aviso óbvio do
que está por vir (o gorilão no alto
do Empire State Building), uma
ironia com a situação que é mostrada então na tela (a Nova York
de 1933, em plena Depressão) e
um recado do diretor: depois da
trilogia de "O Senhor dos Anéis",
que levou para casa US$ 1 bilhão
só nos Estados Unidos e ganhou
17 Oscars, quem está sentado no
topo do mundo hollywoodiano é
ele, Peter Jackson.
Com o sucesso de público e crítica, o neozelandês de 43 anos
nascido em Pukerua Bay conquistou o que mais queria depois de
penar três anos com hobbits e
anéis: liberdade de escolha.
E liberdade de escolha em
Hollywood se resume a duas perguntas, feitas por um dos grandes
estúdios, que diretores de mais
qualidade que Peter Jackson passam a vida esperando ouvir em
vão: qual filme você quer fazer e
quanto quer gastar? A resposta já
estava na ponta das línguas dele e
de sua mulher, Fran Walsh, parceira desde os tempos da universidade, mãe de seus dois filhos: a
refilmagem de "King Kong".
Não o pastiche de 1976, mas o
original, de 1933, em que uma
equipe de filmagem parte de navio de Manhattan em direção a
uma locação no Oriente, que acaba sendo a Ilha da Caveira, ainda
não-descoberta, onde encontrarão um povo primitivo, dinossauros e um gorila imenso, Kong, que
trarão de volta a Nova York para
apresentá-lo como "A Oitava Maravilha do Mundo". "Disse a eles
(o estúdio Universal): quero terminar o que comecei a filmar aos
12 anos", contou o diretor em entrevista exclusiva à Folha, feita no
sábado pela manhã.
Quanto ao dinheiro, extra-oficialmente fala-se em US$ 208 milhões, dos quais US$ 35 milhões
teriam vindo do bolso do próprio
Jackson no final das filmagens,
quando o estúdio fechou as torneiras e o diretor se recusou a deixar de lado todos os recursos imaginados pela empresa de efeitos
especiais Weta, de sua propriedade, aliás. A Universal se limita a
dizer que houve "um acordo financeiro final". Jackson afirma
que "é complicado".
Mesmo assim, é muito dinheiro
-"Titanic", de 1997, a maior bilheteria da história do cinema,
custou US$ 200 milhões. Quando
ganhou o Oscar então, o diretor
James Cameron repetiu uma fala
de Leonardo DiCaprio no filme:
"Eu sou o rei do mundo". Peter
Jackson aguarda o dia 14 de dezembro, a estréia mundial, com
ansiedade, para saber se o seu rei,
o "King Kong", é o novo nobre do
pedaço. A seguir, a entrevista.
Folha - Por que "King Kong" e por
que agora?
Peter Jackson - "King Kong", o
original, foi o filme mais marcante da minha vida e é o meu preferido até hoje. Assisti aos nove
anos, na Nova Zelândia, e me lembro daquele dia até hoje. E também da manhã seguinte, quando
refiz com bonecos de papel a batalha dele com o brontossauro,
cena por cena, peguei emprestada
a câmera fotográfica dos meus
pais e fotografei desenho por desenho. Estava utilizando então,
instintivamente, a mesma técnica
que o filme usava e que se usa até
hoje em títulos mais baratos e
mesmo em grandes produções,
como "Team America - Detonando o Mundo" (2004), chamada
"stop-motion". Com o passar dos
anos, fui ficando mais interessado
e intrigado pelo filme. Aos 12, tentei fazer um "remake", o que pareceu um projeto ambicioso para
um pré-adolescente (risos).
Folha - Em 1996, o sr. tentou de
novo, dessa a vez a sério.
Jackson - Tentei, mas a Universal não me permitiu. Aí aconteceu
"O Senhor dos Anéis" e, depois da
trilogia, eu estava numa posição
confortável, em que poderia filmar literalmente o que quisesse. E
sempre quis "King Kong". Disse
isso a eles: quero terminar o filme
que comecei a fazer aos 12 anos.
Folha - A Amazônia brasileira foi
realmente uma inspiração para a
flora da Ilha da Caveira, como disseram seus dois especialistas em
efeitos especiais, Richard Taylor e
Joe Letteri?
