São Paulo, domingo, 20 de maio de 2001

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FUTEBOL

O brilho do apagão

TOSTÃO
COLUNISTA DA FOLHA

Um pequeno mas influente número de brasileiros representa o país dos espertos, do fisiologismo, do consumismo, do desperdício, da injustiça e da ditadura do entretenimento (está substituindo a cultura).
Agora, o Brasil é também o país do apagão. Pela falta de planejamento, pela privatização malconduzida, pelo desperdício do governo e da população e pelo castigo de São Pedro, viveremos, literalmente, momentos na escuridão.
Talvez o apagão nos torne mais parcimoniosos, humildes, cidadãos conscientes, organizados, solidários, humanos e brilhantes.
Com a proibição de jogos noturnos (se os geradores não entrarem em campo), descansaremos da mesmice das partidas, aproveitaremos a noite para refletirmos sobre os problemas do esporte e enxergaremos com mais clareza e brilho.
Há muito tempo o futebol brasileiro vive na penumbra. A desorganização reflete nos gramados. O Brasil não tem mais o melhor futebol do mundo. A Fifa e os ufanistas demoraram a perceber.
O público abandonou os estádios por causa da violência, do desconforto e do mau futebol. Nove e quarenta da noite também não é hora de ir ao estádio. Na escuridão é que surge a luz.
As CPIs estão iluminando o caminho, mostrando o que todos suspeitavam e/ou sabiam.
Os depoimentos do presidente da Federação Mineira, Élmer Guilherme, do ex-presidente do Santos Samir Abdul-Hak e do presidente da CBF, Ricardo Teixeira, sintetizam a desorganização, as irregularidades e a incompetência no futebol brasileiro. Antes da instalação das CPIs, o presidente da CBF percebeu que o modelo de clientelismo e amadorismo havia chegado ao fim. Como não sabe trabalhar de outra maneira, decidiu sair no final de seu mandato, em 2003.
Para impressionar, contratou a respeitada Fundação Getúlio Vargas para elaborar um projeto de estruturação do futebol brasileiro. Isso daria à CBF um atestado de seriedade e boas intenções.
Com o surgimento das CPIs e as suspeitas de transações ilegais, era preciso fazer algo de maior impacto. Para isso, Ricardo Teixeira associou-se ao Pelé. Nesse "acordão" pode até estar combinado que o Rei será o presidente de transição.
Aí apareceram novos ruídos. Sócrates e Zico, ex-jogadores respeitados, com cursos teóricos e práticos de administração esportiva, entraram no páreo.
Zico é mais bem aceito pela cartolagem. Os dirigentes acham Sócrates muito radical. Para eles, seria o Lula da sucessão. Os dois poderão reviver as tabelinhas da Copa de 82.
O ministro Carlos Melles botou mais lenha na fogueira, numa entrevista ao jornal "Estado de Minas": "Se preciso, vou intervir na CBF. Apesar de ainda não terem terminado as investigações, o material recolhido já é motivo de revolta".
De uma forma ou de outra, independentemente de nomes, haverá, até 2003, grandes mudanças na CBF, nas federações estaduais e nos clubes. A sociedade não aceita mais o clientelismo e o continuísmo.
Vivemos um momento histórico. O apagão vai iluminar o país e o futebol.

Decisões estaduais
As decisões estaduais, em todo o Brasil, vão empolgar os torcedores. O fato evidencia a força e a rivalidade desses campeonatos. Nesse momento de euforia, a maioria dos dirigentes esquece os quatro meses de prejuízos.
O único favorito é o Corinthians contra o Botafogo de Ribeirão Preto. No Sul, Grêmio e Atlético-PR -talvez- têm uma ligeira vantagem sobre Juventude e Paraná, respectivamente.
Luxemburgo recuperou parte de seu prestígio. Discordo quando não contestam a competência do treinador.
Ele foi brilhante nas outras equipes e no Corinthians (apesar da escalação do Paulo Nunes), mas foi incompetente na seleção. Deu muitas caneladas dentro e fora de campo. Nos grandes desafios é que o craque mostra que é craque.
Por falar em Luxemburgo, o ponto eletrônico utilizado pelo treinador na partida contra o Santos foi uma inovação tecnológica interessante e surpreendente, mas ilegal.
Disseram que o técnico falou, no ponto, para o Ricardinho gritar ao Marcelinho que deixasse a bola passar para ele fazer o gol. Isso é demais! Ninguém é idiota.
No Rio, talvez haja equilíbrio técnico. O Vasco tem mais talento no ataque, mas os zagueiros do Flamengo são melhores. Romário e Gamarra podem ficar fora. As outras posições se equivalem. No túnel, o Mengo leva vantagem.
Nos últimos dois anos, o Vasco era o grande favorito e perdeu. Hoje, seus jogadores provavelmente estarão mais humildes. No Flamengo pode acontecer o contrário. O fato de ter um time de melhor qualidade em relação ao de anos anteriores pode diminuir a garra da equipe.
São apenas impressões. Só saberemos a verdade quando a bola rolar. O futebol e a mente humana têm razões e histórias próprias, independentemente da lógica e do pretenso conhecimento de um cronista.

E-mail
tostao.folha@uol.com.br



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