São Paulo, Domingo, 21 de Novembro de 1999
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Só faltava dizer muito obrigado

JUCA KFOURI
Colunista da Folha

Minha primeira coluna nesta Folha saiu no dia da graça de 2 de julho de 1995.
O título era "Um alegre corintiano", pois eu saudava o fato de estar começando a trabalhar num jornal que me garantia plena liberdade e respaldo.
O título da coluna de hoje deveria ser, portanto, ""Um triste corintiano", porque estou deixando a Folha. Mas não, diga-se logo, por falta de liberdade.
A vida tem uma porção de encruzilhadas, e às vezes pegamos uma estrada diferente da que supúnhamos, sempre na esperança de que tudo dê certo.
É o meu caso, agora.
Dê no que dê o novo caminho, importa dizer que em julho de 1995 eu estava inseguro.
Sim, por mais que os jovens não acreditem, profissionais experimentados também se sentem assim diante do mundo.
Então, aos 45 anos de idade, eu largava um quarto de século passado na Editora Abril, onde aprendi o pouco que sei e até me achava meio dono das coisas que fazia.
Hoje, quase cinquentão, a situação é outra.
A convivência quase diária com os leitores da Folha, e com os companheiros da Folha, resultou em segurança.
E é exatamente por isso que a gratidão que levo pelo apoio aqui recebido é dessas coisas que se carregam para sempre.
São só boas lembranças e muitas lições. De verdade.
Como esquecer o primeiro contato, quando, numa negociação que deveria ser apenas profissional, ouvi de Otavio Frias Filho que o Frias pai queria porque queria que eu viesse para a Folha? Sua missão, ouvi dele, era me contratar e ponto final.
Ou como esquecer a calorosa recepção do Matinas-san?
Mal sabem eles, e talvez eu nem devesse contar, que naquele dia, 30 de junho, eu viria para o jornal até se fosse de graça, porque certas atitudes não têm preço.
De lá para cá, só alegria.
A alegria da convivência, mesmo que via telefone, com o Melk, com o Marcelo, com o Júlio, Edgard, João Carlos, Alex, Cobos, Ohata, Dias, Marcílio, Bueno, Mário, no Rio, tantos profissionais de primeira, não só no trato com a profissão, mas no relacionamento pessoal.
A felicidade de uma cobertura de Copa do Mundo que juntou uma garotada 1.000% com a velha guarda tão bem representada pelo Rossi, Cony, Janio, Macaco Simão (ele vai ficar bravo), meu inseparável Helena, na campeoníssima França.
Houve, é claro, muitos momentos de tensão. Ora, não houvesse e não estaríamos vivendo intensamente um jornal.
À tentativa canhestra de não me darem credenciamento para cobrir a Copa o jornal respondeu com estupenda energia.
E nas poucas, porém renhidas, divergências, outra lição, principalmente para quem avalia de fora e imagina que esta Folha seja um símbolo da arrogância que caracteriza quase todos nós, jornalistas: a preocupação constante em não fazer do jornal uma arma contra quem quer que seja, mesmo que esse alguém mereça, e que, às vezes, não consigamos.
Os mais de quatro anos aqui passados valeram por uma vida, de tal maneira que não há mais nada lá fora que assuste, embora cada recomeço seja sempre uma experiência assustadora.
Lamento deixar o vizinho Tostão, exemplo de brasileiro. Sinto por não dividir mais este espaço com o Zé Geraldo e com o Torero, gente tão boa, limpa, talentosa.
Mas levo, por metido que sou, também o sentimento do dever cumprido, além de um certo aperto no coração, aquele que sempre dá quando o navio parte, o trem apita, o avião decola ou o ônibus dobra a esquina.
E nenhuma sensação de que já vou tarde.



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