Jackson - Sim e não. Na verdade,
a principal inspiração foi mesmo
o filme de 1933. Quisemos recriar
com meios de hoje o que aparecia
então. Era artificial, mas ao mesmo tempo impressionante, pelo
conhecimento que se tinha de cinema na época. A floresta era pintada em lâminas de vidro, e os
atores eram filmados em frente a
elas. O que fazemos hoje em dia é
colocá-los em frente a uma parede verde e depois acrescentamos
o resto por computador. Ou seja,
os meios mudaram, mas o princípio é o mesmo.
Folha - Em termos de efeitos especiais, qual foi a importância do
filme de 1933?
Jackson - Um marco. Nada parecido tinha sido feito até o estúdio
RKO bancar a idéia -e sair da falência por isso, mas isso é um detalhe... Pouco se sabia então dos
gorilas, daí a idéia do roteirista
Edgar Wallace (1875-1932) de
usar um como tema principal da
história, recorrendo ainda ao conto do século 18 ("A Bela e A Fera",
escrito por Jeanne-Marie Leprince de Beaumont em 1756).
Pouca gente tinha visto um
avião no ar, daí a batalha final do
gorila com eles no topo do Empire State Building. E a era dos arranha-céus chegava ao ápice com o
aquele edifício, que aliás foi concluído naquele ano. O "King
Kong" de 1933 era o que mais moderno o cinema poderia mostrar,
sem esquecer a ousadia, que é
uma mulher dividida entre o
amor de um animal e o de um homem, no caso um dramaturgo
que é roteirista nas horas vagas.
Folha - Há ainda a paixão pelo cinema, também, que o sr. retrata
com muita... bem, paixão.
Jackson - Pelo cinema, pelo teatro e pelas artes em geral. Quando
a atriz Ann Darrow (Fray Wray
no original, Naomi Watts no
atual) é convencida a trabalhar no
filme que Carl Denham (Robert
Armstrong então, Peter Black
agora), o produtor inescrupuloso,
quer rodar nos trópicos, trabalha
no vaudeville e quase cede ao burlesco, que era o equivalente ao
striptease da época.
Folha - O seu Kong, no entanto, é
mais humano, concorda?
Jackson - Bem, ele é um gorila gigante, sanguinário e amedrontador, mas um gorila com um coração, digamos assim. Tem emoções. Andy Serkis [o ator cuja "interpretação" facial e corporal é a
base para a construção digital do
monstro, também a criatura Gollum de "Senhor dos Anéis"] estudou muito esses animais antes de
"compor" seu personagem. E eles
são surpreendentemente parecidos conosco. Mas tentamos não
humanizá-lo muito, o que o tornaria infantil. Não se esqueça de
que este é o "king" (rei) Kong,
com toda sua nobreza, mas é diferente, e tem a imprevisibilidade
selvagem que o torna verdadeiramente assustador.
Folha - Há também cenas-homenagens ao clássico de 1933 e a outros filmes e algumas piadas que só
serão entendidas por quem se interessa por ou conhece o funcionamento da indústria do cinema hoje,
não?
Jackson - Bem... Sim, é verdade,
colocamos uma ou outra a mais
que não constava do roteiro original de Wallace. Quisemos dar algumas risadas por último.
Folha - Sua última aventura no cinema rendeu 17 Oscars. "King
Kong", no entanto, é um filme estritamente de ação e efeitos especiais, não exatamente o gênero
preferido da Academia. Alguma expectativa quanto à cerimônia de
2006?
Jackson - Não, mas espero que
pelo menos os prêmios técnicos
sejam ganhos por "King Kong".
Se o de efeitos especiais, por
exemplo, for para qualquer outro
será uma injustiça.
Folha - E, depois de terminar o
épico do épico, que é a engrenagem colocada para funcionar na divulgação de um filme desse valor, o
que o sr. vai fazer?
Jackson - Essa engrenagem deve
me tomar mais um ano, com o filme, o DVD, os extras do DVD etc.
etc. Então, quero descansar. Entre
o ponto final da trilogia "Senhor
dos Anéis" e o início do processo
de "King Kong" se passarem exatamente três dias. Temos alguns
filmes que queremos fazer, mas
vamos tirar um ano de folga e recarregar os neurônios, nossos pobres neurônios... (finge estar ficando cada vez mais fraco) Reenergizar... (risos). Falando sério,
parar e pensar em novas idéias.
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