|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Diretor de "V de Vingança", baseado nos quadrinhos do inglês Alan Moore, rebate críticas e diz que seu filme tem realidade própria
Cinema X HQ
MARCO AURÉLIO CANÔNICO
DA REPORTAGEM LOCAL
Explodir um prédio pode mudar o mundo? Defender tal idéia
em um filme é apologia ao terrorismo? Uma produção hollywoodiana pode ser algo subversivo?
Essas questões têm levantado
discussões desde o lançamento,
no exterior, de "V de Vingança",
filme baseado na HQ homônima
de Alan Moore (texto) e David
Lloyd (desenhos).
A polarização começa com os
próprios autores: enquanto Moore, brigado com Hollywood e com
a indústria de HQs, afirmou em
entrevistas à imprensa internacional que o roteiro é "um lixo" e
que seu texto, uma espécie de manifesto pró-anarquia, foi deturpado, Lloyd colaborou com a produção e defende a idéia de que o
filme seria, obrigatoriamente, algo distinto da HQ.
"Eles fizeram um filme para
Hollywood, enquanto eu e Alan
fizemos a história para um público diferente, não precisávamos
agradar às platéias em escala global", disse Lloyd em entrevista ao
site Ain't It Cool News, especializado em cinema e HQ.
Com roteiro e produção dos irmãos Wachowski (a dupla responsável pela trilogia "Matrix") e
direção do assistente de ambos,
James McTeigue, o filme, que estréia no Brasil na próxima sexta-feira, conta a história de V (Hugo
Weaving, o agente Smith de "Matrix"), um mascarado que tenta
fazer, à base de explosões e assassinatos, o povo se insurgir contra
o governo fascista da Inglaterra de
2020. Em seu caminho, ele encontra e toma sob sua proteção a mocinha Evey Hammond (Natalie
Portman), enquanto escapa das
investigações do detetive Eric
Finch (Stephen Rea).
Em entrevista à Folha, por telefone, o diretor McTeigue falou sobre as modificações que foram
feitas na história original e rebateu as críticas de Alan Moore.
Folha - Como o sr. se envolveu no
projeto do filme?
James McTeigue - No fim da trilogia "Matrix", comecei a conversar com os Wachowski sobre o
que fazer a seguir. Eles haviam escrito um roteiro baseado em "V
de Vingança" antes de começar
"Matrix". Conversamos sobre a
"graphic novel", sobre como ela
ainda era atual, levantava boas
questões. Eles disseram que talvez
devêssemos tirar o roteiro da gaveta e atualizá-lo, fazendo-o mais
próximo da política atual, porque
a HQ foi escrita na década de 80,
nos anos Thatcher na Inglaterra.
Como estavam cansados depois
de trabalharem na trilogia "Matrix" por quase dez anos, eles
acharam que seria bom para mim
dirigir o filme, e eu realmente
queria fazê-lo.
Folha - O roteiro muda diversos
aspectos da história original, principalmente a personagem Evey.
Por que essas mudanças?
McTeigue - Achei que, fazendo
Evey um pouco mais velha, mais
consciente e independente, sua
postura contra V seria mais interessante. Na HQ ela é quase uma
vítima que se apaixona por seu seqüestrador, achei que isso era
muito ingênuo, que, se acontecesse com uma garota nos dias de
hoje, não seria assim, por isso
mudamos. A HQ funcionava na
época em que foi escrita, mas já
passamos daquele tempo.
Folha - Houve algum aspecto da
HQ original que o senhor tenha sido forçado a mudar?
McTeigue - Sempre há coisas que
você gostaria de manter, mas acaba tendo que cortar, não é possível fazer uma filmagem exata da
história original. Gosto de alguns
personagens da HQ que acabaram não entrando, mas que estão
no filme de outra forma. Decidimos concentrar a trama em Evey,
em V e no detetive Finch.
Folha - Mas há aspectos da HQ
que sumiram e que não dizem respeito ao ritmo do filme, por exemplo, o uso de drogas por Finch para
entender a história de V. Houve algum tipo de censura?
McTeigue - Achei que seria mais
interessante Finch ter uma espécie de premonição do que uma visão induzida por drogas. Entendo
por que Alan Moore escreveu dessa forma naquela época, mas preferi que as descobertas tivessem
mais a ver com a investigação e
com a forma como o personagem
sentia os acontecimentos.
Folha - O sr. leu as críticas de Alan
Moore ao filme? Em entrevista ao
"New York Times", ele disse que o
roteiro era um lixo.
McTeigue - Acho que, a menos
que tivéssemos feito uma adaptação página por página da HQ,
Alan Moore nunca ficaria satisfeito. Tudo bem ele dizer isso, mas
ele continua vendendo seus textos
para Hollywood, então você pode
tirar suas próprias conclusões. É
desapontador, mas o que fazer?
Folha - O sr. acha que a atual política inglesa de combate ao terrorismo, que teve ações como o assassinato do brasileiro Jean Charles no
metrô de Londres, tem alguma semelhança com o tipo de governo
fascista que vemos em seu filme?
McTeigue - Não sei se podemos
traçar um paralelo exato. O que
podemos dizer é que o poder absoluto corrompe. Acho que esse
tipo de política de "atirar para
matar" não é boa para ninguém.
Esse é um caso trágico que mostra
o absoluto medo com que as pessoas viviam depois dos atentados
em Londres. Houve muitos erros
no caso de [Jean Charles de] Menezes. Uma das coisas que tento
mostrar no filme é que o governo
deve falar a verdade o máximo
possível. Não tem sentido colocar
a mídia em frenesi como aconteceu após aquela tragédia.
Texto Anterior: Programação Próximo Texto: Panini relança original em quadrinhos Índice
|